Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Os projetos desenvolvimentistas de integração viária até o Oceano Pacífico, a exploração de madeira e a extração de petróleo no Peru e o tráfico de drogas pressionam índios isolados no Acre, aponta o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Há o temor de que o impacto dessas atividades possa afetar a população de indígenas ainda não contatados da região, seja pela contaminação por doenças infectocontagiosas ou em função de conflitos por terra.
Segundo Lindomar Dias Padilha, do Cimi Regional Amazônia Ocidental, esse é o caso dos índios localizados, mas ainda não identificados, no Igarapé Tapada, próximo às terras indígenas Nukuni e Nawa, dentro do Parque Nacional da Serra do Divisor, que fica no norte do Acre. Padilha teme que os governos brasileiro e peruano construam uma estrada ligando Cruzeiro do Sul (AC) a Pucallpa, no Peru – via que teria cerca de 200 quilômetros de extensão.
O projeto faz parte da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), que projeta, no chamado eixo amazônico, a possibilidade de melhorar a circulação de pessoas e mercadorias entre os dois países, mais a Colômbia e o Equador. A IIRSA aponta que apenas 5% das exportações somadas desses países foram feitas entre eles (cerca de US$ 13 milhões em 2008).
“Querem fazer a ligação para melhorar o escoamento de commodities [minério, petróleo e produtos agrícolas] para a Ásia”, avaliou Lindomar Padilha, ao apontar que tanto o governo federal quanto o governo local são entusiastas da ideia. “A única forma de desenvolvimento que eles conhecem é essa, destruindo a floresta”, queixou-se. O ativista teme que a Fundação Nacional do Índio (Funai), como aconteceu com a Usina Hidrelétrica de Belo Monte (PA), permita a obra em consulta, durante o processo de licenciamento ambiental.
Desde ontem (18), cerca de 200 índios ocupam pacificamente a sede da Funai em Rio Branco, a capital acreana. De acordo com Padilha, os índios reclamam dos projetos de integração regional, dos conflitos fundiários e da morosidade de demarcação de cinco terras indígenas no Acre e de mais cinco no Amazonas.
Juan Scalia, coordenador regional substituto da Funai, admite que tem problemas que dificultam o atendimento aos índios, como, por exemplo, a falta de pessoal para cuidar das demandas indígenas no Acre, Amazonas e em Rondônia. Para Scalia, a “dificuldade de articulação institucional” entre o Brasil e o Peru, e dos próprios órgãos nacionais (como Funai, Exército, Polícia Federal e Ibama) agrava a proteção dos índios isolados.
O coordenador-geral de Índios Isolados e Recentemente Contatados da Funai, Carlos Travassos, assegura que a fundação não dará qualquer autorização para empreendimentos que possam ameaçar os povos isolados. “Uma legislação baseia o trabalho da Funai”, disse à Agência Brasil ao acrescentar que a sua coordenação adota “o princípio de precaução” em caso de risco de contato e respeita a vontade dos indígenas. Segundo ele, essa orientação é seguida desde a Constituição de 1988 e, dentro do governo, a percepção é que “direitos devem ser respeitados”.
Travassos lembrou ainda que os índios isolados do Acre “são comunidades que se negam ao relacionamento”, o que foi constatado em expedições e trabalhos de campo já realizados em áreas próximas. No Acre, estão mapeadas quatro comunidades de índios isolados. Em todo o território nacional, 72 foram localizadas.
Apesar das garantias quanto a projetos de integração, a coordenadora da Funai no Acre, Maria Evanízia dos Santos, disse à agência de notícias BBC Brasil que os índios não contatados já estão se deslocando por causa da exploração de madeira, autorizada por lei no Peru, e o tráfico de drogas. "Notamos que há mudanças nas rotas dos [índios] isolados, que têm avançado além dos espaços que costumavam frequentar, por conta da pressão que sofrem do lado peruano".
Edição: Lana Cristina