Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo – Na manhã deste sábado (08), no Memorial da Resistência, em São Paulo, a Caravana da Anistia julgou e concedeu anistia política ao padre José Eduardo Augusti, que foi considerado vítima da repressão política ocorrida no país durante a ditadura militar. O sacerdote foi declarado anistiado político por unanimidade.
Padre Augusti exercia suas atividades pastorais como defensor dos direitos humanos em Botucatu (SP). Em julho de 1968, foi preso acusado de ter participado de um comício estudantil em São Paulo (SP). Em agosto daquele mesmo ano, foi libertado por meio de um habeas corpus. Foi indiciado pela Lei de Segurança Nacional e, em junho de 1969, condenado a um ano de prisão.
Em outubro daquele ano, o padre Augusti foi preso e permaneceu no Departamento de Ordem Política e Social (Dops), onde relatou ter sido torturado. Em 1970, foi transferido para o Presídio Tiradentes e, em outubro do mesmo ano, foi posto em liberdade. O padre Augusti morreu em 1997.
“Esse é um ato de reparação do governo dos atos de arbítrio que foram feitos em relação ao padre Augusti e muitos outros. Ele sempre foi um sacerdote que se pautava pela denúncia das questões sociais e que confrontou os poderosos na época em Botucatu”, disse a irmã do padre, Maria Tereza Augusti.
Em entrevista à Agência Brasil, logo após o julgamento, Maria Tereza contou que seu irmão foi “muito torturado” e quase ficou cego em um dos episódios de prisão. “Ele ficou 20 dias [sumido] e não sabíamos onde ele estava. E estava sendo torturado. Ele quase perdeu a vista e precisou ser operado, pois recebeu 50 horas de luzes no rosto”, falou.
Segundo Maria Tereza, a família não pediu indenização ao Estado, “somente a reparação [reconhecimento] do governo brasileiro da injustiça cometida”. Para ela, o atendimento da Caravana da Anistia representa “o reconhecimento de que se tem uma história construída, que a juventude não sabe, e que pode não se repetir”.
As Caravanas da Anistia são promovidas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça e existem desde 2008. Elas consistem na realização de sessões públicas de apreciação de requerimentos de anistia política, com o objetivo de resgatar, preservar e divulgar a memória política brasileira, principalmente do período relativo à ditadura militar.
À tarde, a Caravana da Anistia julga o pedido de anistia política de oito militantes da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo. Serão apreciados os pedidos de anistia política referentes a Jorge Luiz dos Santos Oliveira, Iria Molina Farinazzo, Salvador Pires, Maria Arleide Alves, Antonio Fernandes Neto, João Prado de Andrade, Luiz Carlos Prates (conhecido como Mancha, ex-diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos-SP) e Alexandre Giardini Fusco. Caso o julgamento seja favorável, os operários deverão receber anistia política e reparação econômica pela perseguição sofrida.
Raimundo Perillat, coordenador da Casa da Solidariedade do Ipiranga e ex-metalúrgico, esteve hoje no Memorial da Resistência para acompanhar o julgamento. Durante a ditadura, contou, ele chegou a ser preso. “Naquela época, eu trabalhava em São Caetano. Teve a ocupação no sindicato e toda a liderança chegou aqui no Dops, em 1979”, contou.
“Estas são pessoas que, mesmo nos momentos mais difíceis, foram corajosas ao se colocar ao lado da defesa dos direitos e das liberdades. Mas pagaram um preço por isso. E são a elas que devemos a liberdade que hoje usufruímos. Então, o Estado tem o dever e a obrigação de olhar para cada uma delas e oficialmente pedir desculpas por esses erros e, por esse gesto, reconhecer o legítimo de resistência que elas tiveram no passado”, disse Paulo Abrão, secretário nacional de Justiça e presidente da Comissão de Anistia.
Segundo Abrão, no caso do Padre Augusti, a comissão reconheceu que ele “foi preso de forma arbitrária, sofreu torturas e lesões à sua integridade física, sofreu monitoramento ilegal da sua vida ao longo do tempo e foi cerceado no exercício de suas atividades religiosas e políticas”.
Com relação aos membros da Oposição Sindical, pedido que está sendo julgado à tarde, Abrão falou que eles participaram de mobilizações consideradas subversivas à época. “Além de terem sido presos em razão de suas manifestações, foram demitidos arbitrariamente de seus empregos, tiveram seus nomes colocados em listas-sujas - o que dificultou que encontrassem novos empregos - e, principalmente, tiveram seus direitos legítimos a um projeto de vida interrompidos”, disse Abrão.
O prédio onde se encontra instalado o Memorial da Resistência foi, entre 1940 e 1983, sede do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Deops), considerado setor de uma das polícias políticas mais truculentas do país na época da ditadura militar. No local, militantes políticos eram presos e torturados.
“Todas as caravanas são importantes, mas imagine fazer uma aqui nesse prédio. Tantas pessoas tiveram suas vidas interrompidas, foram presas e torturadas e os responsáveis não foram punidas. Então, esses atos são pequenas reparações”, disse o deputado estadual Adriano Diogo, presidente da Comissão Estadual da Verdade.
Edição: Davi Oliveira