Para cientistas políticos, Brasil tem obstáculos para liderar a integração da América do Sul

28/10/2009 - 17h28

Gilberto Costa
Enviado especial*
Caxambu (MG) - Há uma ideia repetida em gabinetes do governo e entre empresários de que o Brasil deve seguir o seu destinoe, como maior país da América do Sul e maior economiada região, deve cumprir o papel reservado de liderançacontinental. A história deixou para o suposto lídertomar a frente e integrar os países mais próximos.

A ideiacontinuamente afirmada é criticadapelos cientistas políticos brasileiros, especializados nasrelações internacionais.Reunidos em uma mesa de debates em Caxambu (MG), no 33º EncontroAnual da Associação Nacional de Pós-Graduaçãoe Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), esses estudiosos questionam a eventual vocação para liderança,o interesse nacional sobre vizinhos e o conhecimento dosprocessos políticos que ocorrem na região.

ParaAlcides Vaz, da Universidade de Brasília (UnB), “hápoucas condições de se realizar” uma integraçãoconforme idealizado. Se até aqui “houve convergência”foi por pragmatismo político. “A agenda cooperativa éambiciosa, mas com poucas condições de se realizar”,diz  se referindo ao Mercosul, à Comunidade Andina, àUnasul (União das Nações Sul-Americanas) e aoConselho Sul-Americano de Defesa. “As fontes domésticasnão são tão convergentes.”

MariaRegina Soares, do Instituto Universitário de Pesquisasdo Rio de Janeiro (Iuperj), concorda com Vaz e vê espaçopara internacionalização de empresas brasileiras, masavalia que a nossa sociedade é dividida quanto àinserção na América Latina.

A eventual liderança tem que serpensada “em modalidades, como tarefa”, afirma Maria Regina, explicando que opaís pode ou não exercer liderança cooperativa,coercitiva, empresarial, intelectual e dar prioridade às relações com osEstados Unidos e a União Européia.

Acientista política Maria Celina D'Araújo, da PUC-Rio(Pontifícia Universidade Católica), é cética quanto ao Brasil exercer um papel de liderançapor causa de seus problemas sociais. “Que liderança continentalpodemos ter com gente morrendo nas filas dos hospitais?”, pergunta.

Análise semelhante faz o professor Tullo Vigevani, da Unesp,(Universidade Estadual Paulista), que lembra que se o critériopara pensar a liderança for a renda per capita, o Brasil ficaabaixo da Argentina, Chile e Uruguai.

Vigevani nãoacredita que o Brasil possa exercer o papel de play mastere tem mantido um papel vacilante, por exemplo, quanto ao Mercosul oqual às vezes leva para negociar com a União Européiae outras vezes não. Em sua avaliação, “ocenário internacional não facilita a integração”,diz, lembrando a maior presença chinesa na região eas ambiguidades da atuação dos Estados Unidos.

Naavaliação de Vigevani, que estuda os movimentos sociais nocontinente, há desconhecimento sobre os processos políticosnos países da América do Sul. Segundo ele, a própriaciência política debate a chamada democraciaplebiscitária, em funcionamento na Venezuela, Bolívia eEquador “como fosse uma questão nova”. Vigevani lembrou que pensadores clássicos, como Alexis de Tocqueville, jáfaziam esse debate no século 19.