Fernando Henrique prega novo conceito de cidadania

24/06/2002 - 19h53

Rio, 24 (Agência Brasil - ABr) - Os Presidentes Fernando Henrique Cardoso, do Brasil, Thabo Mbeki, da África do Sul, o Primeiro Ministro da Suécia, Goran Persson, e a Governadora do Rio, Benedita da Silva, entre outras autoridades, reuniram-se hoje, na sala plenária da Rio+10 Brasil, no Museu de Arte Moderna (MAM), em audiência pública, com representantes de organismos internacionais e da sociedade civil, para discussão de temas relacionados ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável.

Em seu discurso, Fernando Henrique defendeu a construção de uma cidadania planetária, tendo em vista que, se de um lado a Rio 92 representou um marco na direção do novo ordenamento do sistema internacional ao introduzir a lógica da cooperação entre Estados e das responsabilidades comuns mas diferenciadas, de outro lado a década revelava a existência de pouco a comemorar no sentido da promoção do desenvolvimento sustentável.

O relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente-PNUMA, intitulado GEO III, é preocupante, ressaltou o presidente, revelando aumento da pobreza, perda da biodivesidade, comprometimento dos recursos de água doce. Acrescentou que, em relação ao efeito estufa, a situação é mais grave do que se imaginava, "tornando vulneráveis, em especial, os países pobres e, dentro desses países, as populações mais pobres".

Daí a necessidade de construção da cidadania planetária, frisou o presidente, esclarecendo que o reconhecimento de uma dimensão planetária e, portanto, universal, na cidadania implica em se ultrapassar os limites do Estado nacional e da noção de soberania tal como ela estava ancorada no passado, "em governos limitados nas suas decisões à preocupação com seu local". Mais adiante, disse: "Cada vez mais, temos que nos preocupar com a forma geral e isso não é fácil, principalmente nos meios domésticos onde as noções continuam a ser muito balizadas pelo que foi a nossa experiência na formação de Estado nos séculos passados que ainda não assimilaram a compreensão desse novo momento da humanidade".

Segundo o Presidente, trata-se de uma questão de sensibilidade democrática, que crie as condições para que cidadãos a princípio afastados dos acontecimentos possam participar das decisões que os afetam. Ele manifestou sua expectativa no sentido de que o diálogo que novamente ocorria no Rio de Janeiro venha a resultar em ações a serem realizadas por todos os interessados, em seus respectivos campos de atuação a fim de que, daqui a 10 anos, possam ser celebrados novos avanços, "com redução da pobreza e da desigualdade entre nações e dentro das nações, com um desenvolvimento que respeite a natureza, com a preocupação com as futuras gerações, enfim, como tenho sempre dito, com uma globalização que se torne mais solidária".

Defendeu os princípios que nortearam a Rio 92, entre os quais o da responsabilidade comum, mas diferenciada, e o princípio da precaução, sempre que não distorsivo ao comércio, afirmando o desejo de avançar em temas como energia e governança. "Não permitiremos que a Cúpula de Johannesburgo, que ocorrerá a partir de agosto na África do Sul, se transforme em uma "Rio menos 20", afirmou. Lembrou o Protocolo de Kyoto, que só foi possível chegar a um consenso "porque nós acreditamos e porque houve ação e persistência".

Depois de enumerar importantes avanços alcançados internamente no Brasil na área ambiental, desde a realização da Rio 92, Fernando Henrique externou seu desejo de que os trabalhos que vêm sendo efetuados na Rio +10Brasil "não morram aqui no Rio de Janeiro, como se fosse um "happening", mas que continuem na ação permanente dos representantes de organismos internacionais, dos governos, da sociedade civil nesses próximos 2 meses, de tal maneira que ao chegarmos a Johannesburgo tenhamos algo consensual, algo concreto, na direção de que existe efetivamente uma nova noção de desenvolvimento sustentável que incorpore o combate à pobreza, o acesso aos mercados, as transferências de tecnologias adaptadas às condições que nós desejamos de um mundo que preserve as condições ambientais, a biodiversidade , e nos permita lidar com a questão do efeito estufa".

Segundo Fernando Henrique, tudo isso deve vir "na construção do que nós chamamos aqui de uma nova governança e que efetivamente e que as decisões, quando são tomadas no local atingem outros, quando são tomadas numas pessoas atingem outras, sejam decisões crescentemente baseadas no mecanismo de consulta mais ampla e que efetivamente possa falar com mais propriedade do que meramente como retórica, como sou obrigado a fazer hoje , numa cidadania planetária, onde nós todos nos sintamos responsáveis pelo bom desenvolvimento, pelo desenvolvimento sustentável da humanidade".

Ao encerrar seu discurso, o Presidente recebeu uma máscara anti-gás de manifestantes que protestavam contra a decisão do governo americano de não aderir ao Protocolo de Kyoto, que trata dos gases do efeito estufa. Definiu o protesto como uma manifestação democrática. Agitou a máscara no ar e afirmou que "o nosso país prega a liberdade".