Carolina Gonçalves e Karine Melo
Repórteres da Agência Brasil
Brasília – A polêmica sobre a definição de atividades exclusivas de médicos, diferenciando as competências deles das de 13 profissionais também da área de saúde, pode chegar a um desfecho amanhã (20). A análise do veto do Palácio do Planalto ao Ato Médico é o item mais polêmico da primeira sessão do Congresso Nacional, desde que surgiram novas regras para de tais dispositivos.
A área de saúde não é a única em que há polêmica quando o assunto é regulamentação de profissões. No Congresso, centenas de propostas com esse objetivo estão em tramitação e incluem os mais variados segmentos. Aguardam regulamentação profissões como as de DJ, lutador de vale-tudo, compositor, paisagista, acupunturista, detetive particular, profissionais do sexo, artistas de circo, jornalista, empregado doméstico, cantador do Nordeste, vaqueiro e garçons.
Apenas no Senado, mais de dez projetos de lei com tal objetivo tramitaram nos últimos meses. Na última reunião da Comissão de Assuntos Sociais (CAS), os senadores deveriam ter decidido sobre as regras para, pelo menos, duas atividades (guarda-vidas e designer), mas, como esse tipo de proposta, é o que mais recebe vetos integrais ou parciais do Executivo, os parlamentares recuaram: querem definir antes regras gerais para apreciação das proposições.
Por causa dos vetos e da pressão das categorias, é comum os parlamentares apresentarem nova proposta com teor similar ao dos projetos rejeitados. Foi assim no projeto que regulamentava a atividade de turismólogo (PLC 24/03). O texto exigia curso superior em turismo ou equivalente no exterior, ou o exercício da atividade ininterruptamente há mais de um ano, antes da publicação da lei.
Após o veto integral do projeto, em 2005, um novo texto (PLS 290/01), praticamente igual ao vetado, foi aprovado pelo Congresso. A diferença era a inclusão da possibilidade de formação superior em hotelaria e a exigência do exercício ininterrupto da profissão por cinco anos antes da lei, além de registro em órgão federal competente. Em 2012 a Lei 12.591/12 foi sancionada, mas também não ficou livre de vetos em vários dispositivos do projeto de origem, inclusive a exigência de curso superior.
Segundo o senador Paulo Paim (PT-RS), o Legislativo já regulamentou várias profissões, apesar de o governo ter o entendimento de que, em muitos casos, o próprio mercado estabelece essas normas. “O Ministério do Trabalho considera que não há necessidade de regulamentações. As categorias, por sua vez, entendem diferente. [Querem] a regulamentação da carta de direitos básicos, que ficam assegurados, como data base e carga horária”, explicou o senador.
Mesmo reconhecendo a necessidade de regulamentação, Paim admite que, em algumas situações, o suposto benefício poderia se tornar uma limitação da atividade. “A pedido das universidades, entrei com projeto para a profissão de historiador. Pensei que seria tranquilo e comecei a receber críticas porque vários profissionais que exerciam a profissão não tinham graduação na área e seriam excluídos. O limite, mesmo com a maior boa intenção, é muito tênue, fica no fio da navalha.”
Durante anos, a discussão acalorada sobre a exigência do diploma de jornalista ocupou gabinetes e universidades, dividindo especialistas. A Proposta de Emenda à Constituição dos Jornalistas (PEC) 33/09), do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), torna obrigatório o diploma superior de Comunicação Social, habilitação em jornalismo, para o exercício da profissão.
A proposta , aprovada há um ano no Senado, está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a exigência do diploma, imposta por decreto-lei durante o regime militar, atenta contra a liberdade de expressão e, por isso, é inconstitucional. Assim, se aprovada, a regulamentação da profissão terá que ser feita por meio de emenda à Constituição.
“A regulamentação por lei é para atender às peculiaridades de uma profissão. Mas o que percebemos é que há profusão de profissões que não são exatamente destacadas, mas se inserem em um conjunto de outras”, ressaltou o presidente Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Paulo Schmidt.
Para Schmidt, a regulamentação é feita para estabelecer direitos específicos de uma categoria, como, por exemplo, a de radiologista. “É uma atividade específica, diferenciada, que tem riscos inerentes, que precisam de regulamentação mínima para o profissional não ficar sujeito ao livre-arbítrio do empregador.” Quando não existem especificidades da profissão, a lei não reflete em benefícios, disse ele.
Schmidt lembrou que, além de estarem atentos sobre o risco de criar leis inócuas, os parlamentares precisam avaliar a relação entre profissões. Quando se regulamenta uma atividade, existe sempre risco de a regulamentação de esta atividade invadir a área de outra correlata, como ocorre no Ato Médico, explicou. "Não há como regulamentar uma lei sem olhar a lei do lado, para não criar tensões no ambiente de trabalho onde o beneficiário é a população.”
Edição: Nádia Franco
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