Ex-presos políticos avaliam conseqüências do AI-5 na sociedade atual

12/12/2008 - 16h29

Flávia Albuquerque
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - As conseqüênciasdo Ato Institucional nº 5 (AI-5) na sociedade atual estãodisfarçadas em uma cultura na qual vigora o medo, osmovimentos sociais ainda são considerados subversivos, a participação popular na vida pública nãoé valorizada e a parcela mais humilde da populaçãoé mantida em situação de subserviência. Aafirmação foi feita hoje (12) pelo presidente da Comissão deAnistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão.“Esse povo aindatem, perante as autoridades, medo de questionar e exercer suacidadania Além disso, perduram os sentimentos de injustiçae impunidade com relação aos agentes torturadores”,disse Abrão, durante o encontro AI-5 Nunca Mais, organizadopela Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos,ligada à Secretaria Especial dos Direitos Humanos daPresidência da República, em parceria com a Comissãode Anistia do Ministério da Justiça e o Fórum deEx-presos Políticos do Estado de São Paulo. SegundoAbrão, a sociedade ainda tem medo ao lembrar dos fatos dopassado. O objetivo doencontro é reconhecer a história do país erefletir sobre as conseqüências do AI-5 para a população, para que não se repitam fatos como esse. O encontro, quetermina amanhã (13), data em que o AI-5 completaria 40 anos,discute os efeitos desse decreto, emitido durante o regime militar. Os trabalhos de hoje incluíram o julgamento de quatro requerimentos de ex-perseguidospolíticos. Além de militantes e autoridades da área de direitos humanos, participam do evento ex-presos políticos.Paulo Abrão reconheceu que o Brasil avançoumuito na questão dos direitos humanos, porque a Constituiçãode 1988 incorporou boa parte dos princípios da DeclaraçãoUniversal dos Direitos Humanos, embora nem sempre esses valores sejamrespeitados. “A maioria desses direitos ainda não saiu dopapel, como o acesso à educação e saúdepública digna. Ainda existem minorias reprimidas, homossexuaisainda discriminados, racismo muito presente.” De acordo com Abrão, a noçãode direitos humanos transmite a idéia favorecer a aceleraçãodo processo civilizatório da população. “Quantomais nos conscientizarmos da importância dos direitos humanos,teremos uma espécie de balizamento das relaçõessociais do homem com o Estado e mais acelerado nosso processocivilizatório se tornará.”Abrão considerou “interessante” o fatode uma pesquisa do governo federal ter constatado que a maioria daspessoas apontou o apoio da família como o fator maisimportante para garantir os direitos humanos, seguida do esforçopessoal e (da presença) do Estado. Segundo ele, a respostamostra que as pessoas passam a reconhecer que o primeiro espaçode preservação dos direitos humanos éeminentemente social, sem a presença do Estado. “Isso, dealgum modo, pode sinalizar que as pessoas estão comconscientes de que elas também são agentes de proteçãodos direitos humanos. Nós não temos que esperar deforma passiva uma atuação do Estado.”Ele disse que a pesquisa mostrou também quea sociedade considera muito presente a violação dosdireitos humanos, mas ressaltou que a idéia de tais direitossejam instrumentos de defesa apenas de criminosos é equivocadae fruto da falta de informação. “É instrumentode defesa de bandido, mas porque ele é um homem. Assim como éinstrumento de defesa de todo e qualquer outro homem. Os direitoshumanos devem estar ao lado de quem naquele momento estiverfragilizado na relação dos seus direitos”, afirmou. Abrão acrescentou que tanto as vítimasquanto os criminosos devem ter sua integridade física,psicológica e biológica preservada e que o próprioacionamento da Justiça para aplicar uma puniçãoao criminoso é um direito humano da vítima. “Asvítimas não reconhecem que poder acionar o PoderJudiciário com o devido processo legal, ampla defesa eresponsabilizar aquele que cometeu o crime contra elas, que aquilo éum exercício de direitos humanos. Se vale para elas (vítimas),vale também para o outro cidadão, que se desvirtuou doregime jurídico, mas que não por isso deve ser tratadocomo alguém que não merece ser respeitado.”Assinado no dia 13 de dezembro de 1968, no governo do general Arthur da Costa e Silva, o AtoInstitucional nº 5concedeu poderes absolutos aos governantes para punir aqueles que consideravam “subversivos”. O decreto permitia o fechamentodo Congresso Nacional, além da intervenção do governo federal emdecisões dos estados, institucionalizou a censura e proibiu ohabeas corpus para presos políticos. Em 1978, no governo do general Ernesto Geisel, o AI-5 foi revogado.