Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília – Grupos teatrais de 23 estados tentam garantir, no Congresso Nacional, a aprovação de um novo mecanismo de estímulo à produção teatral brasileira. Para eles, a criação e imediata regulamentação de um prêmio nacional é uma forma de o Estado reassumir parte da responsabilidade pela gestão do dinheiro público destinado ao setor por meio das leis de renúncia fiscal de incentivo à cultura.
A criação do chamado Prêmio Teatro Brasileiro é uma das inovações previstas no projeto de lei (PL) que institui o Programa Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura (ProCultura). Elaborado pelo Ministério da Cultura com a participação popular e já aprovado pela Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, o PL 6722/2010 prevê várias mudanças na atual Lei Rouanet, mantendo, contudo, os mecanismos de renúncia fiscal. Ou seja, o governo federal continuará estimulando empresas públicas e privadas a investirem parte dos valores que deveriam pagar sob a forma de impostos em projetos artísticos previamente autorizados a captar recursos no mercado.
A crítica de vários setores é que esse modelo permite à iniciativa privada escolher os projetos em nos quais deseja investir, priorizando o apelo comercial de cada proposta e não a sua relevância cultural. O próprio ministério aponta que, embora a Lei Rouanet tenha possibilitado a injeção de R$ 8 bilhões no setor, entre os anos de 1991 e 2008, é incapaz de dar conta da diversidade cultural brasileira. Por isso surgiu a proposta de reformá-la por meio do Procultura.
Segundo o ministério, entre 2003 e 2007, apenas 3% dos proponentes artísticos receberam 50% de todo o dinheiro captado por meio de renúncia fiscal. Ainda hoje, cerca de 80% dos recursos vão para as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. E mesmo que, de cada R$ 10 captados, apenas R$ 1 seja efetivamente privado (os outros R$ 9 são o dinheiro que a iniciativa privada deveria pagar ao Estado sob a forma de impostos), o montante a ser movimentado este ano, por meio da Lei Rouanet, chega a R$ 1,35 bilhão, enquanto o Fundo Nacional de Cultura, mecanismo por meio do qual o Ministério da Cultura investe em projetos culturais, dispõe de apenas R$ 204 milhões, provenientes de diferentes fontes, como um percentual do dinheiro arrecadado por concursos e loterias federais e do próprio Tesouro Nacional.
Para os grupos teatrais, além de obrigar o Estado a destinar parte dos recursos para uma iniciativa com critérios públicos e transparentes, o prêmio modificará o cenário teatral brasileiro, fomentando a produção, a circulação artística e a manutenção de grupos e companhias. O modelo, segundo eles próprios, é inspirado no Programa Municipal de Fomento ao Teatro, lei que está em vigor na cidade de São Paulo desde 2002.
“O prêmio nacional será uma alternativa às leis de incentivo fiscal, que têm proporcionado que a iniciativa privada gerencie o dinheiro que, no fundo, é público”, diz o diretor da Cooperativa Paulista de Teatro e ator do Grupo XIX, de São Paulo, Paulo Celestino.
O projeto de lei encaminhado pelo Ministério da Cultura ao Congresso Nacional no ano passado, ainda durante a gestão do ex-ministro Juca Ferreira, previa apenas a criação do prêmio teatral, a ser regulamentado após a aprovação da proposta. Os grupos teatrais, no entanto, passaram a defender que ele seja regulamentado por meio de uma lei específica.
"A regulamentação dos prêmios por meio de lei, e não por um simples decreto, cria um projeto estruturante que irá perdurar ao longo dos anos, independentemente dos governos”, defende Celestino.
Já no Congresso, representantes do segmento da dança conseguiram incluir na proposta a previsão de criação de um prêmio para o setor.
Ator do Grupo Teatro Invertido e membro do movimento Nova Cena, de Belo Horizonte, Leonardo Lessa concorda que o prêmio, se aprovado, vai transformar iniciativas realizadas ao sabor da decisão do governo de plantão em uma política de Estado, com critérios claros e de execução obrigatória. Lessa também defende que, com o prêmio regulamentado, os artistas e grupos contemplados serão escolhidos por uma comissão paritária criada especialmente para este fim, com integrantes indicados pelo governo federal e pela sociedade civil.
“Esse prêmio não é para premiar os melhores atores, diretores ou espetáculos do ano, mas sim para estimular a produção artística por todo o país. Será um mecanismo de fomento, com recursos vindos diretamente da União, geridos pelo Estado e distribuídos por meio de editais públicos com critérios claros e transparentes”, disse Lessa à Agência Brasil.
Atriz e professora da Universidade Federal do Pará, Wlad Lima garante que os artistas e grupos cênicos que participam da Rede Teatro da Floresta também fazem parte do movimento. Além da criação do prêmio - encarado como uma forma de não deixar apenas nas mãos dos responsáveis pelos departamentos de Marketing das empresas a decisão sobre em que projetos investir - eles reivindicam maior atenção às diferenças e necessidades regionais.
“Participamos da negociação parlamentar e, simultaneamente, negociamos com a própria classe teatral uma forma de garantirmos a adequação do prêmio às necessidades da Amazônia Legal. O chamado custo amazônico encarece as produções. Por isso precisamos de maior atenção governamental. O custo para produzir e circular com um espetáculo pela região é muito maior de que o de um projeto de mesmo porte realizado em outras regiões do país. Além do mais, as empresas que já recebem benefícios para se instalar na Amazônia Legal não costumam investir na região”, comentou Wlad.
O secretário de Fomento e Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura, Henilton Parente de Menezes, diz considerar oportuna a iniciativa dos grupos de teatro, mas vê com ressalvas a proposta de que o prêmio seja regulamentado por meio de lei específica. Para ele, isso pode "engessar" a iniciativa, dificultando que, futuramente, sejam feitas rapidamente mudanças que forem necessárias. Menezes também acredita que, com a inclusão dos prêmios de teatro e dança no projeto de lei, outras categorias se mobilizarão para garantir algo semelhante.
"Não nos manifestamos sobre isso porque o foro de discussão agora é o Congresso. Agora, caso o Parlamento nos consulte, nossa posição é que é justo que o pleito de outras categorias também seja incluído. O que temos dito a representantes de outras classes artísticas é que eles se organizem porque sabemos que, no Congresso Nacional, quanto mais organizado o setor, mais conquistas ele obtém".
Edição: Lana Cristina