Supremo começa a decidir se mantém ou muda demarcação da Raposa Serra do Sol

27/08/2008 - 5h45

Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Os ministros do SupremoTribunal Federal (STF) iniciam hoje (27), às 9h, julgamento emque decidirão se a demarcação em áreacontínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, emRoraima, será mantida ou modificada. Está em jogo apermanência de menos de uma dezena de grandes produtores dearroz e 50 famílias de agricultores brancos emparte da área de 1,7 milhão de hectares, onde vivem 18mil índios das etnias Macuxi, Wapichana, Patamona, Ingaricóe Taurepang. Os brancos se recusam a deixar a reserva por nãoconcordar com as indenizações propostas pela FundaçãoNacional do Índio (Funai) após o decreto dehomologação, de 15 de abril de 2005. Os índios reivindicam, sob o argumento de se tratarem de terras tradicionais, odireito de exercer a ocupação exclusiva da área,aguardada há décadas. Ao todo, há noSTF 33 ações que contestam a demarcação.A que será julgada hoje foi protocolada pelos senadores deRoraima Augusto Botelho (PT) e Mozarildo Cavalcanti (PTB). Elessustentam que o laudo antropológico que resultou na demarcaçãoem faixa contínua é falso e defendem a exclusãode áreas produtivas, sede de municípios e estradas. Adecisão que for tomada pelo STF neste processo deveráser estendida aos demais sobre o mesmo tema e influenciar oreconhecimento de outras terras indígenas no país.“Nós vamosdecidir sobre Raposa Serra do Sol. Mas se decidirmos a partir decoordenadas constitucionais objetivas, é evidente que issoservirá de parâmetro para todo processo demarcatório,se não os passados, ao menos os futuros”, afirmou nesta semana o relator da ação, ministro Carlos Ayres Britto. A tensãoinstalada em Roraima é um ingrediente a mais para a disputa,acompanhada pela Agência Brasil em coberturasespeciais. Em abril deste ano, uma operação da PolíciaFederal (PF) para a retirada dos não-índios foisuspensa por liminar do próprio STF. Na época, pontesde acesso à terra indígena foram destruídas euma base de resistência armada foi montada na Vila Surumu sob aorientação do líder dos arrozeiros, Paulo CésarQuartiero, prefeito de Pacaraima (RR). Quartiero já foi presoduas vezes, uma delas em maio, quando índios foram baleadospor funcionários do produtor ao tentar construir malocas noslimites de sua propriedade. Nos últimos dias, índios eprodutores intensificaram manifestações públicase trocaram ameaças. Pelos menos 300 agentes da PolíciaFederal e da Força Nacional de Segurança monitoram aárea. Para tornar a questãoainda mais complexa, as próprias comunidades indígenasse dividem entre o apoio e o repúdio aos produtores de arroz, sentimentos potencializados pela influência religiosa.Comunidades evangélicas não se opõem àpermanência dos arrozeiros, enquanto as católicas querema expulsão. Uns dizem que os produtores geram emprego, outrosque eles degradam o meio ambiente e ameaçam as tradiçõesindígenas. O julgamento deverádurar pelo menos dois dias, caso não haja pedido de vista, e começará pela leitura dorelatório do ministro Britto. Em seguida, váriaspartes interessadas deverão fazer sustentaçõesorais. De um lado, a Advocacia Geral da União (AGU), a Funaie o Conselho de Indígenas de Roraima, em defesa da demarcaçãocontínua. De outro, os autores da ação, o governo de Roraima e a associação dos arrozeiros doestado pela anulação da demarcação. A Procuradoria Geral da República também apresentaráum parecer. O relator revelaráo seu voto, redigido em 108 páginas, após todas aspartes se manifestarem. Nos últimos meses, todas as vezes emque foi questionado sobre a matéria, Ayres Britto evitoudeclarações conclusivas, mas revelou ter observado emvisita à Raposa Serra do Sol vazios demográficos. Opresidente do STF, ministro Gilmar Mendes, chegou a declarar que aConstituição Federal oferece soluçõesadequadas para o impasse.