Executivo e Judiciário divergem em Portugal sobre a demissão de funcionários públicos

02/09/2013 - 9h00

Gilberto Costa*
Correspondente da Agência Brasil/EBC

Lisboa - O governo português e o Tribunal Constitucional (TC) voltam a divergir sobre a legalidade das medidas adotadas para reduzir o déficit público. O primeiro-ministro Pedro Passos Coelho tem criticado sistematicamente a Corte, que equivale ao Supremo Tribunal Federal (STF) no Brasil.

Ontem (1º), ao encerrar um encontro partidário, Passos Coelho criticou o TC que considerou inconstitucional uma nova lei (aprovada em julho) que permitia a rescisão contratual de funcionários públicos colocados em inatividade durante um ano.

O chamado programa de mobilidade especial era uma das formas do Executivo português para cortar despesas – a meta anunciada pelo primeiro-ministro é demitir 30 mil funcionários públicos, em torno dos 5% do total de pessoas contratadas pelo Estado (menos de 600 mil).

A decisão de demitir servidores públicos foi anunciada por Passos Coelho em maio, após o TC ter vetado quatro medidas de austeridade do Orçamento do Estado 2013. “Nenhum dos acórdãos do Tribunal Constitucional que chumbou [reprovou] medidas importantes para a reforma do Estado encontrou na Constituição um óbice [impedimento]”, disse o primeiro-ministro aos seus correligionários.

Passos Coelho critica a Corte por retirar do governo instrumentos do programa de ajustamento econômico e ajuda financeira acertado com a Troika – o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Central Europeu (BCE) e a Comissão Europeia. “Precisamos reformar o Estado para poder concluir com sucesso nosso programa de ajustamento. Não é a Constituição que nos impede de fazer isso”, disse ao lembrar que os credores voltam a Portugal em meados do mês para nova avaliação das contas públicas.“Parto para essa conversa com mais dificuldades”, assinalou.

O primeiro-ministro, que não é jurista, avalia que o TC faz “leitura demasiado restritiva dos princípios constitucionais” e teme que “se cristalizem direitos adquiridos mesmo que o país não possa pagar”. “Isso é um absurdo!”, classifica ele ao dizer que o “programa de ajustamento e a Constituição não são incompatíveis”. Na semana passada, Passos Coelho chegou a sugerir que a interpretação legal do tribunal inviabiliza a reforma do Estado e que o país poderá, assim, ter que pedir novos empréstimos.

Os partidos de oposição acusam o governo de “criticar asperamente” a Justiça, e de, no “desespero”, “odiar a Constituição”. Apesar de Passos Coelho afirmar que a interpretação do Tribunal Constitucional sinaliza instabilidade aos credores no mercado financeiro, os efeitos da decisão da Corte sobre os juros pagos pelos títulos portugueses foram menores do que quando houve ameaça em julho de rompimento da coligação governamental.

Segundo o analista Luís Salgado de Matos, do blog O Economista Português, os Credit Default Swaps (CDS) pagos pela dívida pública tiveram pico (de mais 9 pontos percentuais) quando Paulo Portas, atualmente vice-primeiro-ministro, ameaçou deixar o governo.

As críticas de Passos Coelho ao Tribunal Constitucional marcam a retomada da agenda política após as férias de verão (agosto) em Portugal. Enquanto não consegue demitir servidores públicos, o governo enxuga os contratos temporários. Segundo a Federação Nacional dos Professores (Fenprof), 2.166 docentes estão sendo desligados neste momento da educação publica, o setor com mais funcionários no Estado.

*Com informações da Rádio e Televisão de Portugal (RTP) e Agência Lusa

Edição: Talita Cavalcante