Conceito de trabalho infantil precisa ser revisto, afirma sociólogo

12/06/2005 - 9h04

Flávia Albuquerque e Mylena Fiori
Repórteres da Agência Brasil

São Paulo - O conceito de trabalho infantil deve ser revisto para que o problema possa ser atacado de forma correta, afirmou o sociólogo José de Souza Martins, professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP). Em debate realizado na capital paulista, Martins disse que é preciso diferenciar exploração de educação para o trabalho – conceito comum em grande número de famílias, principalmente na zona rural.

"Nesses locais, o trabalho é parte do sistema de educação da criança. É um recurso da família para educar e não deixar que se torne um vadio, mas sim responsável", afirmou o professor. tins.

Para ele, existe um cenário de adversidades que empurra a criança e o adolescente para o trabalho. "Existe a barreira do mercado, da pobreza, da situação internacional que favorece a exploração dos imaturos e a incorporação precoce deles em uma situação de trabalho. É um cenário de adversidades particularmente grave nesse momento".

Para ele, a família também tem sua parcela de culpa: "Para muita gente infância é uma forma ótima de ter trabalho barato, de ter trabalho servil em casa ou fora de casa. E as famílias não devem ser isentadas da responsabilidade que elas têm na violação dessa idéia de infância".

O professor apontou também as adversidades culturais: "No Brasil temos uma cultura que não reconhece a existência da infância, e esse é um detalhe importante". Ele destacou que a infância, enquanto "realidade sociológica", passou a existir no país apenas nos últimos 70, 80 anos. "Estamos, ao mesmo tempo, constituindo a infância e tentando criar mecanismos de controle da vitalidade dessa infância para que ela exista efetivamemte".

Martins destacou o papel "detonador" do Estado, que considera fundamental, nesse processo. Ele disse que não acredita em milagres, mas "simpatiza" com todas as formas de intervenção do Estado no combate à exploração de crianças e adolescentes. Segundo ele, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil é um exemplo de intervenção eficiente – o Peti atende 930 mil crianças e adolescentes de 7 a 15 anos em atividades consideradas perigosas, penosas, insalubres e degradantes. O programa oferece bolsa de R$ 40 por criança para a área urbana e de R$ 25 para a zona rural, e proporciona ações socioeducativas fora do horário escolar.

Para o sociólogo, a conscientização para a infância não é, entretanto, apenas função do Estado. As escolas, os educadores, a Igreja e a mídia também têm papel importante. "A mídia tem sido muito omissa em relação à questão. Só quando o problema se transforma em problema criminal, como pornografia, violação sexual e pedofilia, é que a mídia se interessa. A criança sem problemas deixa de ser objeto de interesse".