Deigma Turazi
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Para marcar os 20 anos da campanha pelas eleições diretas, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves da Cunha (PSDB), colocou na Praça Minas, em frente à Assembléia Legislativa, em Belo Horizonte, estátuas em tamanho natural dos personagens que considera os três maiores símbolos do movimento: Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e Teotônio Vilela. As estátuas foram apresentadas à população mineira na terça-feira (20), durante cerimônia com a presenças de várias personalidades que participaram da luta pelas eleições diretas em 1983 e em 1984.
Nessa mesma terça-feira, depois de se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto e antes de embarcar para a capital mineira, Aécio Neves falou sobre a importância da campanha para a redemocratização do Brasil após o golpe militar de 1964. Com apenas 24 anos, ele foi um observador privilegiado daquele momento: além de neto preferido, era o secretário particular do então governador de Minas Gerais, Tancredo Neves.
Formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e hoje com 44 anos, até 2002 Aécio somava 16 anos como deputado federal em quatro mandatos consecutivos, iniciados na Constituinte, em 1986. Em 2001 foi eleito presidente da Câmara dos Deputados, até o ano seguinte. Nesta entrevista, ele destaca a homenagem prestada a Ulysses Guimarães, Teotônio Vilela e Tancredo Neves, no aniversário da Inconfidência Mineira. O objetivo, explica, foi o de resguardar para as atuais e futuras gerações o "grande exemplo" de mobilização popular da campanha pelas eleições diretas. "A partir do momento em que há sintonia de sentimentos, de pensamentos e de determinação, os movimentos democráticos produzem resultados irreversíveis na vida dos povos".
A seguir, alguns trechos do depoimento de Aécio Neves:
Mobilização
"A campanha pelas eleições diretas foi, sem dúvida alguma, o mais importante movimento de mobilização social da última metade do século passado. Foi um instrumento pelo qual a sociedade brasileira construiu os caminhos para a retomada das liberdades democráticas do país. Não vencemos no Congresso Nacional com a proposta Dante de Oliveira, mas criou-se um movimento com tamanha capilaridade na sociedade que envolveu não só os partidos políticos, mas sindicatos, intelectuais, artistas, o povo, enfim.
Na verdade, a ação pós-diretas, a campanha de Tancredo no Colégio Eleitoral, reeditou os comícios pelas diretas já. Na verdade, foi na eleição no Colégio Eleitoral, depois extinto, pois esse era o compromisso de Tancredo. A lembrança desse momento é pedagógica, sobretudo para as futuras gerações, porque mostra que é possível em determinados momentos deixar-se de lado as convicções partidárias, os interesses eleitorais, para construir juntos um grande projeto de nação.
O desafio de nossa geração é esse, é fazer com que a democracia reconquistada naquele movimento popular se transforme efetivamente em instrumento de melhoria da condição de vida das pessoas".
Espectador privilegiado
"Na época eu participava de um grupo que organizava a parte estrutural da campanha. Viajei com Tancredo o país inteiro, mas participei daquela epopéia muito menos, claro, na ação política. Havia uma grande apreensão em relação a radicalismos, a alguma provocação de setores mais duros do regime militar que pudesse levar a um retrocesso institucional. Mas fui ali um espectador privilegiado da maior epopéia popular da história do país.
Figuras como Tancredo, Teotônio, Ulysses, Montoro (Franco, ex-governador de São Paulo), foram os líderes daquele momento. Criaram as condições políticas e estruturais para que a campanha atingisse aquela dimensão. Tancrede teve um papel decisivo ao lado de outros governadores na criação das condições para que a campanha se desse e, a partir daí, ele teve a coragem e a determinação de não ceder ao sentimento de frustração que tomou conta de alguns brasileiros. Sua campanha ao Colégio Eleitoral foi conduzida com o mesmo vigor, o que acabou por levá-lo a vencer a eleição e ser consagrado pela população com o presidente que o Brasil queria".
Transição pacífica
"Minha geração teve o privilégio de assistir a uma transição pacífica, a partir de uma grande mobilização de massas, diferente do panorama dominante na América Latina, onde as transições eram feitas com muito sangue, na ruptura institucional e social, com conseqüências que em alguns países permanecem fortes. Mas no Brasil a mobilização pelas diretas inibiu os setores mais radicais do regime militar em vigor. Minha geração se emocionou com todo o povo brasileiro e viveu um sentimento de cidadania que nos unia acima de convicções partidárias ou ideológicas.
Tancredo dizia que era preciso ir ao Colégio Eleitoral para sepultar definitivamente aquele instrumento. E a campanha pelas diretas foi o estopim, mesmo com a emenda derrotada no Congresso Nacional. Para que mantivéssemos mobilizada a sociedade, iríamos ao Colégio Eleitoral, como dizia Tancredo, 'de nariz tapado'. Vencida a eleição indireta, extirpamos o Colégio Eleitoral da vida política brasileira. E hoje cada cidadão pode escolher livremente o seu destino."