Brasil está pronto para crescer entre 5% e 6% a partir de 2007, diz Mantega

12/10/2006 - 10h47

Edla Lula
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O ministro daFazenda, Guido Mantega pretende, ainda neste ano, dar início a uma nova fase dareforma tributária. A idéia é reduzir os 37,37% do Produto Interno Bruto (PIB)da carga que pesa sobre os ombros de cidadãos  e empresários. Com isso, espera aquecer a economia, estimular oconsumo e arrecadar mais. “O transatlântico já foi colocado na rota correta”,disse Mantega em entrevista exclusiva à Radiobrás, ao afirmar que o Brasil estápronto para crescer entre 5% e 6% a partir de 2007. Eis alguns trechos daentrevista:ABr – A trêsmeses de terminar o ano, o senhor mantém a sua previsão de 4% para o crescimentodo PIB, enquanto o mercado e até o Banco Central já reduziram as projeções paraalgo em torno de 3%. O que justifica o seu otimismo?Mantega - Estáhavendo, no país, uma reativação do crédito, as empresas estão se preparandopara o final de ano que será muito melhor que o ano passado. É esperado umaumento das vendas da ordem de 10%. As empresas estão esperando este aumento deconsumo que vai ativar a economia brasileira neste último trimestre. Já nopenúltimo, crescemos a taxas muito maiores que as do segundo trimestre.ABr – Mas isso ésuficiente para recuperar o discreto desempenho do primeiro semestre e alcançaros 4% no ano? Mantega - Vários fatores positivos estãoacontecendo no país. Mais importante que crescer 4% é que nós passemos para2007 com uma economia em crescimento. Não há nenhuma razão para vocêinterromper esse crescimento no natal deste ano. A festa continua.  Aqueda da inflação para patamares inéditos no Brasil, abaixo de 3%, permite ofinanciamento em várias parcelas e elas ficam pequenininhas. Tem gente vendendoautomóveis com um real de entrada. O cidadão hoje não precisa ter alta rendapara adquirir um bem de consumo durável. Ele já pode adquirir porque asprestações estão ficando menores. Como hoje o país é confiável, seguro, tem ascontas públicas equilibradas, as contas externas equilibrad, você começa a tercrédito de longo prazo. Então, é mais fácil comprar automóvel, eletroeletrônicoe até casa. O crédito habitacional está crescendo e a indústria de construçãocivil está crescendo como não crescia nos últimos 20 anos. É um cenário todopositivo. Vamos ter dois trimestres com crescimento bastante bom, e nós já temosos sinais concretos dessa evolução do mercado. A massa salarial cresceubastante.  ABr - Esse ineditismo na inflação temo seu lado ruim.  É possível que elaseja abaixo do mínimo estabelecido como meta para 2006 (4,5% com tolerância dedois pontos para mais ou para menos) E há quem diga que o BC errou a mão nocontrole da inflação porque não praticou uma redução mais ousada dos juros, oque acabou prejudicando o desempenho da economia. Mantega - Não acredito que o BCtenha errado a mão nos juros porque eles modelaram uma queda de jurosconsecutiva que vem desde setembro do ano passado, mais de 12 meses. Aocorrência de uma inflação tão baixa como essa garante que a redução dejurosvai continuar e nós não podemos esquecer que a redução não é só daSelic. É detodas as taxas de juros do país. Todo mundo olha só para a Selic. Mastemos também a Taxa de Juros deLongo Prazo (TJLP) que o cidadão consegue no BNDES (o Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social) para fazer investimento. Elaestá em 6,87% ao ano. É a menor da história do BNDES. O resultado dissoé que quandovocê vai adquirir um automóvel, também tem as menores taxas dahistória. O fenômenoque nós tivemos nos últimos anos no Brasil foi um aumento expressivo docréditoe a diminuição da taxa de juros. O crédito ao consumidor cresceu 100%nosúltimos quatro anos. E não é só o médio e o pequeno. O trabalhador,através docrédito consignado que nós criamos, pode desfrutar de taxas de jurosmaisbaratas e ter acesso  aos bens de consumo. O crédito barateou. Osjurosestão baixos. Dá para baixar mais e eu tenho me empenhado numa lutapara que osjuros sejam cada vez mais baixos no