Caráter conservador da política econômica não permite que Brasil estatize crédito, diz Belluzzo

23/01/2009 - 19h56

Luciana Lima
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O economista Luiz Gonzaga Belluzzo afirmou hoje (23) que a idéiade estatizar a concessão de crédito no Brasil poderiater o efeito de romper um ciclo de desaceleração daeconomia. No entanto, Belluzo não acredita que o governobrasileiro adote esse tipo de medida pelo caráter conservadorque tem marcado a política econômica do país."Quando se tem uma crise, há umracionamento de crédito e existem ainda medidas que vãoalém do que realmente é necessário. Com medo dainadimplência, as instituições financeirascomeçam a inflar o spread [diferença entre oque se paga e o que se recebe em operaçõesfinanceiras], além de outras medidas. Isso acaba aumentando orisco de inadimplência, é um ciclo", disse oprofessor da Universidade de Campinas e ex-secretário dePolítica Econômica.A idéia é usar o Banco Central comoprovedor de liquidez para o sistema financeiro. O Banco Central éque atuaria como "emprestador" de dinheiro e a redebancária funcionaria apenas para repassar esses recursos,seguindo as regras determinas pelo BC."Mas não acho que isso seriaimplantado no Brasil, que tem um comportamento muito conservador nacondução da política econômica. Hátemor até de dizer as coisas, de falar das idéias, dedizer as palavras", disse o economista, que classificou aperplexidade diante da idéia como "ataque de caipirice".A idéia deum controle estatal sobre a oferta de crédito vem sendoadotada em outros países, inclusive nos Estados Unidos, comoforma de garantir a oferta e minimizar os efeitos da crise financeiramundial. "É claro que a situação dos bancosnorte-americanos, com US$ 4 trilhões de ativos podres prestesa vir à tona, é muito pior que a dos bancosbrasileiros. Mas não podemos ter os olhos fechados para asdiscussões que estão ocorrendo em todo mundo",destacou.Para Belluzzo, o conservadorismo brasileiro podeser um fator prejudicial na busca de alternativas para solucionarproblemas advindos da crise financeira mundial: "Nenhumaeconomia funciona sem crédito e é preciso resolverisso."Já o economista José LuísOureiro, professor da Universidade de Brasília (UnB), acreditaque a idéia de controle estatal do crédito sópoderia ser adotada quando todos os esforços para expansãodo crédito tiverem sido adotados."Esse tipo de medida é inconsistente,porque implica aumento de liquidez e isso não écompatível com um cenário de juros altos, como ocorreno Brasil. Ou seja, o Banco Central não pode fazer duas coisasao mesmo tempo. Sou favorável à expansão docrédito, mas com redução de juros.Nos Estados Unidos a taxa de juros adotada peloFederal Reserve (FED - o Banco Central americano) é zero. "Umamedida dessas só se faz quando a autoridade monetáriajá fez tudo o que se podia fazer para expandir o crédito,já baixou os juros ao máximo. Quando se chega nesseponto, estatizar o crédito é a única coisa quese pode fazer", considerou.Para Oureiro, que faz parte do Conselho deDesenvolvimento Econômico e Social, órgãoconsultivo da Presidência da República, o governobrasileiro ainda tem um largo campo para agir com o objetivo deexpandir o crédito. Ele defende que o governo use mais osbancos públicos. "Da mesma forma que o governo fez um aportede recursos de R$ 100 bilhões para o BNDES [Banco Nacionalde Desenvolvimento Econômico e Social], poderia fazer parao Banco do Brasil e para a Caixa Econômica Federal. Poderiamser aportes menores, de R$ 50 bilhões para o Banco do Brasil ede R$ 30 bilhões para a Caixa Econômica . Tenho certezade que, se o governo fizesse isso, os bancos privados iriam acabarfazendo o mesmo, com medo de perder mercado", afirmou .Já o economista Salomão Quadros,professor da Fundação Getulio Vargas, não vêcom bons olhos a possibilidade de o governo assumir por completo aresponsabilidade, mesmo que temporária, pela oferta de créditoem um momento de crise, como o atual. O perigo, de acordo comQuadros, é que as concessões de créditodesconsiderem os fatores de risco."Se o bancoprivado tem dinheiro para emprestar e avalia que não deve, háuma avaliação de risco, que pode ser conservadora, masque pode ter razão de existir. É inegável que háempresas e pessoas que não estão em condiçõesde contrair empréstimos neste momento. A hora não éessa porque não há demanda, a produçãocaiu. É preciso saber que o que não se pode fazer com ocapital privado, também não se pode fazer com opúblico", destacou.Na opinião de Quadros, para conter osefeitos da crise, o governo deve continuar trabalhando com as medidasde redução e isenção de impostos para ossetores mais prejudicados, como foi o caso do automobilístico,e investindo na construção de infra-estrutura."O Brasil possui gargalos que ainda nãoforam superados. Eles continuam existindo, só que ninguémfala deles agora porque estamos em um período de produçãobaixa. Quando a crise passar e a produção for retomada,vai bater no gargalo de novo. Investir na construção derodovias, ferrovias, na renovação da matriz energéticaé uma caminho importante, além de representar um bomuso do dinheiro público",afirmou Quadros.