Instabilidade renova democracia e valoriza cidadania, diz Tarso Genro

15/04/2006 - 16h02

Aloisio Milani
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O governo federal e o Congresso Nacional enfrentam uma crise política há quase 10 meses. O período foi responsável pela queda de ministros, cassação de deputados, instalação de CPIs, além de um grande debate sobre a transparência dos órgãos públicos e dos partidos políticos. Segundo o relatório final da CPI dos Correios, esse período provocou a investigação, o afastamento ou algum tipo de punição de pelo menos 67 pessoas de diversas estatais (como Correios, IrB, Furnas, e Banco do Brasil), da Câmara dos Deputados, do governo federal e dos partidos políticos.

Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, o ministro da Secretaria das Relações Institucionais, Tarso Genro, avalia como a crise política influenciou o país nesse período. "A democracia, se não tem instabilidade, ela não se renova. Pelo contrário, ela se dissolve. Ela sucumbe. Nós estamos nesse momento de instabilidade. E nesse momento, com as instituições funcionando de maneira positiva, como estão, isso valoriza a democracia e estimula a cidadania", disse.

Ex-ministro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e da Educação, Tarso chegou a assumir a presidência do Partido dos Trabalhadores durante a crise. Um dos principais formuladores do partido, o ministro retornou para assumir o papel de articulação entre o governo e o Congresso. Tarso analisa o atual momento da democracia brasileira e diz que a denúncia da Procuradoria Geral da República demonstra autonomia do poder Executivo. "Nesse momento, com as instituições funcionando como estão, isso valoriza a democracia e estimula a cidadania", afirma. Leia a primeira parte da entrevista:

Agência Brasil: Como o governo federal tem encarado o período da crise política? É possível enxergar melhorias na situação democrática do país?

Tarso Genro: Penso que a trajetória da República não é necessariamente o mesmo percurso da democracia. A democracia, como construção do espaço político de igualdade, de aplicação das leis, e afirmação da cidadania, tem sofrido avanços e recuos desde 1930. Enquanto isso, a República moderna vem se consolidando de maneira mais positiva, porque os poderes, apesar de todos os intervalos, funcionam cada vez melhor e cada vez com mais autonomia.

A Procuradoria Geral da República, por exemplo, acaba de fazer uma denúncia que demonstra sua total autonomia para processar dirigentes políticos, quadros políticos e cidadãos. Com absoluta autonomia em relação ao poder Executivo. O período que nos encontramos agora é um período muito complexo de consolidação da democracia no Brasil.

Mais do que isso, de definição da natureza do processo democrático. Se será uma democracia mais tecnocrática ou subordinante dos cidadãos, esperando a manifestação e o acolhimento do Estado. Ou se será uma democracia de maior intensidade, de grande participação popular e com uma certa instabilidade.

A democracia, se não tem instabilidade, ela não se renova. Pelo contrário, ela se disolve, ela sucumbe. Nós estamos nesse momento de instabilidade. E nesse momento, com as instituições funcionando de maneira positiva, como estão, isso valoriza a democracia e estimula a cidadania. A pior democracia que existe é a democracia da cidadania passiva, alienada, que não inquieta, e que, em última análise só cuida da sua relação privada, que é importante, mas significa apenas uma dimensão do ser humano.

Só para responder a sua pergunta. Por exemplo, está em crise uma democracia em que um quarto da população vota? A maioria da população não acorre a um plebiscito? Ou que um presidente é eleito com 22% dos votos? Acho que está em crise.

A visão que sustentamos é que a democracia brasileira precisa incorporar as massas no trabalho, no mercado, e nas relações políticas. Uma democracia com alta participação com os poderes funcionando com previsão, obedecendo as normas e consolidando a sua autonomia e sua independência.