Ex-guerrilheiros do Araguaia buscam parentes desaparecidos

05/03/2004 - 10h15

Palmas (TO), 5/3/2004 (Agência Brasil - ABr) - A luta das famílias por seus parentes desaparecidos durante os conflitos na chamada guerrilha do Araguaia, na década de 70, no regime militar, começou bem antes. A baiana Diva Santana é um exemplo disso. Presidente da ONG Tortura Nunca Mais, na Bahia, ela é irmã da guerrilheira Dinaelza Santa Coqueiro (nome de guerra Mariadina), uma estudante de geografia da Universidade Federal da Bahia, de 21 anos, que "desapareceu" junto com o marido Wandick Coqueiro (João Goiano ou João do B), estudante de economia, de 20 anos.

Diva lembra, agora, de alguns episódios marcantes, comprovando que até há bem pouco tempo a ferida ainda estava aberta, principalmente para os repressores. Destaca que, há 23 anos, já depois da lei da anistia, assinada general João Batista Figueiredo, o mesmo do "prendo e arrebento" quem não aceitasse a abertura democrática, ela participou da primeira incursão por estas bandas no agora Tocantins (antes era Goiás). O ano foi 1981.

Quando chegaram em São Geraldo, pequena cidade na margem do rio Araguaia, com um leito de 2 Km de largura, na divisa com o Estado do Pará, chovia muito e já era noite. Havia apenas uma casa para abrigar a comitiva. Pois lá estavam os soldados, cercando tudo e impedindo o pouso. "Ainda nesta época eles caçavam guerrilheiros e ameaçavam os moradores", lembra.

Agora, depois de tantas tentativas, todas frustradas, Diva espera ter ajudado a buscar o fio da meada, se não para encontrar seus parentes, mas ajudar a outras famílias. "É mais uma esperança, mas somente vou descansar quando forem esclarecidas todas as circunstâncias das mortes, abertos os arquivos e aconteçerem os translados das ossadas para os parentes. Os que morreram acreditavam na perspectiva do movimento crescer, tinham ideais e esperavam um Brasil melhor", relembra.

Sua irmã e seu cunhado moravam em Salvador, levavam um padrão de vida classe média bem estabelecido, e "não teriam deixado tudo isto não fosse por uma causa que consideravam justa", afirma.

Outra participante da atual comitiva é Criméia Almeida. Ela tem dois grandes motivos para ajudar a desvendar os "mistérios" que envolvem a história da guerrilha do Araguaia. Afinal, por um acaso do destino, é uma das oito pessoas que sobreviveram ao conflito. Além disso, é viúva do guerrilheiro André Grabois, dado como desaparecido em outubro de 1973.

Agora, o que Criméia quer "não é só resgatar os restos mortais" dos ex-companheiros, mas a própria história. "A sociedade tem o direito de saber o que já foi feito neste País com o dinheiro público". Ela conta que em toda a incursão na busca por ossadas das vítimas dos assassinatos do regime militar, sente "que poderia ser um deles".

Criméia entrou para a guerrilha, junto com o falecido marido, em 1969. Em agosto de 1972 foi para São Paulo, manter contato com a direção do PcdoB. Pouco mais de dois anos depois, foi "seqüestrada" pela repressão, no dia 29 de dezembro. Apesar de ter sido torturada, esta "prisão" salvou-lhe a vida e a de seu filho, hoje com 31 anos de idade, pois estava grávida na época.