Brasília, 1/6/2004 (Agência Brasil - ABr) - O Brasil poderá perder financiamento internacional e sua posição de liderança no mundo caso o governo defenda a inclusão de usinas hidrelétricas em projetos de geração de energia renovável. A opinião é das ONGs participantes da Conferência Mundial sobre Energias Renováveis, que começou hoje em Bonn, Alemanha.
De acordo com a assessoria da ministra de Energia Dilma Rousseff, essa é a posição que o governo brasileiro defende na Conferência que termina 6ª feira (4). Dilma Rousseff falará também em nome da América Latina e do Caribe.
Para o coordenador da campanha de energia do Greenpeace, Sérgio Dialetachi, a posição do Brasil dará a entender ao mundo inteiro que o país não está interessado em produzir energias renováveis ou em receber apoio e financiamento internacionais. Ele diz que essa posição é um retrocesso em relação à Rio + 10, Conferência de Johannesburg (África do Sul), realizada em 2002, quando o Brasil defendeu a proposta de elevar até 2010 a participação das fontes de energia renováveis para 10% da matriz energética mundial.
Hoje, 4% dos financiamentos do Banco Mundial (Bird), por exemplo, são destinados à novas fontes renováveis e caso a participação passe a 10%, o investimento poderá ser elevado de US$ 80 milhões para US$ 200 milhões. "O Brasil é o campeão de energia renovável, não precisamos cometer os mesmos erros do plantio de cana de açúcar, mas podemos utilizar os vegetais para retirar energia para combustíveis, a chamada biomassa.
O Brasil também tem um centro de conhecimento em energia eólica em Pernambuco, cujos professores dão aulas na Dinamarca, Holanda e Alemanha, países que mais utilizam a energia do vento no mundo. Apesar disso, o Brasil não tem uma indústria nacional para gerar energia a partir do Sol ou do vento", lamenta o coordenador da campanha de energia do Greenpeace.
Sérgio Dialetachi afirma que os recentes acordos brasileiros fechados com a China no mês passado, para a construção de usinas a carvão e a retomada do programa nuclear brasileiro, vão contra a posição adotada pelo país de liderança de movimentos importantes no passado. Ele diz que na semana anterior a viagem presidencial à China, a ministra Dilma havia prometido não fechar acordo nuclear nem de carvão no governo Lula.
Na avaliação de Dialetachi, o governo precisa fechar negócios com outros países em áreas de interesse para o Brasil, mas que não tragam prejuízos ambientais. "Acho que é uma convicção muito forte da ministra Dilma. Ela está fechada para ouvir os anseios da sociedade, das universidades, dos movimentos sociais e dos empresários que querem construir turbinas eólicas no Nordeste, onde podíamos gerar royalties para as comunidades pobres, ao invés de ouvir apenas os grandes construtores de barragens. É preciso ouvir as propostas que poderão resolver problemas sociais, econômicos e ambientais", diz o coordenador da campanha de energia do Greenpeace.
O consultor da ONG Vitae Civilis, Delcio Rodrigues, afirma que além das grandes hidrelétricas não serem sustentáveis, provocam impactos ambientais e sociais. A proposta das ONGs é que na Conferência de Bonn se construa um acordo internacional para o desenvolvimento apenas de novas energias renováveis, que têm o mínimo possível de impacto ambiental. Estão incluídas a energia solar, eólica, o aproveitamento de resíduos da biomassa e de pequenas centrais hidrelétricas.
"A proposta que queremos que seja defendida, em articulação com outros países, é que os fundos internacionais de financiamento de projetos energéticos passem a considerar a possibilidade de investir pelo menos 20% dos recursos em projetos de novas energias renováveis. O principal motivo de discórdia com o governo brasileiro é que a ministra Dilma defende que não podemos fazer cerceamento ao investimento internacional para o financiamento de hidrelétricas.
Por outro lado, as ONGs gostariam que os bancos internacionais considerassem a possibilidade de só investir, ou pelo menos conceder grande parte dos investimentos, para as energias renováveis", diz Delcio Rodrigues.
Ele sugere que ao invés de o governo continuar a investir em hidrelétircas, dê prioridade a investimentos eólicos no Nordeste e de recuperação de resíduos da biomassa na cultura de açúcar e arroz. O consultor da Vitae Civilis afirma que as ONGs tentarão, na Conferência, fechar um acordo com o governo brasileiro para criar um sistema de incentivo às novas fontes de energia.
Ao todo são 90 países participantes do encontro, que assumirão compromissos comuns e assinarão uma declaração conjunta que sirva, politicamente, para influenciar as decisões do Bird e de outros bancos internacionais. As ONGs esperam ainda que os países proponham a iniciativa de realizar uma conferência sobre energias renováveis dentro da ONU e construir uma Convenção Internacional que sirvam de complemento às medidas do Protocolo de Kyoto e da Convenção Climática assinada durante a ECO-92.