Amanda Cieglinski*
Enviada Especial
Salamanca (Espanha) - Ex-alunos de escolas públicas deixaram para trás a família, o casamento e os filhos para correr atrás de uma oportunidade que eles mesmos definem como única: estudar na Universidade de Salamanca, na Espanha, uma das mais antigas e tradicionais do mundo. Já são 28 jovens brasileiros, bolsistas do Programa Universidade para Todos (ProUni), estudando na instituição. O grupo que chegou mais recentemente ao país, em abril deste ano, conta as surpresas e os problemas de adaptação que tiveram que enfrentar. A diferença climática, a culinária local e principalmente o idioma dificultam a adaptação – além da saudade dos amigos e parentes que ficaram no Brasil.
O convênio ProUni-Salamanca teve início em 2010 e seleciona anualmente os dez mais bem classificados no programa de bolsas para estudar na Espanha, com o curso e as despesas pagas em parceria com o Banco Santander. Dois desistiram e retornaram ao Brasil. Todos os participantes chegaram à Salamanca sem falar espanhol. Eles tiveram um mês para aprender a língua antes de prestar “vestibular” para poder ingressar na universidade. Muitos não foram aprovados e terão nova chance em setembro – caso não passem, devem retornar ao Brasil.
“Ter que estudar em um mês para se preparar para a seleção é muita pressão. Principalmente porque não temos o apoio da família aqui”, explica Talles Vinicius Medeiros, de 22 anos, de Belém (PA). Ele conta que nos primeiros dias queria voltar ao Brasil. Mas agora, fluente em espanhol, está confiante que vai passar na próxima prova. Ele quer cursar matemática.
A vice-reitora de Relações Internacionais da universidade, Noemí García, diz que é um “milagre” a velocidade com que os bolsistas brasileiros aprenderam espanhol. Na instituição, eles fazem aulas intensivas da língua e recebem apoio do Centro de Estudos Brasileiros da universidade.
Para Natasha de Sousa, de 21 anos, o maior problema não foi o idioma, mas a saudade da filha de 2 anos que deixou no Brasil. No começo, pensou em voltar, mas apostou que com a experiência poderá dar um futuro melhor para a filha. “Quando converso com ela pela internet é muito difícil escutar que uma criança de dois anos já saiba o que é saudade”, diz a jovem, moradora de Samambaia, cidade do Distrito Federal. Na capital, Andreza trabalhava como operadora de telemarketing e agora estuda para ser aprovada na seleção de setembro e estudar matemática.
Ageilson Torres da Silva, 28 anos, resolveu o problema da saudade: trouxe a mulher, Thalyta da Silva, para morar com ele em Salamanca. A bolsa, de cerca de 700 euros, na teoria é para apenas uma pessoa, mas eles fizeram as contas e garantem que é possível sustentar os dois com o dinheiro. Ela pretende aproveitar a oportunidade para também estudar espanhol.
Além do espanhol, eles contam que também tiveram muita dificuldade com a matemática. O nível de exigência no vestibular da universidade é muito maior e são cobrados vários conteúdos que eles nunca tinham estudado no Brasil durante o ensino médio.
Nesta semana, um grupo de dez alunos se encontrou com o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que estava na cidade participando de uma reunião com os ministros da Educação ibero-americanos. Contaram das dificuldades e agradeceram a oportunidade de estar no país.
Andreza Oliveira , 21 anos, também de Belém, pediu ao ministro que o ensino da matemática seja reforçado no Brasil. Ela conta que só após muito estudo conseguiu ser aprovada no curso de matemática, mas observa que o nível de aprendizagem nas escolas ainda é muito baixo em comparação ao exigido na Espanha.
Mercadante disse que apesar dos problemas de adaptação, o programa é exitoso, principalmente pelo grande esforço dos estudantes brasileiros. “São jovens muito valentes, corajosos e dedicados. Eles agarraram a oportunidade com muita força e são todos de famílias bastante humildes. São casos muito especiais”.
Mercadante disse ainda que é possível aprimorar o programa, oferecendo aulas de espanhol aos alunos antes que embarquem para o país. Ele fez um apelo aos alunos para que retornem ao país quando concluírem a graduação. “Nós precisamos de vocês lá”.
*A repórter viajou a convite da Fundação SM, uma das entidades organizadoras do Congresso das Línguas na Educação e na Cultura
Edição: Graça Adjuto