Ana Graziela Aguiar
Repórter da TV Brasil
Brasília - O olhar triste, a voz embargada e as mãos trêmulas são marcas do sofrimento de Maria Rita Apolinário, ao falar do irmão desaparecido João Batista Rita há 39 anos, vítima da Operação Condor, ação que reuniu seis países sul-americanos, inclusive o Brasil, com o intuito de reprimir os opositores às ditaduras militares.
“O João era tudo de bom. Ele era extremamente cavalheiro com as mulheres, adorava crianças, adorava cachorro. Ele era bom, inteligente, queria que a gente estudasse, que a gente fosse alguém”, diz Maria Rita, com rosto em lágrimas.
João Batista Rita - o “Catarina”, como ficou conhecido entre os militantes políticos - nasceu em 1948 na pequena Braço do Norte, no interior de Santa Catarina. De família humilde, mudou-se ainda criança para Criciúma (SC), onde viveu até completar 15 anos.
Mário Marcos de Souza, jornalista, relembra histórias com o amigo de infância: “A minha rua era de terra batida em Criciúma, na chamada Vila Operária, com uma fila de casinhas todas iguais, de madeira, de quatro peças, feitas apenas para trabalhadores e nós morávamos em uma daquelas. No fim dessa rua, tinha a casa do médico, onde o pai do João Batista era caseiro, e [os donos da casa] tinham um filho da idade dele. Nós três convivíamos muito, brincávamos de bola nos terrenos da redondeza, corríamos pela rua, jogávamos bolinha de gude, conversávamos e estudávamos juntos, éramos amigos de infância.”
Depois, João Batista seguiu para Porto Alegre para estudar. Foi então que ele ingressou no movimento político de esquerda M3G – Marx, Mao, Marighella. O irmão Romilton Rita conta o medo que João tinha de expor a família por ter se tornado um militante de esquerda na época. “Quando ele vinha visitar família aqui, vinha no fim de semana e chegava no meio da madrugada. Nunca dizia o nome quando batia na porta. Ele batia na porta e não dizia que era o João. Ele falava com voz alterada […]. Ele achava que podia ter alguém na rua esperando ele chegar para visitar a família.”
Em 1970, João Batista foi preso após tentativa frustrada do sequestro do então cônsul norte-americano na capital gaúcha. No ano seguinte, fez parte do grupo de militantes políticos libertado em troca de um embaixador suíço que havia sido sequestrado. Em seguida, recebeu asilo político no Chile. Quando o presidente chileno Salvador Allende foi deposto, em 1973, João fugiu para a Argentina. Na capital argentina, Buenos Aires, desapareceu junto com o ex-major Joaquim Pires Cerveira, também militante do movimento de esquerda. Os dois são considerados vítimas da Operação Condor. Desde então, as famílias nunca mais tiveram notícias dos dois.
Segundo o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, ainda pairam dúvidas sobre o desaparecimento de 13 brasileiros fora do país, por causa da Condor. O número é reconhecido pelo governo federal. “Todos foram vítimas. Porque se pode ver por meio de documentos como eram monitorados.”
Para Maria Rita, a falta de respostas sobre o que aconteceu com o irmão é um de seus maiores sofrimentos. “A gente precisa ter um final, um corpo, saber o que aconteceu, ter um retorno disso. A gente não tem. O que dói é que ele deu a vida pela democracia, e ficou por isso. Até hoje a gente não tem um corpo para chorar, não sabe o que aconteceu.”
A TV Brasil iniciou segunda-feira (15) a exibição da série jornalística, com quatro reportagens, sobre a Operação Condor. Até o dia 19, o Repórter Brasil Noite vai exibir uma reportagem, sempre às 21h, com reprise no Repórter Brasil Manhã, às 8h. Depoimentos completos, fotos e documentos estão disponíveis no portal da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), no endereço www.ebc.com.br/operacaocondor.
Edição: Carolina Pimentel e Lana Cristina