Brasil. ABr - O setor produtivo também se queixa dacarga tributária brasileira e o senhor tem falado de uma segunda fase dareforma tributária, iniciada em 2003. O que é possível fazer ainda este ano?Mantega  - A carga tributária realmente é muito alta no Brasil. E isso vemde muitos anos. Estamos empenhados em reduzi-la. No nosso governo, o que fizemosfoi reduzir a alíquota de impostos. O imposto de renda diminuiu, imposto sobreinformática, cesta básica. Reduzimos material de construção civil, bens decapital, máquinas. Só que como o Brasil está crescendo e a renda das pessoasestá aumentando, o lucro dos empresários está aumentando, acabamos arrecadandomais. Isso acontece também porque nós estamos combatendo a sonegação. A cargasobre cada cidadão diminuiu, porém a arrecadação do governo aumentou e isso ébom para o país. Agora nós queremos continuar reduzindo a carga tributária.Queremos estimular a produção, baratear o custo da produção para que oempresário e o cidadão paguem menos impostos.ABr – O senhor fala que a carga sobre ocidadão diminuiu, mas a arrecadação aumentou. Dos 37,37% do PIB que temos hojede impostos, o senhor poderia decompor, ou seja, dizer quanto corresponde aopeso dos impostos e quanto corresponde ao excesso de arrecadação? Mantega  - Hoje você tem um fenômeno em que o cidadão vai ao supermercadocomprar um produto e encontra a um preço menor que há quatro anos. Isso acontece porquea cesta básica barateou. Em 2002, a cesta básica custava mais de R$ 220,00. Hojevocê paga R$ 201,00. Um aparelho de DVD custa dois terços do que custava hátrês anos. Praticamente todos os produtos alimentícios estão mais baratos. Oque temos é redução de tributos e aumento de produtividade.  Isto é aevolução do país. O cidadão, principalmente o de baixa renda, está tendo acessoa muita coisa. A situação da maioria dos brasileiros melhorou porque há acesso àcomida e, além disso, aumento da renda, porque o cidadão passou a ter ou o BolsaFamília ou um emprego melhor. A massa salarial aumentou também.ABr – O governo vive hoje o dilema da terque reduzir a carga para estimular a produção e o consumo e, ao mesmo tempo,precisa garantir arrecadação para responder pelos gastos públicos que sãoaltos. Mantega - Isso pode ser compatibilizado se você garantir o crescimentoeconômico. Você tem que arrecadar mais pelo crescimento, pelo faturamento, pelovolume e não porque você vai taxar mais o cidadão. A nossa estratégia é essa.Se você crescer a 5% ou 6% - e nós podemos fazer isso a partir de 2007 - aarrecadação cresce pelo volume e individualmente ela vai ser melhor. Oinvestimento do empresário vai custar menos, em determinados bens vai custarmenos e assim por diante. Você reduz a carga, o peso fiscal vai diminuindo evocê mantém a arrecadação pelo crescimento que a própria redução da carga vaipromover.ABr – O senhor tem falado em incluir noorçamento um dispositivo que seria redutor de gastos, daria mais qualidade aosgastos públicos e assim garantiria verbas para investimentos. Como pretendefazer?Mantega  - Em primeiro lugar, preciso deixar claro que nunca na históriadesse país se fez superávit primário (diferença entre receitas e despesas, semconsiderar os gastos com a dívida) acima de 4% vários anos seguidos. Aresponsabilidade fiscal está implantada. Economizamos mais de R$ 50 bilhões porano. Isso já é uma atitude responsável. Temos que ter a preocupação de sempreestar diminuindo gastos menos prioritários para viabilizar investimentos,gastos sociais etc. Essa é uma preocupação permanente nossa. A gestão decompras públicas melhorou muito, porque informatizamos todas as compras,diminuímos custos com terceirização. É claro que sempre temos que diminuirgastos e melhorar a qualidade. E eu gostaria de ver implantado um redutormodesto. Nada de choques como sugerem alguns. Sem choques. Seria um redutorgradual. A cada ano, reduz 0,1% ou 0,2% e deixa uma margem maior parainvestimentos. Esse redutor poderia ser praticado já a partir do próximo ano. Dojeito que estamos indo, com superávit primário de 4,25% nos próximos anos e PIBcrescendo