Brasília - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse hoje, ao anunciar os novos ministros de sua equipe, que o momento da reforma é "doloroso, do ponto de vista político e humano", especialmente para quem, como ele, sempre estabeleceu uma relação forte de amizade com as pessoas com que convive. Ressaltou, no entanto, que um chefe de Estado não pode permitir que a relação de amizade seja a prática política para se manter o governo. "O papel de um chefe de Estado é fazer coisas boas e ruins. Uma das coisas ruins é anunciar quem estará fora do governo", afirmou o presidente. Aos novos companheiros, lembrou que não existe política de ministro no governo e sim política de governo para o Brasil.
A íntegra do discurso é a seguinte:
Primeiro, uma brincadeira com um companheiro da imprensa, que hoje publicou uma matéria de que o presidente Lula está envelhecido e que a pressão da sucessão estava tão grande, que eu estava até de boca torta, quando sorria. Espero que ele esteja aqui, olhando, para perceber que não estou de boca torta.
Bem, meus companheiros,
Meu querido companheiro José Alencar,companheiro que não posso substituir – nem ele, nem eu – no exercício do mandato,
Quero dizer para vocês que o momento de uma reforma no governo é sempre um momento doloroso, do ponto de vista político e do ponto de vista humano, sobretudo para mim, que aprendi, ao longo da vida, estabelecer uma relação de amizade muito forte com as pessoas com quem convivo. E é sempre muito difícil, por qualquer que seja o motivo, você dizer a um timoneiro que ele não está mais na direção do seu barco.
De qualquer forma, quando se é eleito presidente da República de um país do tamanho do Brasil, a gente não pode permitir que a relação de amizade seja a sua prática política, apenas para manter um governo. Aqui, todos os deputados e ministros sabem que o papel de um chefe de Estado é fazer coisas boas e, muitas vezes, tem coisas ruins, como dizer a um companheiro que ele não está mais com você no governo.
Essa reforma vem sendo anunciada há algum tempo e aconteceu somente hoje, porque seria hoje que ela tinha que acontecer. Não foi ontem, nem será amanhã. Ela tinha que ser hoje, porque as condições políticas de hoje é que estão permitindo que a gente faça essa reforma política. E eu não queria fazer uma coisa na base do conta-gotas – a cada mês ou a cada 15 dias, anunciar a saída ou a entrada de um ministro. Resolvi fazer toda a reforma de uma só vez, porque, ao terminar este ato, está consolidada a reforma ministerial que eu me propus a fazer, a não ser que aconteça algo superior, que obrigue o governo a tomar uma outra posição.
Quero dizer, sobretudo aos companheiros que vou citar agora, que espero que cada ministro novo tenha consciência de que não existe política de ministro no governo. Existe política de governo para o Brasil. Como fizemos no ano mais difícil que um governo poderia ter tido, que foi o nosso primeiro ano de governo – quando trabalhamos de forma unitária, trabalhamos como se fosse uma verdadeira equipe, no bom sentido, com muito entrosamento e com muita respeitabilidade entre as pessoas – espero que este ano seja o ano em que a gente aperfeiçoe tudo aquilo que não conseguimos fazer no ano passado, porque, neste ano, acho que o Brasil entrou numa outra rota, numa rota de crescimento econômico e de desenvolvimento, e não temos tempo para coisas menores. Temos que continuar pensando que o Brasil precisa ocupar o seu lugar de destaque no mundo e que o povo brasileiro precisa parar de ser tratado como um povo que vive num país subdesenvolvido.
Eu digo o tempo inteiro que o Brasil precisa dar uma chance ao Brasil. Acho que esta chance chegou e o Brasil precisa segurá-la com unhas e dentes.
Portanto, eu quero dizer a vocês da imprensa, que o companheiro Eduardo Campos, companheiro do PSB, está neste momento assumindo o cargo de ministro da Ciência e Tecnologia no lugar do companheiro, também do PSB, Roberto Amaral.
Quero dizer que o companheiro Jaques Wagner está assumindo o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, no lugar do companheiro Tarso Genro.
Quero dizer ao companheiro Jaques Wagner que o representante do Conselho, o secretário do Conselho que eu criei, porque entendia que era preciso criar um canal muito forte com a sociedade brasileira, vai fazer parte da coordenação de governo, a partir de agora.
Quero anunciar a companheira Nilcéa Freire, secretária Especial de Política para Mulheres, que vai substituir a nossa querida companheira Emília Fernandes.
Quero dizer que o companheiro Aldo Rebelo, que prestou um serviço inestimável como líder do governo na Câmara dos Deputados, assume a Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais, dividindo esta tarefa excepcional que o companheiro José Dirceu, sozinho, cumpriu no ano passado. Precisaria de dois Golias, e o José Dirceu conseguiu dar conta da relação com o Congresso e da administração interna do governo. Nós precisamos aperfeiçoar a administração interna, e o companheiro José Dirceu vai cuidar disso. E o Aldo vai cuidar da questão da relação institucional.
