Julio Cruz Neto
Enviado especial
Santa Cruz de la Sierra (Bolívia) - O departamento (estado) boliviano de Santa Cruz estános preparativos finais para declarar sua autonomia em relaçãoao governo federal, implementar uma AssembléiaLegislativa e, a partir daí, criar suas próprias leis.Ontem (13), o presidente da Bolívia, Evo Morales, disse que o estatuto autonômico,já aprovado, é ilegal. Policiais de estados vizinhosestão sendo enviados para a capital de Santa Cruz, Santa Cruz de la Sierra,onde a população promete tomar as ruas para apoiar aautonomia.O estatuto será apresentado àpopulação amanhã, às 10 horas (12 horas em Brasília). No fim da tarde, um parque da cidade será usado para a concentração popular que lembrará oprimeiro aniversário do Cabildo del Millión,manifestação de apoio à autonomia, que reuniu ummilhão de pessoas em dezembro passado. Está em cursouma campanha para repetir o quórum, e muitas pessoas acham que isso épossível. A cidade tem pouco mais de 2,4 milhões dehabitantes.Obter informações confiáveisé difícil, portanto, mesmo amanhã não será fácil precisar o número de manifestantes. Hámuita contra-informação em curso, já que o paísestá fortemente dividido entre os que apóiam e os quese opõem a Evo Morales. Muitos deles, com o preconceito naponta da língua, estão prontos a dizer que agora Santa Cruzestará "livre do índio". Evo é um lídercocalero de origem indígena e seu projeto constitucionaltransforma a Bolívia em um país "plurinacional",prevendo uma série de direitos aos povos autóctones,inclusive autonomia territorial.Um boato dá conta de que o presidenteda Venezuela, Hugo Chávez, está enviando aviõescom 600 militares para ajudar a Bolívia a reprimir asdeclarações de autonomia.Além de Santa Cruz, outros três estados devem fazê-lo: Beni, Pando e Tarija,que conquistaram o direito à autonomia em umreferendo ocorrido em 2004. No entanto, eles afirmam que a Constituiçãoproposta por Evo Morales não lhes garante esse direito naprática.A notícia do envio de aviões venezuelanos foi repercutida por veículosde comunicação do Acre, que faz fronteira com o departamento de Pando. O estado brasileiro tem orientado os cidadãos a evitarem cruzar a fronteira.Ogoverno boliviano nega a suposta manobra de Chávez. Recentemente, porém, um avião venezuelanofez um pouso de emergência em Rio Branco, capital do Acre, após serexpulso da Bolívia por cidadãos que apedrejaram o veículo em umaeroporto, sob a alegação de tratar-se de uma operaçãovenezuelana para treinar militares bolivianos.Segundo o comandante da polícia da Bolívia,general Miguel Vázquez, a única mobilizaçãoem curso é o envio de 400 policiais de estados vizinhos paraSanta Cruz, a fim de evitar depredações e invasõesa bens públicos. Ele disse que sequer as Forças Armadasestão mobilizadas. Evo Morales afirmou ontem que elasestão de prontidão. Hoje, seu porta-voz, AlexContreras, disse que serão respeitadas as mobilizaçõesque respeitem "a lei e a ordem", mas não serãopermitidos atos de vandalismo. Ele também negou a mobilizaçãode militares e a possibilidade de declarar estado de sítioou confinar prefeitos (governadores).Uma informação concreta é quehoje o governo federal e o Congresso receberão oficialmente daAssembléia Constituinte, em La Paz, o texto aprovado na semanapassada e que agora deve ser submetido a referendo popular. Amanhã haverá um ato público de movimentossociais aliados a Evo Morales em apoio à Constituição,também na capital do país.No principal jornal de Santa Cruz de la Sierra, oEl Deber, as duas informações foram condensadasem uma nota de uma coluna no meio da página, abaixo da notíciade que o estatuto autonômico reconhece convençõesda Organização Internacional do Trabalho (OIT) e daOrganização dos Estados Americanos (OEA) sobre direitos dosíndios.Anúncios de página inteira mostram dezpontos pelos quais o estatuto estadual garantiria autonomia e aConstituição, não. O primeiro deles é queo projeto constitucional "desintegra" os departamentos emprovíncias, municípios, territórios indígenase regiões.Ontem à noite, houve vandalismo e agressõesem Sucre, capital do departamento de Chuquisaca, onde três pessoasmorreram quando a Constituição foiaprovada em primeira instância. Segundo a AgênciaBoliviana de Informação (estatal), funcionáriosda Assembléia Constituinte foram tomados como reféns etiveram o carro queimado enquanto tentavam retirar documentos dasede da Assembléia.Hoje, o jornal El Mundo, de Santa Cruz,publicou fotos de integrantes da Unión Juvenil Cruceñista,grupo de choque do Comitê Cívico de Santa Cruz, armadose preparando-se para eventuais confrontos contra marchas que nãoapóiem a autonomia. No centro da cidade, máscarasanti-gás eram distribuídas.