Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A aproximação do Brasil com os demais países do Hemisfério Sul nos últimos quatro anos, evitou avanços na balança comercial com os Estados Unidos, na avaliação do ex-embaixador brasileiro em Washington, Roberto Pinto Ferreira Mameri Abdenur. “Uma das minhas críticas ao que considero um ênfase excessiva no Sul-Sul é que isso se fez em detrimento de uma alocação mais equilibrada de recursos financeiros, humanos e materiais para a promoção comercial nos estados Unidos”, afirmou em reunião na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, hoje (27). Na opinião do ex-embaixador, é “perfeitamente possível” diversificar parcerias e mercados sem prejuízo às relações com parceiros importantes, como os Estados Unidos. “O que observo é que a ênfase na abertura de novos mercados e na relação sul-sul nos levou se não a prejuízos, pelo menos a lucros cessantes, porque foram muito parcos os recursos destinados ao apoio ao exportador brasileiro no Estados Unidos”, reiterou. “É um mercado tão dinâmico e tão grande que acho que deve ser tratado com mais atenção”, complementou.Abdenur ficou á frente da embaixada do Brasil nos Estados Unidos por dois anos e 10 meses e foi substituído no cargo no começo deste ano pelo também diplomata de carreira Antonio Patriota. Agora aposentado, não esconde suas críticas em relação à política de relacionamento entre Brasil e Estados Unidos estabelecida pelo atual governo. “Eu não podia, como embaixador na ativa, fazer certo tipo de crítica, mas quero deixar claro que na confidencialidade da correspondência diplomática sempre deixei claras minhas posições, de certo modo diferentes ou discordantes das posições do Itamaraty em assuntos da relação Brasil- Estados Unidos ou assuntos que eram relevantes para as relações Brasil-Estados Unidos”, revelou.Segundo ele, graças à orientação política do Itamaraty sua atuação limitou-se a evitar prejuízos á balança comercial brasileira. “Contribui em escala muito modesta para aumentar as exportações do Brasil para os Estados Unidos e é exatamente isso que eu lamento. O que eu fiz foi, sobretudo, evitar prejuízos de centenas de milhões ou até bilhões de dólares para as exportações correntes do Brasil aos Estados Unidos mediante solução para problemas de propriedade intelectual, antidumping renovação do sistema de preferências americanos”, relatou.O ex-embaixador defende uma maior aproximação entre Brasil e Estados Unidos, sem atrelamento nem enfrentamento. “Hoje nos é perfeitamente possível evitar o atrelamento que houve em certos momentos, mas tampouco precisamos estar na trombada com os EUA e aí vem um pouco da minha crítica à visão de que os Estados Unidos estão no coração de um sistema que é perverso, que nós devemos combater e que devemos manter uma certa aversão, distância”, afirmou. “Acho que é possível ter relações positivas com os Estados Unidos sem estar a eles subordinados e isto está sendo feito não apenas neste governo, mas isto agora está ganhando força e é um mérito”, reconhece. Na avaliação de Abdenur, Brasil e Estados Unidos podem atuar juntos no combate à fome e no fortalecimento da democracia na América Latina. “Não há dúvidas de que o governo Bush, hoje, está cometendo erros gravíssimos alhures em outra partes do mundo. Em relação à América Latina, de certo modo, cometeu o erro de ausentar-se”, opinou. “Nós não compartilhamos com os americanos a idéia de impor a democracia no Oriente Médio pela ponta de um fuzil, mas nem por isso, devemos deixar, de alguma maneira, de convergir com os EUA em questões de combate à pobreza e de apoio à democracia na região”.No âmbito comercial, a aproximação entre Brasil e Estados Unidos passa longe de uma reativação da Área de Livre Comércio das Américas. De acordo com Abdenur, a ALCA não está morta mas em “coma induzido” e poderá ser reativada no futuro. Por enquanto, porém, ele descarta a possibilidade de qualquer tratado de livre comércio com os Estados Unidos em razão das incertezas que rondam a política comercial americana. Isso porque não se sabe se o presidente Bush conseguirá renovar seu mandato pra negociações comerciais (o TPA), que expira em julho. Segundo Abdenur também há dúvidas quanto ao desfecho da atual rodada das negociações n Organização Mundial do Comércio, quanto à lei agrícola americana e seu impacto e quanto à aprovação dos acordos já assinados com o Peru e a Colômbia. “Mesmo que o Brasil hoje quisesse a Alca, não sairia”, enftizou.