Quero dizer que o companheiro Miro Teixeira será o futuro líder do PT, ou melhor, do governo, na Câmara dos Deputados.
Quero dizer a vocês que o companheiro Tarso Genro assumirá o Ministério da Educação, no lugar do companheiro Cristovam, que assumirá o seu cargo de senador.
Aqui um parêntese. O Cristovam está em Portugal. Eu liguei para ele, porque eu ia me encontrar com ele, depois de amanhã, na Índia, e pretendia conversar com o Cristovam na vinda, quando chegássemos ao Brasil. Entretanto, como alguém da imprensa soube, e houve uma divulgação exagerada, eu liguei para o Cristovam, não só pela amizade que eu tenho com ele, mas porque eu não poderia fazer uma viagem para a Índia e ter que, a cada minuto, responder na Índia à pergunta se iria ou não trocar o ministro.
Pedi para o companheiro Cristovam viajar comigo para a Índia e ele disse que preferia voltar para conversar com a equipe dele aqui e fazer a transição, a transmissão de cargo na próxima semana.
Quero dizer que o companheiro Ricardo Berzoini deixou a Previdência Social, depois de um magnífico trabalho que fez na reforma da Previdência, e está assumindo o Ministério do Trabalho e Emprego no lugar do companheiro Jaques Wagner. E, ao mesmo tempo, quero dizer que o companheiro senador da República do PMDB, Amir Lando, está assumindo a Previdência Social, que até então era ocupada pelo Ricardo Berzoini.
Quero dizer que o companheiro Patrus Ananias será o novo ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, assumindo a unificação de dois ministérios, um que era ocupado pela companheira Benedita da Silva e outro que era ocupado pelo companheiro José Graziano. Os dois foram fundidos, e haverá um único ministério, agora coordenado pelo companheiro Patrus Ananias.
Na minha lista, está faltando um nome. Tem uma música: "está faltando nome..." Não está faltando nome, não. Falta o nome do companheiro Eunício, nas Comunicações. Na minha lista, aqui, não tem o companheiro Eunício nas Comunicações. O companheiro Eunício, deputado, líder que ajudou muito o PT na votação das reformas, estará ocupando o lugar que o Miro Teixeira ocupou com tanta galhardia até o dia de hoje.
Agora, eu queria dizer umas palavras aos companheiros e companheiras que estão deixando o governo e dizer muito mais para a imprensa. A gratidão que tenho pelos companheiros que estão deixando o doverno, para alguns, é uma gratidão de uma relação política de muitos e muitos anos, uma relação política desde os primórdios do PT. São companheiros que começaram comigo, como a companheira Benedita da Silva, como o companheiro Graziano e tantos outros. E esses companheiros tiveram um ano muito difícil, porque criamos alguns ministérios novos e tomamos uma decisão de trabalhar com a mesma estrutura que tínhamos antes, sem fazer nenhuma contratação.
Muitas vezes, os companheiros passaram seis meses sem ter sala para trabalhar, embora fossem ministros, porque queríamos fazer um rearranjo na estrutura do Palácio do Planalto. E não pensem que é fácil a gente conseguir uma sala. Na redação, quando vocês da imprensa querem ocupar uma sala um pouco maior e vão pedir para um companheiro, é quase impossível. Você transforma uma simples sala numa questão de política de Estado. Além dos parcos recursos com que os companheiros tiveram que trabalhar.
Quero dizer a esses companheiros que sou um ser humano feliz, por ter convivido nesse primeiro ano de governo com todos eles. Tenho certeza de que continuarei convivendo com eles nas ações políticas, por este Brasil afora. E tenho certeza de que, mais do que ninguém, todos eles compreendem que todo governo – eu não serei o último, nem fui o primeiro – faz mudanças durante o seu mandato. E que nenhum companheiro tenha qualquer possibilidade de entendimento de que a troca de ministros é porque alguém que entra é melhor do que alguém que sai. Embora o Pelé tenha sido o melhor jogador do século, algumas vezes ele foi substituído, e nem por isso o que entrou era melhor do que ele. Tudo se devia às circunstâncias do jogo. E, aqui, se deve às circunstâncias da política e do funcionamento do governo, porque queremos trabalhar de forma mais aprimorada.
Portanto, meus parabéns aos companheiros e às companheiras que estão saindo. Meus agradecimentos. Espero que continuemos juntos nessa batalha.
Aos que entram, espero que vocês tenham a mesma dedicação, a mesma afinidade de equipe que tivemos com os companheiros que estão saindo.
E espero que a gente consiga – esse é o meu desejo, a minha crença e a razão pela qual estou muito otimista – espero que vocês, como eu, trabalhem incansavelmente, 24 horas por dia, para que a gente possa fazer as transformações que tanto o nosso querido Brasil precisa fazer: a economia crescer, gerar os empregos que tantos brasileiras e brasileiros esperam que aconteça neste ano. Os índices já estão mais promissores, e eu continuo acreditando que, a cada mês, esses índices vão melhorar.
