Brasília, 7/6/2003 (Agência Brasil - ABr) - No livro "História do riso e do escárnio", o historiador francês Georges Minois procura mostrar, ao mesmo tempo, a teoria e a prática do riso ao longo do tempo. Em um volume de 64 páginas, com tradução de Maria Elena O. Ortiz Assumpção, Georges Minois demonstra que o homem moderno vive uma dupla contradição: por um lado, muitos têm a impressão de que o riso está voltando, já que está em toda a parte; por outro, as pessoas riem cada vez menos, apesar de todas as ciências alardearem os méritos quase milagrosos do riso.
Minois refaz no livro a trajetória do riso com uma abordagem diferente, esquematizando-o em três períodos: o riso divino, o diabólico e o humano. Segundo o historiador francês, para os povos da Antigüidade, o riso tem uma concepção divina, positiva e traz a marca de suprema liberdade. Rir é participar da recriação do mundo, simulando um retorno periódico ao caos primitivo, necessário à confirmação e à estabilidade das normas sociais, políticas e culturais. Para Minois, "se os deuses riem, é porque tomam distância deles mesmos e do mundo (...). E, se os homens riem, isso é para eles uma maneira de sacralizar o mundo, de conformar-se com as normas, escarnecendo de seus contrários".
Já o cristianismo contrapõe o período anterior e concebe o riso como diabólico. Com o lema "Jesus nunca ri", os teólogos pregam que o riso é feio, sacode o corpo, é indecente e mau; exprime orgulho, zombaria, agressividade e é sinal de fraqueza. Nessa perspectiva, o riso é a desforra do diabo. Segundo o estudioso, "nas relações sociais ele é instrumento de subversão, como nas fábulas, nas farsas, nas paródias religiosas, no Carnaval e nas festa dos bobos".
De acordo com o historiador, o riso humano e interrogativo, pós-Século XVI, sucede o riso diabólico e negativo da Europa cristã e surge com o questionamento dos valores, da ascensão do medo, da inquietação e da angústia. À medida que os valores e as certezas naufragam, são substituídos pelo riso. Foi assim no século XVIII, que troçou da religião e do absolutismo; no século XIX, com a sátira e a caricatura ao governo monárquico; e no século XX, com o recuo das ideologias. Para Minois, "o riso moderno existe para mascarar a perda do sentido. É mais indispensável que nunca". O riso sempre teve um lugar de destaque em todas as sociedades e como fenômeno global sua história pode contribuir para esclarecer a evolução humana.
Georges Minois é atualmente professor acadêmico de História em Saint Brieuc, na França. Especialista em História religiosa, é autor de vários livros, entre eles, História do suicídio.