Em Minas Gerais, cidade tem prefeito e secretário de saúde indígenas

28/03/2006 - 15h41

Janaina Rocha
Enviada especial

Rio Quente (GO) – A discussão contra a municipalização dos serviços de saúde ao indígena, que mobiliza os participantes da 4ª Conferência Nacional de Saúde Indígena, tem outro sentido para São João das Missões, no norte de Minas Gerais. Prefeito e secretário de saúde são indígenas da etnia xacriabá. A população da cidade é de cerca de 12 mil pessoas. Quase oito mil são indígenas.

José Nunes foi eleito em 2004. "Não fui eu que quis. Foi a historia que veio dizendo isso pra comunidade. A cidade não é antiga. Essa é a terceira gestão municipal. E nas duas primeiras gestões os xacriabás deram apoio aos outros candidatos e foram os vices", relata Nunes. "E agora o próprio povo, que é quem define a eleição, julgou necessário ter seu candidato."

Nunes conta ter ficado assustado com a burocracia do Estado. "Tenho buscado apoio com as lideranças da aldeia, que são os mais idosos ou os que representam suas comunidades". Ele relata que a maior parte dos xacriabás vive nas aldeias e apenas 48 famílias, hoje, estão "desaldeadas" na cidade – sem território.

A saúde, que é o principal tema de debate desta semana, ainda funciona com dificuldades à semelhança de outros povos. A seca é o principal problema da região. Nenhum rio abastece a comunidade. O mais próximo é o São Francisco, há cerca de 10 quilômetros.

"Mas a gente ainda nem começou a conversar com a população se vamos ou não apoiar a transposição", explica o secretário de saúde, Edvaldo Gomes Oliveira. "Tudo é conversado com os representantes nas aldeias. Eles colocam os problemas pra gente e tentamos resolvê-los."

Oliveira diz que a Funasa repassa cerca de R$ 90 mil ao mês para o atendimento básico que se distribui em cinco pólos base de saúde. "Tem um hospital que sempre funcionou mal. Existe praticamente só a estrutura dele, e, na verdade, nunca contamos com ele. Para o atendimento de média complexidade, vamos ao hospital de Manga, que fica também há uns dez quilômetros. A Funasa repassa R$ 16 mil para isso".

Nunes diz que em sua administração convênios foram fortalecidos para a formação de indígenas nas áreas técnicas de saúde. Sete xacriabás estão se formando como técnicos de higiene dental. "As lutas são as mesmas, as dificuldades também, mas a administração é nossa, e há outro tipo de atenção ao índio", diz Nunes.

O prefeito foi um dos professores indígenas da escola de ensino fundamental que existe na pequena cidade mineira. Segundo ele, alguns xacriabás e índios de outras etnias entraram na universidade federal do estado. Eles estão estudando, conforme Nunes, para "fazer a escola que querem", e assim levar uma escola de ensino médio para o município.

Nunes é filho de Rosalino Gomes de Oliveira, cacique morto há 18 anos. O pai foi assinado na ocasião da homologação das terras xacriabás a mando de um fazendeiro de Manga.