Heloisa Cristaldo
Enviada Especial da Agência Brasil/EBC
Barra (BA) – Depois de três anos sem plantação, a comunidade do assentamento rural Antônio Conselheiro, localizada na zona rural de Barra, na Bahia, consegue produzir, apesar da pior seca dos últimos 50 anos na região do Semiárido brasileiro. Desde o ano passado, as famílias têm plantado mandioca, umbu, laranja, caju, milho, abóbora, banana, feijão, acerola e hortaliças com a ajuda de tecnologias implementadas pela Embrapa.
A experiência com o projeto de agricultura familiar em áreas irrigadas também tem beneficiado moradores do assentamento Santo Expedito, na Bahia. Para receber a equipe responsável pelo projeto, a comunidade liderada pela camponesa Antônia Francisca Guedes, a Toinha de Igarité, preparou uma mesa farta. As 51 famílias esperavam reunidas para mostrar melancia, mandioca, mamão e milho - resultado do trabalho desenvolvido em conjunto com a empresa.
“Queremos levar essa experiência com a muvuca (seleção de várias culturas para plantação) para os quintais. Se cada família levar para o seu quintal, dá para viver sem sair para trabalhar fora. Essa semana já levamos a propaganda da banana para dois mercados”, disse Toinha. Além do consumo próprio, as famílias são orientadas a vender o excedente da produção para cooperativas e programas de aquisição de alimentos do governo federal.
De acordo com o pesquisador de sistemas de produção sustentável da Embrapa, Marcelo Romano, a produção do assentamento foi possível por meio do projeto de irrigação. A técnica específica para regiões onde a água é escassa, utiliza métodos pressurizados (aspersão, microaspersão, miniaspersão e gotejamento).
A água usada pode ser captada pela chuva, com o uso de cisternas, mas em períodos de escassez pode ser proveniente da distribuição de carros-pipa.
“Com a pesquisa, são testadas variedades de alimentos para avaliar os que melhor se adaptem à região”, explica Romano.
Entre as soluções desenvolvidas e adaptadas às condições climáticas do Semiárido estão a produção de variedades de milho mais resistentes ao clima seco da região, técnicas de manejo adequado das culturas e sugestões de diversificação da produção com fruteiras resistentes à seca, agricultura com água biossalina ou salobra para produção de ração animal.
Segundo o analista de transferência de tecnologia da Embrapa, Ildos Parizotto, a metodologia de trabalho teve de ser adaptada à realidade das comunidades de agricultura familiar.
“Temos de usar ferramentas participativas, muito diálogo para estabelecer um clima de confiança entre o pesquisador e o agricultor. Cada grupo tem um tempo de aprendizagem para modificar a questão cultural que hoje é diferente de tudo que ele viveu. Ele esperava a chuva para plantar. Hoje ele quebrou esse paradigma para plantar. Com esse tipo de confiança estabelecida se consegue resgatar um pouco da autoestima, porque ele se vê dependente, marginalizado, excluído”, diz.
A pesquisadora Luiza Brito argumenta que as tecnologias esbarram nas limitações financeiras e culturais dos pequenos produtores rurais. “Nossos produtores não são capitalizados para implantar uma das tecnologias com recursos próprios. É aí onde vem a necessidade de políticas públicas para permitir ou garantir uma infraestrutura mínima de captação e armazenamento de água para esses produtores familiares. Aqui, o nosso agricultor é descapitalizado, pobre de informações e tem muitas vezes a sua cultura local”.
No contraponto das ações desenvolvidas pela Embrapa, que ajudam a população do semiárido a conviver com a condição climática do Semiárido, Luiza aponta a necessidade de políticas estruturantes ou duradouras para a comunidade local já que a estiagem é um fenômeno cíclico e previsível.
“Além das tecnologias de conviver com essas condições de semiaridez, é necessário também, como ocorre em 2012/20013, tecnologias estruturantes, duradouras, permanentes que suportem dois, três anos de seca. Essas tecnologias que estamos discutindo não têm capacidade de suportar o que está acontecendo”, avalia.
Outro ponto defendido por pesquisadores é a necessidade de reforçar a extensão rural, para que as tecnologias desenvolvidas pela Embrapa cheguem a mais famílias rurais no país.
“O trabalho de disseminação das informações sobre as tecnologias geradas depende de uma estrutura mais consolidada de assistência técnica e de extensão rural. No Brasil, desde a década de 80 se assiste a um verdadeiro desmonte dessas estruturas que já foram realmente fortes, principalmente a extensão rural. É preciso fortalecer esse apoio técnico, seja na extensão rural, nas organizações da sociedade civil. Essa estrutura é fundamental para que as informações cheguem e sejam disseminadas”, defende o pesquisador da Embrapa da unidade Semiárido Pedro Gama.
Além dos trabalhos desenvolvidos pontualmente por unidades da Embrapa na região do Semiárido, a empresa também atua no plano Brasil Sem Miséria do governo federal. Agricultores e comunidades tradicionais recebem material didático sobre como lidar com os kits de sementes recebidos.
De acordo com a empresa, o folheto explica como as famílias podem produzir e armazenar o produto de seus trabalhos. O material também tem um espaço para ensinar receitas culinárias com a produção dos agricultores. Além disso, o material traz regras para o uso da água. O objetivo é garantir segurança alimentar e nutricional a essas famílias.
Até o momento, as ações em parceria com o Brasil sem Miséria já beneficiaram mais de 19 mil famílias da região nordeste, em 14 Territórios da Cidadania no Semiárido, abrangendo os estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Sergipe e Rio Grande do Norte. Ao todo, 12 projetos de inclusão produtiva e cinco projetos transversais são executados por todas as unidades da Empresa da Região Nordeste, além da Embrapa Milho e Sorgo (Minas Gerais).
Edição: José Romildo
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