Julio Cruz Neto
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Na segunda parte da entrevista, a embaixadora de Israel, Tzipora Rimon, nega interesse geopolítico na ocupação do território libanês, diz que qualquer país teria reagido como Israel, inclusive o Brasil, acusa o Hizbollah de usar as vítimas civis para fazer publicidade e continua explicando por que acha que a morte de inocentes não é motivo para interromper a guerra. Leia a seguir mais trechos da conversa:Agência Brasil: A vida dos civis é um preço que vale ser pago para Israel realizar seus objetivos militares?Tzipora Rimon: Exatamente. Para neutralizar o Hizbollah e desmantelar toda a infra-estrutura, há problemas para o povo libanês. Mas Israel reconhece os problemas e abriu corredores humanitários. Já houve mais de 100 comboios para resgate da população, 130 vôos de evacuação e mais de 200 navios chegaram ao Líbano sob coordenação de Israel. Temos um centro especial para coordenar todos os movimentos, inclusive tratamos com o Brasil [a reportagem recebeu da embaixada um comunicado informando que em 16 de julho, após o agravamento da situação, as Forças de Defesa de Israel estabeleceram o Centro para Coordenação de Ajuda Humanitária].ABr: Mas tanto a ONU quanto organizações humanitárias dizem que não foi possível negociar com Israel a formação em segurança desses corredores.Rimon: A informação que temos é que houve um grande número de comboios, mas naturalmente não é suficiente. Vivemos num estado de guerra, é muito difícil. (...) Introduzir cessar-fogo sem mudar status quo, sem mudar a situação do Hizbollah e seu grande arsenal de mísseis, não podemos. A idéia é haver um cessar-fogo como parte do processo político. O Hizbollah tem que deixar os armamentos, liberar os soldados seqüestrados e deixar o exército libanês ocupar o sul do Líbano, para a segurança dos próprios libaneses.ABr: Mas muitos libaneses dizem que a segurança deles depende exatamente do Hizbollah.Rimon: Como assim “do Hizbollah”? O Líbano tem governo como o Brasil, tem exército. Por que não pode ativar seu exército? Tem que atuar com força contra os radicais. Porque o Hizbollah não é exército, é milícia. A resolução 1559 [da ONU] falou: “desmantelar todas as milícias”, então o governo do Líbano não implementou. As pessoas que vivem lá [nas regiões que são alvo de Israel] são do interesse do Hizbollah, por dois motivos: para se proteger, porque sabem que Israel não quer atingir civis, e porque quando morrem civis, usam como publicidade, para mostrar para a opinião pública internacional o que Israel fez.ABr: Se a situação vinha sendo discutida no âmbito das Nações Unidas nos últimos anos, não poderia ter sido novamente agora, ao invés de se empreender esta forte ofensiva? Por que Israel resolveu agir militarmente agora?Rimon: Porque há seis anos fazemos uma pressão enorme sobre a comunidade internacional para implementar a resolução. E no dia 12 de julho, sofremos o seqüestro. O Hizbollah entrou em território israelense e começou a lançar mísseis. Pense o que outros países, incluindo o Brasil, fariam. Não podemos ficar sentados até as Nações Unidas entrarem. A propósito, tem lá a Unifil [Força Internacional das Nações Unidas no Líbano], que não parou as atividades do Hizbollah durante seis anos. Então, para a segurança dos cidadãos israelenses, não tivemos outra alternativa.ABr: Numa fronteira de extensão pequena, e com um exército tão forte, como Israel permite o seqüestro de militares dentro do seu território?Rimon: Isso acontece. [A fronteira] não está 100%, hermeticamente fechada. Foi uma surpresa. No ano passado paramos várias tentativas do Hizbollah, mas desta vez houve um incidente.ABr: A proposta de cessar-fogo que a secretária de Estado norte-americana Condoleezza Rice fez quando visitou a região condiciona o fim dos ataques ao estabelecimento de uma zona de segurança de 20 quilômetros dentro do Líbano. Em entrevista à Agência Brasil, o embaixador da Síria no Brasil, Ali Diab, acusou um interesse geopolítico nesta situação. O seqüestro dos soldados teria sido na verdade um pretexto para Israel aumentar sua presença na região?Rimon: Não. Como eu já disse, nós não saímos do Líbano [em 2000] para voltar, não temos interesse. Israel não quer ficar nessa zona ao longo da fronteira, mas precisamos de uma garantia do exército libanês. Não é um pretexto porque não foi um único incidente, houve outras tentativas do Hizbollah no passado. Chegou a hora de resolver o problema, porque a ameaça é enorme. E não foi da parte de Israel. [O que definiu] o momento foi a decisão do Irã. O incidente e o lançamento de mísseis sobre a população israelense é agenda do Irã, não do Líbano. O Hizbollah usa o povo, o governo do Líbano para outros motivos.