Iolando Lourenço e Gabriela Guerreiro
Repórteres da Agência Brasil
Brasília - A Câmara dos Deputados vota amanhã a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autoriza a desapropriação de terras onde for constatado o trabalho escravo.
O relator da PEC, já aprovada no Senado, deputado Tarcísio Zimmermann (PT-RS), estima que existam hoje perto de 25 mil trabalhadores sujeitos à escravidão no Brasil. Durante fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho entre os anos de 1995 e 2003, foram encontradas indícios de trabalho escravo em 262 fazendas das 1.014 visitadas, o que resultou na libertação de mais de 10 mil trabalhadores. Só em 2003, nas 197 propriedades fiscalizadas, foram encontrados 135 casos de trabalho escravo e resgatados quase 5 mil trabalhadores. "Esses dados demonstram que a fiscalização tem aumentado sua eficiência e reprimido com vigor a exploração do trabalho escravo", ressalta o relator.
A punição aos fazendeiros que mantém trabalhadores em regime de escravidão, na opinião de Zimmermann, é muito pequena. "Apesar de tantos crimes registrados, só se tem notícia de um único caso de um escravizador condenado. Mesmo assim, a pena foi convertida em entregas de cestas básicas", ironiza.
A PEC altera o artigo 243 da Constituição que só autoriza a desapropriação de terras onde for localizado cultivo de plantas psicotrópicas. Com a nova redação, o artigo inclui a desapropriação de terras onde forem localizados trabalhadores em regime de escravidão. A polêmica em torno da medida está no dispositivo que prioriza o assentamento para os colonos que trabalham nas terras. O dispositivo gerou divergências entre os parlamentares.
Segundo o vice-líder do PP, deputado Luiz Carlos Heinze (RS), representante da bancada ruralista, foi fechado um acordo para suprimir do texto a expressão "com assentamento prioritário aos colonos que já trabalhavam na respectiva gleba". Heinze afirmou que a supressão da frase irá facilitar a aprovação da matéria. Ainda de acordo com o vice-líder, caso a expressão não seja retirada do texto, a PEC não tem chances de ser aprovada – já que a bancada ruralista reúne mais de 200 deputados e não aceita a manutenção do dispositivo na emenda.
A emenda já foi modificada desde que começou a tramitar na Câmara. O deputado Tarcísio Zimmermann acolheu em seu parecer emenda dos ruralistas que acrescenta ao texto a expropriação de imóveis urbanos e dos bens neles encontrados onde houver trabalhadores sob regime escravo, sem qualquer tipo de indenização. A inclusão da emenda foi uma pressão dos ruralistas por não concordarem com a desapropriação apenas de terras rurais, enquanto há trabalhadores escravos também nas áreas urbanas.
Caso a PEC seja aprovada em dois turnos na Câmara, o dispositivo que trata do trabalho escravo em áreas urbanas terá que voltar à apreciação dos senadores antes de ir à promulgação. O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), vai negociar com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), a promulgação fatiada da emenda já que, regimentalmente, segundo o líder do governo na Câmara, Professor Luizinho (PT-SP), é possível a promulgação mesmo que seja suprimido parte do texto pelos deputados.