Falências e guerra fiscal cortam 20 mil empregos de sapateiro em Novo Hamburgo

12/06/2009 - 11h23

Jorge Wamburg
Enviado Especial
Novo Hamburgo (RS) - O Sindicato dos Trabalhadores no Calçado de Novo Hamburgo, maisconhecido como Sindicato dos Sapateiros, que já teve 27 milprofissionais cadastrados nos anos 90, hoje não conta com maisde 8 mil filiados. Na avaliação de seus dirigentes, essesnúmeros  retratam a crise que o setor calçadistavem enfrentando nos últimos anos, com a falência demuitas empresas e a transferência de outras para municípiosdo próprio estado, ou mesmo do Rio Grande do Sul, coma consequente extinção dos postos de trabalho.O próprio diretoradministrativo do sindicato, Luciano Fagundes, é um exemplo dessa situação. Ele só não foi demitidode uma fábrica de calçados femininos, conhecida em todoo país, porque tem imunidade sindical: no ano passado, aempresa encerrou a produção de calçados em NovoHamburgo e manteve apenas os setores de modelagem e amostras nomunicípio, o que custou o emprego de 390 trabalhadores,demitidos de uma vez só."Aprodução foi transferida para Bom Princípio (naSerra Gaúcha, a 70 quilômetros de Novo Hamburgo) e, lá,terceirizada. Eles ganharam incentivos, prédio e maquináriodo município", conta Luciano, ressaltando que esse fato écomum, atualmente, na indústria calçadista de sua cidade. Trata-se da guerra fiscal entre municípios gaúchospara atrair empresas como esta à sua jurisdição, explicou o sapateiro.Segundo ele, isso também ocorre entre os estados, o que levou várias empresascalçadistas a mudar suas fábricas outros estados, comoSanta Catarina, Bahia e Ceará.Aos 34anos e há 11 anos no mercado de trabalho – começouaos 12 anos na profissão de sapateiro – Luciano Fagundes dizque, se um prefeito oferece isenção de impostos a umempresário para que mude sua empresa de município, o prefeito domunicípio visado tem que reagir da mesma forma, "pois opatrão só pensa em lucrar e, quanto mais a empresaganhar em cima do trabalhador, para ela, é lucro".Mas nãoé só a guerra fiscal que enfraquece a indústriacalçadista de Novo Hamburgo. Luciano cita a desvalorizaçãodo dólar em relação ao real, que prejudica as exportaçõese, consequentemente, reduz a produção, além daimportação de calçados da Ásia,principalmente da China, como dois agravantes importantes dessequadro recessivo.O maisgrave, segundo ele, é que algumas empresas importam calçadoda China com valor mínimo, "simplesmente trocam aetiquetinha e vendem bem mais caro no Brasil, como se fosse produçãolocal". Esses dois pontos são os que mais afetam osempregos na indústria de calçados, mas há tambémo excesso de impostos para complicar mais as coisas,acrescenta. Para osindicalista, além disso, o setor de calçados é"muito esquecido" pelo governo, que nada lhe ofereceu paraenfrentar a crise, "enquanto reduzia impostos para osautomóveis, siderurgia e linha branca". Outro problemapara o trabalhador desse segmento é a alta rotatividadenos empregos: "A empresa demite o trabalhador e, lá nafrente, o contrata de novo, porque não conseguiu emprego emlugar nenhum, com um salário menor".O pisosalarial da categoria é de R$ 478,40, mas a médiano setor é de R$ 550 a R$ 600. Luciano diz que,nos últimos anos, os trabalhadores só têmconseguido a reposição da inflação nosacordos salariais com os patrões. E têm que brigarmuito, segundo ele, para manter os benefícios sociaisconquistados ao longo dos anos, que os empresários queremretirar, como o auxílio-creche de R$ 75,90 às mulheresque têm filhos de até 4 anos."Nãoestou dizendo que não existe a crise. Ela existe, mas muitasempresas também estão se aproveitando da situação",acusa o sindicalista. Ele não dispõe de um levantamentode quantas empresas fecharam nos últimos anos, mas cita dadosdas demissões formalizadas no sindicato no ano passado detrabalhadores com mais de um ano de casa: foram 4 mil demissões,de janeiro a dezembro de 2008, em Novo Hamburgo.Este ano,até o início deste mês, mais 1.200 trabalhadoresjá foram demitidos. Uma situação que LucianoFagundes conheceu muito bem, antes de se tornar diretor doSindicato dos Sapateiros: as quatro empresas em que trabalhou desde1988 fecharam e todos os empregados perderam seus postos de trabalho.