Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – O que é cultura? Existe cultura na favela? Essas questões deram início ao projeto Solos Culturais no Complexo do Alemão, Cidade de Deus, Rocinha, Manguinhos e Penha.
Até 8 de dezembro, essas comunidades podem conferir a primeira intervenção proposta pelo projeto, que oferece capacitação em produção cultural para 20 jovens de cada um desses locais. São exposições, projeções, pontos de encontro e festas propostas e produzidas pelos participantes para suas comunidades.
A iniciativa do Observatório de Favelas, em parceria com a Secretaria de Cultura estadual e com patrocínio da Petrobras (por meio da Lei de Incentivo à Cultura do Rio de Janeiro), começou em janeiro, com a seleção de 100 jovens entre 400 inscritos. O antropólogo Caio Gonçalves Dias, coordenador executivo do projeto, explica que foram escolhidos pessoas que já tinham alguma atuação cultural nas comunidades para fazer o levantamento das ações existentes e se preparar para dar continuidade a elas.
“Para a gente era importante reconhecer certas práticas que ocorrem nas favelas do Rio de Janeiro como cultura. Primeiro a gente precisava identificar essas práticas, depois precisava estudar alguns temas de produção cultural para que fossem acopladas a projetos, ações e por aí vai. A nossa intenção era aliar esses dois lados, a dimensão da formação e pesquisa com a dimensão da produção e formação cultural”, diz o coordenador.
Os cursos começaram em março e seguem até dezembro, com temas como políticas, projetos e teorias culturais. Dias afirma que um dos objetivos do projeto é suprir a falta de pesquisas sobre a área cultural nas favelas.
“Se você pesquisar ações e análises sobre a vida cultural das favelas, você pega, por exemplo, o censo da cultura do IBGE. O que ele tem a dizer sobre as favelas é que nas favelas não têm cinema. Isso a gente já sabe, é uma questão que já está colocada para a gente cotidianamente. Mas ao mesmo tempo você tem uma série de cineclubes que são interessantes. Essas práticas não aparecem nesse tipo de pesquisa. Então a nossa intenção com a pesquisa é dar visibilidade para esses atos que já ocorrem nos territórios, torná-los visíveis, fazer com que possam ser alvos de políticas públicas, de patrocínio e assim por diante”.
Moradora da Cidade de Deus, Carolina Meireles, de 27 anos, diz que o projeto levou os participantes a se unirem para “retomar” a comunidade. Do Solos Culturais, nasceu o Coletivo de Ações Favelísticas (CAF).
“É um coletivo de jovens que pensam em ocupar as ruas de outras maneiras, já que a gente tem uma oportunidade. Com as UPPs [unidades de Polícia Pacificadora], com estes projetos vindos para a favela, a gente resolveu pensar um pouco no nosso território, na nossa rua, o que a gente podia fazer para ocupar esses espaços que a gente ocupava um tempo atrás, antes do tráfico ficar muito forte na favela e a gente acabou perdendo o hábito de ficar na rua, de desenvolver coisas na rua”.
Na Rocinha, Michele Silva, de 23 anos, diz que se interessou pelo projeto por ser mais abrangente do que as oficinas temáticas que até então tinha participado. “Ele [o projeto] ensina que a gente também pode ter acesso a editais da Secretaria de Cultura, desde que a gente aprenda a escrever nosso projeto e mostrar pra eles. [O projeto Solos Culturais] mostra para a gente que cultura pode ser qualquer coisa”
De acordo com o coordenador do projeto, a ideia é que o levantamento produzido pelo Solos Culturais sirva de base para políticas de investimento no setor.
“A nossa intenção é o reconhecimento de que já existe uma produção cultural muito efervescente nas favelas e que demanda diversos tipos de investimento. A gente tem intenção que a pesquisa, que vai ser divulgada em dezembro, sirva de subsídio pra efetivação de políticas públicas ou de empresas que tenham desejo de atuar no espaço das favelas”.
Edição: Fábio Massalli