ONGs e movimentos nacionais sugerem que matas nativas entrem no comércio de créditos de carbono

24/03/2006 - 15h22

Thaís Brianezi
Enviada especial

Pinhais (PR) – O Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMs) divulgou hoje (24), no quinto dia da 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8), um documento com sugestões de como lidar de maneira prática com a relação entre mudanças climáticas e destruição das florestas.

Uma das sugestões do relatório é que a venda de créditos do seqüestro de carbono (valoração econômica do gás carbônico absorvido pelas árvores) seja válida também para florestas primárias – o que beneficiaria a Amazônia.

A Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (conhecida também apenas como Convenção do Clima) tem como objetivo geral diminuir a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, para retardar o aquecimento global. Um dos instrumentos dela é o Protocolo de Kyoto, que obriga os países desenvolvidos a reduzir em 5% suas emissões de gases entre 2008 e 2012.

Ela estabelece também Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL), que instituem o comércio de créditos de carbono. Na prática, um país que ultrapassar sua cota de emissão deve pagar pelos gases lançados a mais na atmosfera. Ele pode fazer isso financiando projetos de recuperação ou criação de áreas florestais, em qualquer parte do mundo.

"O Protocolo de Kyoto deixou de fora as florestas primárias, não valorizou sua manutenção", contou o coordenador do Grupo de Trabalho sobre Mudanças Climáticas (GT Clima) do FBOMs e da organização não-governamental Vitae Civilis, Rubens Born."Mas o desmatamento já responde por 20% de todas as emissões mundiais [o uso de combustíveis fósseis, principalmente derivados do petróleo, é a causa maior do aquecimento global]. Além disso, manter a floresta em pé protege a biodiversidade, as culturas tradicionais. É um serviço ambiental fundamental, que deve ser recompensado."

"Esse mecanismo é importante, sim. Mas a gente tem que levar em consideração, também, padrões de consumo e modelos de desenvolvimento", ponderou o diretor do Instituto de Pesquisas da Amazônia (Ipam), Paulo Moutinho. "A gente vive na Amazônia brasileira uma esquizofrenia: temos um plano fantástico de combate ao desmatamento, com ótimos resultados. Mas também vemos o incentivo ao agronegócio e a grandes projetos de infra-estrutura, com grande impacto sobre a floresta."

O diretor de Campanhas do Greenpeace Brasil, Marcelo Furtado, afirmou que o relatório do FBOMS responde a um pedido da última Conferência das Partes da Convenção do Clima, que estabeleceu o prazo de 31 de março para que os países se manifestassem sobre como vêem a relação entre a governança sobre preservação das florestas e sobre o equilíbrio climático. "Como o Brasil ainda não apresentou oficialmente um documento, o que deve ser feito na próxima semana, esperamos que o nosso relatório possa contribuir para tornar mais participativa sua elaboração".

O relatório da FBOMS deverá ser entregue ao presidente Lula em Curitiba no próximo domingo, quando está prevista a vinda dele para abrir a reunião interministerial paralela à COP-8. "Vamos entregar também para o secretariado da Convenção do Clima e da CDB", revelou Born.
O FBOMS foi criado em 1990 e engloba aproximadamente 500 organizações e movimentos da sociedade civil. Já a COP é o órgão deliberativo da CDB, que se reúne a cada dois anos. Em Curitiba, há 3.600 representantes de 173 países (embora a CDB tenha 187 países signatários, além da Comunidade Européia).