Eu queria agradecer aos companheiros do PMDB, ao seu presidente, Michel Temer, ao líder no Senado, Renan Calheiros, ao companheiro Aloizio Mercadante, líder do governo no Senado. Sem essas peças, possivelmente nós não conseguíssemos o entrosamento que estamos agora tornando a política materializada.
Eu, um dia, disse ao companheiro Eunício: 'O reencontro do PT com o PMDB é mais do que uma aliança política. Até porque, como quase todos os militantes históricos do meu partido um dia pertenceram ao velho Partidão, é motivo de orgulho, pois muitos de nós um dia fomos militantes do PMDB. Eu acho que pouquíssima gente não esteve no PMDB em algum momento'.
As circunstâncias políticas fizeram com que cada um fosse para um partido político, e nos encontramos agora, com divergências – muitas vezes, pensamos coisas diferentes sobre assuntos diferentes e não queremos que isso não seja assim – a aliança política se dá no momento em que as pessoas estabelecem pontos comuns de ação e de trabalho, e nós chegamos a essa aliança política, porque compreendeu o PT a necessidade de ter o PMDB como um partido participante da sua base de sustentação e compreendeu o PMDB que, pela sua própria história, não poderia negar ao novo governo a sustentação necessária para que nós pudéssemos, não apenas aprovar as reformas que precisamos aprovar, mas que nós pudéssemos ter tranqüilidade na governabilidade do nosso país.
Esse entrosamento, acontece um ano depois de tomarmos posse, e eu queria fazer justiça, porque já falei do presidente do PMDB e dos dois líderes, mas eu acho que, dentro do PT, o papel do companheiro José Genoíno, presidente do PT, e o trabalho do José Dirceu, como articulador político no Congresso Nacional, foram de uma grandeza capaz de nós mensurarmos.
Porque o que aconteceu este ano, ou melhor no ano passado, não estava previsível nas escritas dos melhores cientistas políticos deste país. Nem que nós pudéssemos concretizar o que estamos concretizando hoje. Nem que nós pudéssemos aprovar as reformas como nós fizemos em apenas 7 meses. Lógico que há gente que não gosta que isso aconteça.
Tinha gente que gostaria que o PT viesse para o governo e continuasse sendo oposição ao próprio PT. Tinha gente que entendia que o PT, chegando ao governo, deveria ter o mesmo discurso que tinha antes de ser governo. Era humanamente impossível, porque a realidade política, quando se ganha um país da dimensão do Brasil, e quando se descobre que a sociedade é mais heterogênea do que um partido político, tem mais segmentos da sociedade representados do que as correntes dentro de cada partido político. Ou nós compreendemos isso e nos articulamos para sair da fase do 'eu acho', para entrar na fase do 'eu faço', e fazemos, ou nós não governamos uma cidade, não governamos um estado e muito mais um país do tamanho do Brasil.
Portanto, meus companheiros, eu digo sempre: Deus foi por demais generoso comigo ao permitir que eu chegasse à Presidência da República. Está certo que fui insistente. Acho que isso Deus levou em conta. E quero dizer aos companheiros ministros, aos parlamentares e aos meus amigos da imprensa, vou repetir o que tenho dito sistematicamente: eu não sou cientista político, mas quero fazer política como nenhum cientista político fez neste país. Quero fazer aquilo que o Brasil precisa que seja feito e que não pode esperar. Quero conversar com as pessoas de bem deste país, para que a gente possa construir conjuntamente o país dos nossos sonhos.
Por isso, quero terminar dizendo para vocês, porque vamos assinar, agora, o ato de posse dos ministros: podem estar certos de que, se nós não falhamos nos primeiros 12 meses, quando a maré estava revolta e o casco do barco não estava tão seguro, este ano será infinitamente melhor, o ano que vem será infinitamente melhor do que este ano, e 2006 será infinitamente melhor do que 2005.
Quero, ao terminar o meu mandato, poder voltar aonde nasci, não em Caetés, mas nas portas das fábricas, para a política e, quem sabe, cumprimentar os meus companheiros com a leveza de um ser humano que cumpriu aquilo que prometeu, que conseguiu cumprir aquilo que foi a razão pela qual eu cheguei à Presidência da República.
Muito obrigado aos ministros e ministras que estão saindo. Meus parabéns aos ministros que estão entrando. E boa sorte para o Brasil e para o povo brasileiro, porque todos nós precisamos, antes de tudo, ter em conta que este país não dará certo, se a gente governá-lo apenas com a racionalidade do nosso cérebro ou com a frieza dos números. Este país, no meu governo, vai respeitar os números, vai respeitar a racionalidade do cérebro, mas, sobretudo, este país vai ser governado com muito coração. Isso eu garanto a vocês.
Muito obrigado e boa sorte.