Rio, 27/6/2003 (Agência Brasil - ABr) - Há algum tempo que a população do município de Monte Alegre, no interior do Pará, vive sobressaltada com a possibilidade de contrair câncer em conseqüência da radiação proveniente do urânio que se encontra no subsolo da cidade da região do Baixo Amazonas.
Segundo a equipe da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) que esteve na cidade, o pânico das pessoas foi gerado por interpretações equivocadas de dados obtidos a partir de diferentes estudos realizados na região. Em 1995, informa a Cnen, a Universidade Federal do Pará (UFPA) fez um levantamento junto a 1.600 casas e instituições públicas da cidade quando foram registradas medidas de radiação na faixa de 300 a 2.000 CPS (contagens por segundo), sendo que o valor da média mundial está entre 100 e 200 CPS. A Cnen esclarece que para a pesquisa foi utilizado um cintilômetro, aparelho que, segundo informa, não é o mais apropriado para avaliar os riscos da radiação por urânio. Além disso, as medidas mais elevadas foram registradas em pontos específicos, não representando, "de forma alguma", a exposição média de toda a região.
Com a divulgação dos dados pela imprensa local com o alerta de que a radiação poderia causar câncer o medo se instalou em Monte Alegre. Mas, em varias visitas à cidade, os técnicos da Cnen esclareceram e tranqüilizaram as pessoas informando que os níveis de radiação natural da cidade são semelhantes aos registrados em várias outras regiões do país e do mundo e não podem ser considerados como causas de um suposto aumento dos casos de câncer.
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Técnico da Cnen coleta amostra de água para análise
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Os últimos estudos realizados entre os dias 9 e 13 deste mês, quando se comparou as medidas da radiatividade natural da cidade com recomendações internacionais do setor nuclear, mostrou que "não há motivos para preocupações", afirmam os técnicos. De acordo com a Cnen, o urânio é uma fonte radioativa natural da crosta terrestre, assim como o tório e o potássio. "O homem sempre conviveu com níveis naturais de radiação decorrentes destes elementos. Daí o termo radioatividade natural".
Segundo a Cnen, há regiões que apresentam maior concentração de urânio, como ocorre, por coincidência, a 20 quilômetros do centro de Monte Alegre, na área abrangendo a comunidade inglesa de Souza. "Casas, ruas, calçadas e outras obras da cidade utilizaram rochas e terra do local e isto bastou para alimentar a idéia de que os habitantes vinham sendo vitimas fatais da radiação".
A Cnen realizou estudos na região a pedido da Câmara de Vereadores de Monte Alegre interessada em esclarecer a real situação e prestar esclarecimentos à população. O pânico instalado entre as famílias, segundo o prefeito Jardel Vasconcelos, sempre gera prejuízo. Muitos produtos da cidade eram boicotados por parte dos moradores de Santarém, maior cidade do Baixo Amazonas. Além disso, ele conta que os moradores de Monte Alegre estavam sendo vítimas de preconceito quando viajavam para outras localidades.
Um exemplo dessa discriminação é o caso da freira Márcia Fernandes, da escola Imaculada Conceição, em Monte Alegre. A congregação chegou a pedir que ela deixasse a cidade com receio de que ela viesse a desenvolver algum tipo de câncer. "Agora sei que não tenho motivos para sair daqui. Fico muito mais tranqüila e vou dormir em paz", disse a religiosa.
Nestes últimos dias de analise na região, os técnicos da Cnen, além de apresentarem suas conclusões, fizeram outras medições e discutiram o assunto em reuniões publicas com mais de 400 pessoas, entre lideranças políticas, religiosas, empresariais, professores, estudantes e demais segmentos da sociedade. A palestra realizada pelos técnicos da Cnen também repercutiu positivamente na imprensa da região.
O coordenador da equipe da Cnen em Monte Alegre, Horst Monken Fernandes, garante que "os valores médios de radiação natural no município são compatíveis com os de outras cidades no Brasil. Não havendo evidências científicas que permitam associá-los a um aumento dos casos de câncer". O relatório final da Comissão, no entanto, lembra que o órgão não pode afirmar que a incidência de câncer na cidade esteja aumentando ao diminuindo, pois não existem estudos na região que possam demonstrar, "de forma cientifica", alguma variação.
Todavia, Lene Holanda Veiga, doutoranda em epidemiologia do câncer e integrante da equipe da Cnen que esteve na região do Baixo Amazonas, publicou estudo comparativo entre a taxa de mortalidade por câncer na região de Monte Alegre e a do estado do Pará, mostrando que a taxa na cidade não é maior que o padrão estadual.