Gilberto Costa
Corresponde da EBC
Lisboa – Passado o primeiro mês de entrada em vigor do Orçamento do Estado (OE 2013), em Portugal (que incluiu aumento generalizado de impostos e redução das aposentadorias e do seguro desemprego), a constatação nas ruas e nos gabinetes dos economistas de perfil não monetarista é de que as medidas de ajustamento fiscal (para equilíbrio entre receita e despesa do Estado) estão agravando o quadro social do país e diminuindo ainda mais a atividade econômica.
O desemprego está em mais de 16% (dado oficial) e o Banco de Portugal (BdP), o banco central do país, prevê queda de 7,4% do Produto Interno Bruto (PIB – a soma de bens e serviços produzidos no país) entre 2009 e o final deste ano. De acordo com a mesma instituição, o consumo privado vai cair 3,6% este ano, perfazendo uma redução acumulada de 12,4% desde 2011.
“Se reduziram as pensões e as pessoas, obviamente, têm de cortar gastos. Já não vêm aqui tomar um café ou comer bolo - não comem fora! Isso tudo vai [refletir] no meu caixa”; diz Cristiana Almeida; dona de um café no bairro de Campo de Ourique, na região nobre de Lisboa.
“Eu estou [fazendo] quase a metade do caixa que fazia há um ano, e já havia crise”; reclama Manoel Margarido, dono de una mercearia na rua atrás do Palácio de São Bento, a residência oficial do primeiro-ministro. Segundo ele, “as pessoas estão recebendo menos dinheiro e estão com medo. Não gastam porque não têm ou não gastam porque querem ficar com alguma reserva, porque não sabem o dia de amanhã”.
A avaliação da economista Manuela Silva (foto) é que as medidas do OE 2013 estão agravando essa situação porque geram um “círculo vicioso”, que reduz a arrecadação e dificulta o próprio ajustamento fiscal. “Essas medidas de austeridade produzem efeitos não desejados pela própria lógica das medidas utilizadas. As famílias viram reduzido o seu poder de compra. Logo, a atividade econômica sofreu uma quebra, que por sua vez repercutiu nas receitas do próprio Estado”.
A economista que também é professora do Instituto Superior de Economia e Gestão acrescenta que a austeridade agrava a situação social em Portugal. “A pobreza aumenta significativamente e atinge estratos sociais que até há pouco estavam abrigados da pobreza”.
“Estamos [assistindo] a aumento das desigualdades socioeconômicas. As medidas de austeridade não foram pautadas com objetivo de diminuir as desigualdades”, lembra. Segundo ela, a situação se agrava por causa do desemprego, da desvalorização do trabalho (com redução do poder de compra efetivo dos salários) e do aumento da tributação.
Segundo o Orçamento, o Imposto de Renda para Pessoas Singulares (IRS) - equivalente ao Imposto de Renda de Pessoa Física no Brasil – teve aumento universal de 3,5% e as faixas de alíquotas caíram de oito para cinco, o que resultou no incremento da cobrança do imposto, que é descontado na fonte. O economista Nuno Alves (do Banco de Portugal) confirma que “o elevado aumento da taxa média de imposto” acarretará na “ligeira diminuição de progressividade do imposto”.
A progressividade dos impostos (isto é, a maior incidência quanto maior a renda) é tradicionalmente destacada pelos economistas com o medida de redução das desigualdades. Outra estratégia são as transferências do Estado para os mais pobres. Segundo Alves, o Estado português transfere proporcionalmente e em valores absolutos menos recursos que os de outros países da Europa, mas é mais justo e eficiente. “Portugal é mesmo um dos países em que as prestações em dinheiro (excluindo pensões) são mais orientadas para os rendimentos mais baixos”.
A avaliação de Nuno Alves descrita em estudo que acompanha o Boletim Econômico de Inverno do BdP contraria o argumento do governo de que é necessário “refundar” o Estado social para que se torne mais eficiente e mais justo. Para diminuir as despesas do Estado, o governo português deve anunciar ainda este mês corte de 4 bilhões de euros (cerca de R$ 10,8 bilhões) - o que equivale à 5% do OE 2013.
Edição: Tereza Barbosa
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