Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília – O juiz que autorizou que cinco crianças de uma mesma família de lavradores do interior baiano fossem retiradas do convívio com os pais e entregues para adoção a quatro casais de São Paulo contrariou ao menos dez aspectos das leis que protegem os direitos das crianças e adolescentes, informou hoje (18) a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
De acordo com a secretaria, além do tempo recorde em que todo o processo foi concluído, as crianças não chegaram a ser inscritas nos cadastros estadual ou nacional de adoção. Além disso, ao autorizar que as crianças fossem entregues às famílias paulistas, o então juiz da Comarca de Monte Santo (BA), Vitor Xavier Bizerra, não teria respeitado a ordem de inscrição, nestes mesmos cadastros, das famílias interessadas em adotar um filho. A secretaria ainda está apurando se as quatro famílias constam das relações de interessados na adoção de crianças.
Em uma nota técnica divulgada hoje (18), a Secretaria de Direitos Humanos lembra que, além de estabelecer que o fato de uma família ser pobre não justifica a perda da guarda, a legislação brasileira determina que, em casos extremos, todos os recursos possíveis para garantir a manutenção das crianças junto de suas famílias devem ser esgotados antes que a retirada da guarda seja autorizada.
Mesmo quando a perda ou a suspensão do poder familiar é necessária, a adoção depende do consentimento dos pais ou representante legal e a própria criança com mais de 12 anos tem que ser consultada. No caso de Monte Santo, o juiz não só não ouviu os pais, como não consultou nenhum outro parente das crianças, impossibilitando com isso que elas permanecessem junto a sua família natural, conforme a lei. O Ministério Público também não foi ouvido durante o processo.
"Os indícios indicam que houve uma série de ilegalidades ou, pelo menos, de desconformidades com o que o Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA] estabelece. Os detalhes ainda estão sendo investigados, mas já é possível, sim, afirmar que houve violações ao estatuto", adiantou o promotor de Justiça da Bahia Carlos Martheo Guanaes Gomes, membro auxiliar do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Ao autorizar a adoção por quatro diferentes famílias, Bizerra também violou o artigo do ECA que veda a separação de irmãos por serem os vínculos entre grupos de irmãos protegidos por lei.
“Estas crianças foram privadas de crescer e viver com seus irmãos, o que é muito grave e fere a legislação brasileira”, declarou a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, após participar, esta manhã, em Brasília, da primeira reunião do comitê que reúne representantes de vários órgãos públicos com o objetivo de desenvolver e acompanhar as ações práticas para garantir do cumprimento dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes.
O juiz, que não tem concedido entrevistas sobre o caso, chegou a afirmar ter se baseado em um parecer técnico de uma assistente social que teria alegado que os pais das crianças eram negligentes, deixando de encaminhá-las à escola. De acordo com a secretaria, os conselheiros tutelares do município já informaram não ter encontrado nenhuma irregularidade ao visitar a família.
Por determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Corregedoria do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) está investigando se o juiz cometeu alguma irregularidade. De acordo com o promotor Guanaes Gomes, o Ministério Público também já abriu um procedimento criminal para apurar os fatos e eventuais responsáveis. Diante da suspeita de irregularidades, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas, da Câmara dos Deputados, decidiu que irá convocar os envolvidos, entre eles os casais que fizeram a adoção, e apurar o caso.
Edição: Fernando Fraga