José Carlos Mattedi
Enviado especial
Salvador - Durante 30 anos, a comunidade de Jardim Gramacho sobreviveucom o que retirava do lixão. Algumas gerações cresceram separando material reciclável. Após três décadas de uso do localpara o despejo do lixo da região metropolitana do Rio de Janeiro, o governocarioca decidiu que, em 2007, desativará o aterro.O fim do lixão, se é bom para a saúde pública, vai gear um problema para acomunidade: três mil catadores ficarão “desempregados”, prejudicandoindiretamente dez mil pessoas que vivem do lixão.Para enfrentar a situação, a comunidade resolveu agir, usando como arma a mobilizaçãopopular. Criou o Fórum Comunitário de Jardim Gramacho, no município de Duque deCaxias, formado por diferentes atores locais: representantes de associações de catadores,igrejas, organizações e grupos comunitários, totalizando 26 instituições. E,dessa união, finalizou um plano de ação voltado para o desenvolvimento dobairro.A experiência vem dando bons resultados e foi apresentada na5ª Expo Brasil Desenvolvimento Local, que acontece em Salvador (BA). O encontroreúne iniciativas comunitárias de sucesso.Jardim Gramacho possui 20 mil habitantes e bolsões de miséria – 50% da populaçãosobrevive de reciclagem. Sem saneamento básico, as pessoas moram em barracos demadeira e papelão e em palafitas. Durante anos, os caminhões, além de despejarem olixo, deixavam também poeira, barulho e doenças, devido aos dejetos e aproliferação de ratos e insetos.Segundo Glória Cristina dos Santos, 23 anos, representanteda Associação de Catadores do Aterro de Jardim Gramacho na Expo Brasil, os setemunicípios que formam a região metropolitana carioca utilizavam o bairro comodestino final para seu lixo. Ela defende que existe uma dívida social,ambiental e moral com os moradores da área.Antes que o lixão seja desativado, o Fórum Comunitáriodesenvolveu um plano de ação, que já teve algumas conquistas: a consolidação deum sistema de coleta seletiva com núcleos descentralizados de Duque de Caxias; acessão de um espaço para a construção do Pólo de Reciclagem, administrado peloscatadores; o possível reconhecimento profissional da categoria de catador delixo, para que sejam contratados como prestadores de serviço; a abertura de umposto de saúde 24 horas; a construção de uma creche e aumento do número devagas na escola local.“Estávamos esquecidos. Hoje, somos respeitados. A luta emconjunto fortalece as iniciativas da comunidade”, resume Glória Cristina,catadora há 16 anos, como a mãe e os oito irmãos.De acordo com estimativas da Cooperativa de Catadores doAterro Metropolitano de Jardim Gramacho, de um total de 40% do lixo reciclável geradosno aterro, apenas 2% são reaproveitados. O restante é enterrado com o materialorgânico por falta de uma política efetiva voltada para a reciclagem. Já aentidade Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre), traz os seguintesdados: no Rio de Janeiro, com 92 municípios, apenas 13 cidades têm programas decoleta seletiva; no Brasil, apenas 273 municípios –dos mais de cinco mil – têmprogramas oficiais de reciclagem, ou seja, 5% do total.