a 5% e os juros caindo, nós estaremos diminuindo o déficit nominal. Adespesa total está diminuindo e vai continuar diminuindo, de modo que nóspoderemos até adotar essa idéia do déficit nominal (diferença entre receitas edespesas, incluindo gastos com a dívida) zero. ABr – O senhor pretende trabalhar para queos parlamentares insiram o redutor no projeto de lei orçamentária que está emvotação no Congresso ou espera que ele aconteça voluntariamente?Mantega  - O projeto que está na Câmara já está sendo discutido lá. Ogoverno vai fazer as contas e esperar o orçamento. Dependendo do orçamento quevier, se houver espaço já poderemos fazer esse redutor, desde que isso nãocomprometa investimentos nem os programas sociais do governo, que tiveram umaeficácia muito grande. Não podemos comprometer as conquistas que já tivermos.Então, é responsabilidade fiscal com responsabilidade social, é isso que foiimplantado e isso que queremos manter.ABr - Qual será o destino da CPMF nestasegunda fase de reforma tributária, já que a validade dela encerra em dezembrode 2007?Mantega  - Nosso plano inicial é mantê-la do jeito que ela se encontra. Porém,temos fazer uma programação de redução tributária que tenha uma visão geral eque priorize setores que tenham impacto econômico, como bens de capital,investimentos. Precisamos elevar o nível de investimento. Hoje, o crescimento doinvestimento está 8% do PIB e é uma boa margem. Porém, nós queremos que cresçaainda mais. Você tem, então, que baratear o custo do investimento com redução docusto financeiro, que já está sendo feito, e também do custo tributário. Vocêtem que escolher. Não dá para reduzir todos os tributos do país. Neste momentoqueremos reduzir tributos para micro e pequena empresa. É por isso que estamosapoiando o projeto de Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. ABr - A votação do projeto vem sendo adiadano Senado. O senhor espera vê-lo aprovado ainda neste ano?Mantega  - Isso é por causa do período eleitoral. Conversei com opresidente do Senado, Renan Calheiros. Combinamos uma reunião com todos ospartidos. Não haverá dificuldade de aprová-la neste ano. ABr - O seu antecessor, Antonio Palocci, quando cobrado para que adotasse uma política econômica mais agressiva e menosortodoxa, costumava comparar o Brasil a um Titanic, porque precisa de manobraslentas. O senhor acha que a manobra já foi feita? Estamos na rota de umapolítica mais desenvolvimentista? Mantega - Não compararia com o Titanic, porque é umtransatlântico que foi paro o fundo. O governo federal é um transatlântico que,de fato, tem dificuldade para fazer movimentos. Não pode dar cavalo de pau, nãopode fazer movimentos bruscos. Porém, esse transatlântico já foi colocado narota correta. Não estava. No passado, estava meio à deriva. Agora não, estánavegando em águas calmas e em ritmo cada vez maior. No ano que vem, essetransatlântico poderá navegar mais rapidamente, ou seja, crescer mais de cincopor cento. Todas as variáveis hoje estão melhores do que estavam há quatroanos.ABr - Além da reforma tributária, oInstituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sugere que para promover essedesenvolvimento que o senhor pretende seria necessário também implementar asreformas trabalhista e previdenciária. O senhor concorda?   Mantega  - A estrutura sindical brasileira é muito antiga, precisa mesmoser mudada. A reforma trabalhista tem que ser feita, mas não dentro desseespírito liberal e ortodoxo que chegaram a cogitar, tirando todos os direitosdo trabalhador, como não pagar o 13o, acabar com as férias etc. Achoque o que se pode fazer é simplificar e modernizar.ABr - E a reforma previdenciária?Mantega - Neste momento, não vejo a necessidade de uma nova reforma. Como está aumentando o emprego no país, como está aumentando a formalização damão-de-obra, temos mais trabalhadores pagando FGTS (o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), pagando INSS, issosignifica que a arrecadação está crescendo e, por enquanto, não vejo anecessidade de alguma medida mais drástica na área da previdência.