Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - O leitorJosé Fernando Moleda, que se identificoucomo profissionalde prevenção de acidentes“há 27 preciosos anos”,escreveu para esta Ouvidoria comentando as notícias queleu na Agência Brasil sobreo acidente como avião da TAM em São Paulo. Paraele, a afirmação do superintendentede engenharia da Infraero, ArmandoSchneider Filho, garantindo que a pista molhada não tinha sido responsávelpelo acidenteenvolvendo o Airbus A320, o havia levadoà conclusão de que,neste país, sóse aprende que a prevençãodeve acontecer depoisdo acidente. No jornalismo,os conceitos de prevençãode acidentes tambémpodem ser usados quandose acompanham os processos históricos em curso. No caso de Congonhas, umaAção Civil Pública datada de 24 de janeiro deste ano, impetrada pelo MinistérioPúblico Federal contra a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a EmpresaBrasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) dava conta dos riscosiminentes de um acidente como o que aconteceu esta semana.Na ação,essas duas instituições públicas, consideradasrés, são responsabilizadas por não terem feitoo dever de casacom relaçãoà infra-estrutura aeroportuárianas últimas décadas. Nela, encontramos citações como: “A abstençãodo poder públicoé uma das formas maisnocivas de violação da lei. O direitoao funcionamento dos serviços públicosse inscreve destacadamente no elenco de direitosessenciais do cidadão”.E ainda: “O equilíbrioe a estabilidade sociaisdependem, cada vezmais, da eficiênciae moralidade da administraçãopública, cujas repercussões atingem, constantemente, os interessesde cada umdos membros da sociedade”.Cheguei a essa ação em 8 de fevereiro, quandofazia uma análise da cobertura da Agência sobre o assunto,fruto da demandade um leitorque criticava o fatode não terem sido ouvidosos moradores dos arredores do aeroporto nas matériassobre a decisãodo juiz Ronald de CarvalhoFilho e sobrea contradecisão, tomada pela Justiça Federal 24 horasdepois, protagonizada pelos órgãos públicos responsáveispela infra-estruturaaeroportuária – a Infraero e a Anac.Ambas, decisão e contradecisão, forammotivadas pela AçãoCivil Públicaque pediu a interdiçãototal do aeroportode Congonhas.A análisede 12 matérias publicadas entre 10 de janeiroe 8 de fevereiro deu origem a uma das muitas Colunasdo Ouvidor elaboradas parateste – e quepor issonão foram divulgadas – até chegarmos ao formatodefinitivo desta colunaem 23 de março.Sob o título “Direito à vida versus direito ao consumo”,a Ouvidoria ponderava que a Agência em sua cobertura sobreos fatos havia deixado de informarao cidadão queera justamenteo seu direitoà vida, à segurançae à integridade físicaque estavam emjogo portrás daquela polêmicajurídica. Eraisso queafirmavam os procuradores federais na ação. Nela também eram contemplados os direitosdo cidadão enquantoconsumidor. Nãosó o consumidorde passagens das companhiasaéreas, mas antesde tudo o consumidorde serviços aeronáuticos. Segundo os procuradores,isso significa aeroportose tudo queeles contêm: as pistas,que nãodevem ser curtas nemderrapantes; os controladores de vôo, que não devem trabalhar sob pressão; o pessoal deterra, que mesmo em dias de chuva não devem correr riscos de ser atropelado por aviões de80 toneladas; as salasde espera, quedevem acomodar a todosque esperam poraviões quenão devem se atrasar; e mais a segurança dospassageiros, é claro.As matériastraziam a decisão do juiz proibindo pousose decolagens de aviões de grande porte ea informação de queela estava baseadana ação do MinistérioPúblico, masnão tratavam do conteúdoda ação. Elasmostraram a reação da Infraero e da Anacrecorrendo da decisão do juiz e sua revogação por parte da JustiçaFederal, masnão explicavam as implicaçõesdessa decisão. À época,a Ouvidoria deixou no ar algumas perguntas como sugestão para que a AgênciaBrasil não sóaprofundasse a apuração como também acompanhasse o processohistórico emcurso, pois suas conseqüênciaspoderiam ser as queinfelizmente aconteceram nesta semana. Entre as sugestõesde perguntas paraser respondidas pelareportagem estavam as seguintes: Será que, revogada a interdiçãojudicial, revogaram-se também as causasda ação? Será queo aeroporto, quecompletou 80 anos em2006, tornou-se mais segurocom a decisãoda Justiça? Será queos cidadãos quemoram no entorno do aeroporto, ou que trafegampelas avenidas queo circundam, ou quetrabalham nas pistas de pousoe decolagem, ou aindaque embarcam nosaviões, estão maisseguros depoisque a Justiçaliberou o aeroporto? Daquela épocapara 17 de julho, antesdo acidente, a Agência Brasil publicou mais138 matérias sobreCongonhas, das quais104 (75%) tratam de atrasos ou cancelamentosde vôos segundoboletins da Infraero e da Anac. Nove matériastratam da reforma nas pistas do aeroporto, 13 da CPI da criseaérea e apenas12 se referem à questão da segurançanaquele aeroporto. Nenhuma matéria responde àquelas perguntas.Mas uma pergunta foiparcialmente respondida pelos fatos. Aquela que os procuradores fizeram naconclusão de sua ação em janeiro de 2007: “Quantas vidas mais serão colocadasem risco para que medidas efetivas e satisfatórias sejam tomadas?”.Até a próxima semana.