Anistia Internacional aponta relação entre desenvolvimento e desrespeito aos direitos humanos nas Américas

07/12/2012 - 7h03

Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – Iniciativas de desenvolvimento nas Américas são quase sempre acompanhadas de situações de violência. A informação está no relatório inédito Transformando Dor em Esperança - Defensoras e Defensores dos Direitos Humanos nas Américas, divulgado hoje (7) pela organização não governamental (ONG) Anistia Internacional.

O documento analisa 300 casos acompanhados pela organização entre janeiro de 2010 e setembro de 2012, em 13 países: Argentina, Brasil, Colômbia, Cuba, El Salvador, Estados Unidos, Guatemala, Honduras, Jamaica, México, Peru, República Dominicana e Venezuela. Entre eles, são detalhados 57 casos de pessoas mortas ou ameaçadas, sendo que cinco foram registrados no Brasil.

Os casos brasileiros citados no relatório são o do presidente da Associação Homens e Mulheres do Mar (Ahomar), Alexandre Anderson, que defende a pesca artesanal e luta contra o impacto ambiental e social causado pela instalação de um complexo petroquímico na região da Baía de Guanabara; o da juíza Patrícia Acioli, responsável por julgar casos de violência policial em São Gonçalo (RJ), assassinada em 2011; o da professora Laísa Santos Sampaio, integrante do Grupo de Trabalhadoras Artesanais Extrativistas, que já teve 20 pessoas assassinadas, todas envolvidas na luta contra a extração ilegal de madeira; o de Josimar Macário dos Santos, ameaçado por investigar a morte do irmão, supostamente morto com um tiro na nuca por policiais em 2009; e o das comunidades quilombolas e da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Maranhão, que lutam pelo reconhecimento oficial e pela obtenção do direito sobre terras tradicionais.

De acordo com o diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, na maioria dos casos analisados, a violência contra os ativistas está relacionada a grandes iniciativas de desenvolvimento.

“É impressionante você verificar que, na região, várias iniciativas de desenvolvimento, projetos, programas de expansão da área agrícola ou de infraestrutura, vêm acompanhados, em quase todos os casos, de forte componente de violência e de violação de direitos de defensores dos direitos humanos.”

O relatório aponta que a maioria dos casos envolve disputa de terra ou outro recurso natural, inclusive com a ocorrência de luta armada. Ativistas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), migrantes, jornalistas, blogueiros, sindicalistas e pessoas que lutam contra a impunidade são as principais vítimas de ameaça e perseguição.

Ameaças de morte, assassinatos, sequestros e desaparecimentos forçados são as principais formas de violência sofrida pelos defensores dos direitos humanos. Mulheres representam um terço dos casos analisados, sendo que são frequentes também estupros e ameaças sexuais. Entre os 300 casos acompanhados pela Anistia Internacional, em apenas quatro o culpado foi punido.

“É muito chocante você perceber como, na região, muitas vezes o que há de mais moderno pode combinar com o que há de mais atrasado. Você pode ter empreendimentos usando tecnologia de ponta, usando marcos tecnológicos do século 21 com métodos de controle e repressão social do século 19”, critica Roque.

O diretor destaca, entretanto, que os ativistas conquistaram vitórias em áreas como a defesa da legislação indígena e quilombola e das florestas. “Se não fossem as lutas, não teríamos o que temos hoje, mas não significa que os defensores não estejam ameaçados.”

Segundo o relatório, “o aparato do Estado segue incapaz de incorporar em seus mecanismos o que é recomendado pela legislação internacional que trata do tema dos defensores dos direitos humanos”. Para a Anistia Internacional, há um despreparo dos Estados no sentido de garantir a atuação dessas pessoas e quando elas são vítimas de violência dos mais diferentes graus.

Para Roque, a sociedade e o Estado precisam assumir a responsabilidade da preservação da integridade e das condições de trabalho dessas pessoas, que estão exercendo uma função pública de defesa dos direitos universais.

A ONG sugere que os governos reconheçam publicamente a legitimidade dos defensores dos direitos humanos, invistam em formas de acabar com a violência contra eles e investiguem as denúncias de ameaças. Também propõe que as autoridades reconheçam e criem espaços para manifestações pacíficas e ações públicas, impeçam acusações criminais contra os defensores que sejam motivadas por seu trabalho e incluam nas ações a questão de gênero, levando em conta as necessidades específicas das mulheres.

Junto com o relatório, a Anistia Internacional lança a campanha Escreva por Direitos, que vai até 16 de dezembro, para o envio de cartas a autoridades pedindo providências para a proteção de defensores de direitos humanos que correm risco e vivem sob ameaças.

A iniciativa é promovida todos os anos, com a escolha de casos específicos. Em 2012, dos seis casos escolhidos para a mobilização mundial, dois são de brasileiros: o de Alexandre Anderson e o de Nilcilene Miguel de Lima, presidente de uma associação de extrativistas do Amazonas que foi espancada e teve a casa incendiada, sendo forçada a fugir de sua terra.

A ONG lembra que no início de dezembro são celebrados o Dia Internacional dos Defensores de Direitos Humanos (9) e o Dia Internacional dos Direitos Humanos (10). O relatório Transformando Dor em Esperança - Defensoras e Defensores dos Direitos Humanos nas Américas está disponível no site http://anistia.org.br/.

Edição: Juliana Andrade