Mylena Fiori
Enviada Especial
Costa do Sauípe (BA) - Quatro cúpulas reunirão na Costa do Sauípe (BA), nos próximos dias,chefes de Estado latino-americanos e caribenhos: Mercosul, União dasNações Sul-Americanas (Unasul), Grupo do Rio e Cúpula da América Latinae do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento. Em grupos maiores oumenores, os encontros acontecerão em meio a tensas relações entremuitos dos países da região. O Brasil, como anfitrião, vive situações no mínimo delicadas com alguns de seus vizinhos. Coma Argentina, por exemplo, há divergências com relação ao grau deabertura que deve ser aceito pela região na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). Os vizinhos tememque o Brasil, na ânsia de fechar um acordo antes da posse do novogoverno norte-americano, faça concessões demais na área industrial eaté reduza a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, um dos pilares deuma futura União Aduaneira. Brasil e Argentina também divergem quanto àresposta à crise financeira internacional – enquanto o Brasil adota odiscurso de abertura de mercado e estímulo ao comércio, a Argentinaaposta em medidas protecionistas.Mas há diferenças ainda maiores com outros parceiros sul-americanos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva teráque se deparar com colegas dispostos a auditar suas dívidas com oBrasil. Paraguai, Venezuela e Bolívia, que já anunciaram que pretendemseguir o exemplo do Equador - que, após auditoria, decidiu não pagardívida de US$ 462 milhões que tem com o Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico (BNDES) relativa ao financiamento daconstrução da Hidrelétrica San Francisco. Em outubro,quando começaram as ameaças do Equador, envolvendo a perspectiva deexpulsão da construtora Odebrecht, responsável pela obra da usina, ogoverno brasileiro chegou a cancelar missão do Ministério dosTransportes, que iria ao Equador para discutir o apoio do Brasil a obrasde infra-estrutura viária naquele país. No mês seguinte, a diplomaciabrasileira foi surpreendida pela decisão do governo equatoriano deimpetrar juízo arbitral na Corte Internacional de Arbitragem daCâmara de Comércio Internacional (CCI), visando a suspensão dopagamento da dívida no BNDES. A decisão do presidentedo Equador, Rafael Correa, foi anunciada em evento público, sem prévia consulta ounotificação ao governo brasileiro. Na ocasião, o Itamaraty divulgounota criticando o parceiro da Unasul. “O governo brasileiro consideraque a natureza e a forma de adoção das medidas tomadas pelo governoequatoriano não se coadunam com o espírito de diálogo, de amizade e decooperação que caracteriza as relações entre o Brasil e o Equador”,dizia a nota. Nas cúpulas do Sauípe, além do clima estremecidocom Rafael Correa, Lula dificilmente conseguirá evitar falar com opresidente do Paraguai, Fernando Lugo, sobre a possibilidade deauditoria na dívida de US$ 19,6 bilhões que o país tem com o Brasilreferente à construção da usina hidrelétrica binacional de Itaipu. Arevisão do contrato entre os dois países vem sendo reivindicada peloParaguai há anos e foi uma das principais bandeiras de campanha deLugo, eleito este ano. Em setembro passado,durante visita de Lugo ao Brasil, foi criada uma comissão mistabilateral para tratar exclusivamente de Itaipu. O grupo, coordenadopelo Ministério de Minas e Energia, já se reuniu três vezes – a últimadelas na semana passada.Além de questionar a dívida, o Paraguaipede que o Brasil pague preço de mercado pela energia que compra dosócio. Também quer o direito de vender a energia que não utiliza aterceiros países. Pelo tratado de construção da Hidrelétrica deItaipu, cada país tem direito a 50% da energia produzida pela usina,mas a energia não utilizada deve ser vendida ao outro país a um preçofixo. Hoje, Itaipu fornece 90% da energia utilizada pelo Paraguai - ovolume, porém, equivale a apenas 6% dos 50% a que o país tem direito. OParaguai tem que vender os outros 44% ao Brasil a valores abaixo domercado.