Pesquisa realizada na Cidade de Deus mostra ser possível usar tecnologia para ciências sociais

26/10/2012 - 20h46

Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – Um sistema desenvolvido pelo Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio) promete mudar as pesquisas na área social. Os resultados do programa piloto, feito com moradores da Cidade de Deus, em Jacarepaguá, zona oeste do Rio, foram divulgados hoje (26).

De acordo com Ronaldo Lemos, coordenador do CTS-FGV, a ideia é revolucionar o sistema de pesquisa usando a tecnologia e a internet. “A gente primeiro estudou como era toda a questão da presença da tecnologia na Cidade de Deus. Então viu que as lan houses têm uma presença importante na Cidade de Deus. Hoje há até um declínio das lan houses nas comunidades, por causa do celular. Então, além de usar a lan house como um lugar onde as pessoas podiam ir para responder à pesquisa, a gente usou também celulares com 3G, inclusive com as pessoas participando nas ruas, podendo responder à pesquisa pelo celular e parcerias com instituições locais”.

Todo o trabalho preparatório durou três meses, tempo necessário para desenvolver o que seria perguntado na pesquisa e como seria a estratégia para entrar na comunidade. “A ideia foi integrar a pesquisa aos hábitos online que já existiam na cidade. O primeiro passou foi entender onde a internet e a tecnologia estavam presentes, depois foi feito uma campanha de mobilização e parceria com as entidades. Nós queríamos mostrar que é possível utilizar a tecnologia para ciências sociais, mesmo em comunidades carentes que enfrentam a exclusão digital”.

O projeto foi desenvolvido por meio de uma parceria da FGV com o Banco Mundial e a Fundação Ford. De acordo com Lemos, existe demanda para levar o sistema para o Haiti e para o Marrocos.

“Uma vez que a plataforma está feita, você muda as perguntas. A gente fez agora sobre UPP, mas pode haver depois uma outra questão que se torne importante para a Cidade de Deus, aí você atualiza a plataforma e faz uma nova rodada de pesquisa, então isso dá uma voz permanente para a comunidade”.

O trabalho foi feito com duas equipes, uma interna na FGV e outra na Cidade de Deus. “O próprio desenho da pesquisa levou três meses para ser feito e foi decidido com o pessoal da comunidade. O nome da pesquisa foi decidido na comunidade”, explica o coordenador.

A metodologia utiliza a comparação. São apresentadas duas opções para a pessoa decidir o que acha melhor, criando, ao final do processo, um ranking de preferências da população pesquisada. De acordo com as respostas, a pessoa é direcionada para perguntas específicas sobre o tema de interesse. “Isso evita que uma pessoa que não saiba nada de educação tenha que responder perguntas sobre o tema, por exemplo”.

Um site foi criado exclusivamente para a pesquisa, que foi desenvolvida para ser respondida em até sete minutos. Lemos afirma que também foi incentivado que a própria pessoa respondesse e não o pesquisador em campo.

“Isso é muito novo, porque a internet é usada para um monte de coisa, mas há poucos experimentos, especialmente no Brasil, para fazer pesquisa para valer. Geralmente quando esses usos de tecnologia ocorrem, eles não têm a ver com comunidade carente, têm a ver com pesquisa de consumo, valor de marca, coisas desse tipo. E o que a gente queria era experimentar o uso de tecnologia não pensando em um universo classes A e B, mas em comunidades carentes, pensando em política pública.”

De acordo com a líder de Projeto do CTS-FGV, Joana Varon, um ponto fundamental para o sucesso da pesquisa e adesão da comunidade é a parceria com pessoas do local, que passem credibilidade e legitimidade para a população. Joana explica que o custo do projeto completo foi US$ 35 mil, mas, agora que o sistema está desenvolvido, a aplicação fica bem mais barata.

“Agora já tem o código, que vai ser aberto, e a metodologia a gente vai publicar. Claro que tem que sempre adaptar para as realidades locais, mas essas adaptações você faz também escolhendo os agentes de campo, que é o ponto-chave. E se for replicado teria o custo só de pessoal e de quem for analisar os dados”.

Os resultados completos da pesquisa Melhora Comunidade, na Cidade de Deus, estão disponíveis no site  http://www.insightnet.com.br/clientes/download.html.

Edição: Fábio Massalli