Zumbi e Palmares, a resistência negra contra a escravidão

20/11/2008 - 19h11

João Carlos Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O negro éuma folia/ de dores e sentimentos/ é corpo velho salgado/ éjovem querendo vento/ é busca de liberdade/ em canto, guerra elamento” (Como negro – Paulo Ricardo de Moraes)Os descendentes deZumbi, como o poeta e jornalista Paulo Ricardo de Moraes, autor dopoema Como Negro, publicado no livro O Garçom e ocliente – no Balcão do Naval, carregam o DNA libertáriodo último rei do quilombo dos Palmares. A luta de Zumbi pelaliberdade absoluta atravessa mais de três séculos comouma das principais bandeiras de resistência àescravatura, à subjugação e à exploraçãoda mão-de-obra. Por isso, Zumbi e o quilombo dos Palmarescontinuam inspirando poetas e servindo de exemplo para novas frentesde batalha em busca da plena cidadania.O quilombo dos Palmaresnão foi apenas uma “sociedade guerreira”. Foi tambémum tipo de organização social que se contrapôs aomodelo colonial imposto por Portugal ao Brasil. Essa repúblicanegra dentro do estado escravagista brasileiro nasceu com a fuga de40 escravos de um engenho de Porto Calvo, no sul de Pernambuco.Depois de massacrar a população livre do engenho, elesse afastaram da Zona da Mata, e chegaram àSerra da Barriga, região hoje pertencente a Alagoas, ondecomeçaram a erguer Palmares.No seu auge, o quilomboocupou cerca de 27 mil quilômetros quadrados e teve 20 milpessoas, que trabalhavam de forma coletiva. Estava localizada numaárea fértil, banhada por rios, com flora e faunavariada. Sua população vivia em casas cobertas demadeira ou palha, espalhadas em vários núcleoshabitacionais (mocambos). Os quilombolas de Palmares produziam milho,batata-doce, mandioca, feijão e banana e também sededicarem à caça, à pesca e à criaçãode galinhas e suínos. Além disso, dominavam a técnicada metalurgia e alguns eram artesãos. Zumbi nasceu em um dosmocambos que formavam Palmares. Segundo historiadores, ele foicapturado recém-nascido por uma das diversas expediçõesmilitares feitas para dominar o quilombo. Em 1655, de acordo comlivros que reconstituem a história do quilombo, Zumbi foi dadoao padre Antonio de Melo, do distrito de Porto Calvo. Passou a serchamado de Francisco, foi alfabetizado e chegou a estudar latim.Embora fosse bem tratado pelo religioso, que o fez coroinha aos dezanos, Zumbi fugiu com um grupo de escravos e retornou a Palmares em1670.De volta ao quilombo,narram os historiadores, Francisco se desfaz do nome cristão –símbolo de sua condição escrava – e passou a sechamar Zumbi - palavra de origem africana que significa “Deus daGuerra”, “Fantasma Imortal” ou “Morto Vivo”. Embora tivesseapenas 15 anos, ele começou a se destacar como chefe militar,o que o levou depois ao mais alto posto: o de rei de Palmares. Zumbisubstituiu Ganga Zumba, deposto por ter assinado um acordo de paz coma Coroa portuguesa. O jovem guerreiro foi contra esse pacto, porentender que os brancos não iriam cumpri-lo.Sob o comando de Zumbi,Palmares também rejeitou o acordo de paz proposto pelo reiportuguês Pedro II, em 1685. O monarca chegou a enviar carta aolíder negro, na qual reconhecia as maldades praticadas poralguns senhores em desobediência às suas ordens.Enquanto isso,permanecia o cerco permanente a Palmares e a caça a Zumbi. Ossenhores de engenho da região jamais se conformaram com aexistência do quilombo, com sua prosperidade e sua organizaçãosocial. Em 1693, o paulista Jorge Velho, conhecido pela brutalidadecom que caçou índios durante o movimento das bandeiras,organizou uma expedição para atacar Palmares, que foidominado em 1694.Zumbi conseguiusobreviver ao ataque e se escondeu na mata. Em 20 de novembro, elefoi atingido com uma punhalada desferida pelo mulato AntônioSoares, que até então era de sua inteira confiança.Soares foi capturado pelos expedicionários, torturado erecebeu a promessa de ganhar a liberdade se levasse o grupo depaulistas até o esconderijo do líder negro. Ferido, Zumbi acabou morto pelos expedicionários. Seu corpo foi levado para Porto Calvo e decapitado por ordem dogovernador da capitania de Pernambuco, Melo e Castro.A cabeça deZumbi foi salgada e espetada num pedaço de pau na principal rua dePorto Calvo, onde ficou até se decompor por inteiro. A luta dolíder negro e de Palmares, entretanto, atravessou o tempo efoi definitivamente resgatada a partir de 1971, no Rio Grande do Sul,pelo poeta negro Oliveira Silveira. Herói da luta contra aescravidão, Zumbi segue habitando o imaginário de seusdescendentes e levando-os a louvar a resistência negra noBrasil:“O negro écomo uma folha/ que responde a ventania/ balança, dançae não morre/ tem a briga por mania/ é lindo que sóo tempo/ é feito de poesia...”  (Como negro – Paulo Ricardo de Moraes)