Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O estudante do curso de Letras da Universidade de Brasília (UnB) Tomás Verdi Pereira tinha 11 anos quando foi pela primeira vez a um cinema. Cego de nascença, ele diz que até conhecer, nos Estados Unidos, a audiodescrição, não tinha vontade de acompanhar sequer os programas exibidos na televisão brasileira, mesmo que seus pais se esforçassem para ajudá-lo a compreender o que se passava na tela.
"Muito raramente eu via um desenho com os meus pais. Eles iam me falando tudo o que acontecia, mas, logicamente, faziam isso sem qualquer modelo", comentou. Hoje com 19 anos, Pereira faz parte do grupo de estudos sobre audiodescrição da UnB, no qual atua como uma espécie de assessor, acompanhando a adaptação de filmes para as pessoas com alguma deficiência visual.
"As obras adaptadas não só me estimulam a assistir a um filme como me ajudam a compreender melhor o conteúdo. Sem a audiodescrição faltam informações para que os deficientes visuais possam entender o que está acontecendo", explicou Tomás. Para ele, que ainda não sabe se fará da experiência acadêmica sua profissão, a audiodescrição é um campo promissor.
Embora a atividade ainda não tenha sido regulamentada, especialistas responsáveis pela formação dos primeiros profissionais também demonstram otimismo. Para eles, a procura por mão de obra qualificada crescerá com a obrigatoriedade de as emissoras de TV digital passarem a apresentar ao menos duas horas semanais de produções adaptadas para o público com alguma deficiência visual ou intelectual.
De acordo com a professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Livia Maria Motta, a atividade tem atraído interessados com as mais diversas formações profissionais, mas principalmente os estudantes de letras e de comunicação social. Autora do primeiro livro brasileiro sobre o tema (disponível gratuitamente no site www.vercompalavras.com.br), Livia garante que já há no país o necessário número de audiodescritores para atender as necessidades iniciais das emissoras de TV.
"Mas esta é uma uma nova área profissional e sabemos que, a partir do momento em que a transmissão televisiva [audiodescrita] entrar em vigor, a demanda pelos profissionais aumentará bastante", comentou a professora. "E este é um serviço minucioso que exige muita preparação. Não basta assistir a um programa uma única vez e sair inserindo a audiodescrição. O serviço exige um mergulho no tema”.
A professora e cordenadora do grupo de estudos sobre audiodescrição da UnB, Soraia Ferreira, destaca que o país, além de formar mão de obra especializada, tem avançado na pesquisa. A universidade deve abrir um curso de extensão em audiodescrição no próximo semestre.
Conforme a Agência Brasil apurou com audiodescritores e especialistas, o trabalho de adaptação de um filme normalmente é feito por uma equipe de quatro pessoas, sendo uma delas um deficiente visual. Os valores recebido pelo trabalho variam muito, mas são pagos entre R$ 2 mil e R$ 4 mil por um serviço que exija 40 horas de dedicação.
Para Tomás Verdi Pereira, quem se dispõe a trabalhar como audiodescritor deve ser, antes de tudo, um observador atento. E saber o que de fato é relevante para que um cego compreenda uma história. Segundo o estudante, a descrição nem pode ser tão detalhista que se torne enfadonha, nem tão suscinta que não permita a visualização do que acontece, silenciosamente, na tela.
Edição: Graça Adjuto