Falta de apoio acentua crise do governo argentino, avalia cientista político

26/07/2008 - 16h05

Danilo Macedo
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A falta de apoiopopular é uma das grandes diferenças entre os governosdo ex-presidente argentino Néstor Kirchner e da atual presidente Cristina Kirchner. Esse cenário,amplificado pela crise de abastecimento de alimentos e energia nosgrandes centros, torna a situação do governo argentinoainda mais complicada. A conclusão é docientista político da Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ), Antônio Celso Pereira.“NéstorKirchner pegou a Argentina num momento extremamente caótico,completamente falida e arrasada. Então, ele tomou medidasmuito éticas e muito sérias, com o apoio do povo, econseguiu começar a retomar o crescimento. Mas nãoconseguiu investir, porque a indústria foi completamentedesbaratada na política suicida praticada nos anos Menem e nosanos anteriores também”, afirmou Pereira à AgênciaBrasil.Segundo o cientistapolítico, Cristina, esposa de Néstor, está tentando dar continuidade aotrabalho feito no governo de seu marido, mas as dificuldadesaumentaram com a crise em que a economia mundial entrou. Dessa forma, a forma encontrada por Cristina para tentar controlar o abastecimentointerno e, ao mesmo tempo, aumentar a arrecadação paragarantir investimentos em infra-estrutura, foi sobretaxar asexportações de grãos.“A exportaçãode grãos da Argentina, que tem estrutura agrícola muitoimportante, é a única fonte forte de arrecadaçãodo governo. Com os preços das commodities agrícolas láem cima, o governo aumentou os impostos para arrecadar mais”,explicou. Entretanto, essa medida acabou gerando umaseparação ainda maior entre sociedade e governo, na sua análise. Quando as exportaçõesde grãos foram sobretaxadas, em março, os agricultoresbloquearam as principais estradas dos país e, com o risco dedesabastecimento, a classe média dos grandes centros urbanosse juntou aos protestos, realizando os panelaços. “Oque era forte nos três primeiros anos do governo de NéstorKirchner, que foi um apoio total da sociedade, não estáhavendo mais. A sociedade está divorciada, rompida com ogoverno”, avaliou Pereira.Com a derrota dogoverno argentino no Senado, na última semana, que acabouderrubando o projeto de lei que sobretaxava as exportações,com o voto de minerva do vice-presidente da República, JúlioCobos, que preside a instituição, a criseargentina parece ter se intensificado. Alberto Fernández,ex-chefe de gabinete e braço direito de Cristina,pediu sua renúncia na última quinta-feira (24).Esses episódios,segundo Pereira, acabam tendo influência, também, sobreo Mercosul. “O Mercosul é praticamente o comércioBrasil-Argentina. Com a economia argentina desse jeito, faz água.Faz mais água ainda do que já vem fazendo hámuito tempo.”Ele ressaltou,entretanto, que apenas o aumento de impostos não écapaz de combater uma crise dessa natureza. Para Pereira, énecessário um controle fiscal maior. “O problema,principalmente de países emergentes da América Latina,é que eles gastam mais do que arrecadam, e, pior, gastam mal.Se tivessem gastando muito investindo em setores produtivos, masnão", observou.