Estados Unidos ameaçam Brasil com ''suspensão de assistência'' caso Lei do Abate seja implementada

28/05/2004 - 20h18

André Deak*
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O porta-voz do governo norte-americano, Richard Boucher, respondeu ontem a pergunta sobre a implementação no Brasil da lei que permite à Força Aérea Brasileira (FAB) abater aviões civis clandestinos em circunstâncias especiais. Na entrevista à imprensa, Boucher anunciou que, por "questões de responsabilidade, o governo dos EUA terá que suspender uma relevante assistência ao Brasil caso tal programa seja implementado sem satisfazer requisitos legais norte-americanos".

Esse projeto de lei, que ficou conhecido como "Lei de Abate", está aprovado pelo Congresso desde 1998, mas ainda não foi assinado pelo presidente. Dias atrás, o ministro da Defesa, José Viegas, anunciou que até o final de junho de 2004 deverá ser editado o decreto que a regulamenta.

Em audiência pública no Congresso, Viegas disse que, antes de a FAB derrubar quaisquer aviões, serão adotados nove procedimentos que permitirão a identificação da aeronave. Somente após o contato visual, o pedido para que o piloto faça um pouso, a identificação da aeronave por meio da numeração externa do registro (pintada na carroceria) e o disparo de tiros de alerta, entre outros procedimentos, é que a nave será abatida. "Só depois é que será dado o tiro de destruição. A aeronave só será derrubada se o piloto quiser", disse Viegas.

De acordo com o deputado federal Átila Lins (PPS-AM), ex-presidente da Comissão da Amazônia, "a lei do abate não foi regulamentada porque os Estados Unidos ameaçaram proibir a comercialização de qualquer material para avião de que o Brasil por acaso venha a necessitar".

O general da Força Aérea dos EUA, Richard B. Myers, que esteve no Brasil semanas atrás, afirmou na ocasião que "nos EUA, a lei determina que é uma atividade criminal para qualquer cidadão norte-americano auxiliar ou participar de qualquer derrubada de uma aeronave civil por outro país, a não ser que isso seja uma determinação presidencial". O presidente norte-americano precisaria determinar que, se uma Nação quer derrubar um avião civil – no caso, envolvido com tráfico de drogas – "deve-se provar que esse tráfico é uma ameaça extraordinária para a segurança nacional do Brasil, e que os aspectos técnicos são adequados para prevenir acidentes com pessoas inocentes", afirmou.

O general referia-se ao caso ocorrido no Peru em 2001, quando o governo desse país derrubou uma aeronave pensando que se tratava de tráfico de drogas, mas eram dois civis norte-americanos, inclusive uma criança. Na Colômbia, que utiliza equipamento norte-americano e onde as aeronaves civis podem ser derrubas, já existe uma determinação presidencial dos EUA aprovando o assunto.

Consultado sobre as declarações do porta-voz norte-americano, o Itamaraty afirmou entender que a "relevante assistência" a ser suspensa ao Brasil refere-se apenas à cooperação militar. A assessoria de comunicação informou que o órgão não dará declarações a esse respeito.

*Com informações da Rádio Nacional da Amazônia

Veja também no arquivo:

Traficantes operam livremente nos céus da Amazônia (31/01/04)

O diálogo da Impunidade (31/01/04)