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10/05/2002 - 7h21

Novas espécies de ovos e de dinossauros descritos no Brasil podem ser exclusivos

- Estudos estão em andamento mas já renderam duas teses de doutorado.

Brasília, 10 (Agência Brasil - ABr) - A bióloga Claudia Maria Magalhães Ribeiro descreveu, pela primeira vez, um ovo de dinossauro encontrado no Brasil, em nível de gênero, e descobriu que o espécime pertence a um gênero diferente dos achados já relatados dentro da família pesquisada e relacionados a descobertas feitas na Argentina, Espanha, França, Índia e Romênia. Além disso, o ovo é também diferente de outros relatados na literatura específica para ovos fossilizados, o que implica, necessariamente, em outra espécie. Em pesquisa distinta, o paleontólogo Rodrigo Santucci descreveu quatro espécies brasileiras, igualmente diferentes das já conhecidas de titanossauros, dinossauros gigantes e herbívoros que viveram não só aqui, mas também na Argentina, França, Espanha, Inglaterra, Romênia, Índia, África, Madagascar e na América do Norte.

O trabalho de Claudia resultou na defesa de sua tese de doutorado, pelo departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), há pouco mais de vinte dias. Mas não acabou aí. Há parte do material, analisado por ela, ainda não classificado. Mesmo o que foi coletado e já identificado, um ovo encontrado em Peirópolis (Uberaba/MG), em 99, já tem nome científico e que será publicado em breve, entretanto, nomear uma nova espécie não é algo simples, como leigos poderiam presumir. É um trabalho que requer anos de estudo detalhado.

Encontrado quase inteiro, o ovo que Claudia analisou estava também muito bem preservado, o que colaborou para a classificação, segundo ela. "Os processos envolvidos na preservação do material foram muito favoráveis. O material deve ter sido recoberto rapidamente", explica. Menos da metade de outro ovo, esse achado em 93, e diversos fragmentos de casca de ovos foram estudados e classificados juntamente com o espécime de Peirópolis, trabalho que ela publicará também este ano.

Rodrigo Santucci está igualmente com seu trabalho por concluir. Depois de identificar três outras espécies de titanossauros, cujo material fóssil foi encontrado também em Peirópolis, ele ainda precisa terminar a descrição dos bichos e batizá-los. "O normal é que o nome evoque alguma particularidade do local onde o animal foi encontrado, ou que tenha a ver com a unidade geológica, ou alguma característica do próprio fóssil, mas não é tão fácil quanto parece", explica. É tarefa, segundo ele, que consumirá praticamente o primeiro semestre deste ano. Ele mostrou as conclusões sobre as três novas espécies ao defender sua tese de mestrado em janeiro último, pelo departamento de Geologia Aplicada da Universidade Estadual Paulista (Unesp). O material estudado refere-se a vértebras de cauda e vértebras dorsais e de fragmentos do íleo, osso da bacia.

Ovos e esqueletos fossilizados, como é o caso do estudo de Claudia e Rodrigo, respectivamente, obrigam ao desenvolvimento de metodologias de estudo diferenciadas. Mas ambas as pesquisas apresentam algo em comum entre si e entre praticamente tudo o que é objeto da paleontologia, pois retratam parte dos animais e dos vestígios fósseis que pertenceram a uma época remota, e que ficaram preservados nas rochas. São estudos que, embora respondam a muitas questões, suscitam tantas outras.

Para Claudia, o fato de ter ocorrido no Brasil o ovo de um saurópode, esse grande grupo ao qual pertenciam os titanossauros, diferentemente de outros ovos já descritos, pode indicar que aqui viveram espécies muito particulares desses animais e por que não dizer endêmicas. "Pela idade do material e por tratar-se de um novo gênero, isto corrobora o fato de que é um ovo diferente de outros já encontrados no mundo", diz. Mas essa é uma pergunta que pede muitos outros estudos, inclusive com a colaboração da geologia.

A hipótese levantada pela pesquisadora serve de indagação e aponta uma reflexão científica. Ela acredita que será factível buscar uma resposta para a ocorrência, no Brasil, de outras espécies novas tanto de ovos, como de animais que viveram no Cretáceo, período geológico que corresponde ao intervalo entre 144 milhões e 65 milhões de anos. É o último da Era Mesozóica, que começou com o Triássico, e esse sucedido pelo Jurássico. Há 90 milhões de anos não havia mais contato entre a África e a América do Sul, por exemplo. "Talvez possamos comprovar um dia que os titanossauros encontrados aqui sejam únicos, já que a idade dos dinossauros desse grupo coincide com a época após a separação. Eles podem ter se desenvolvido, num ambiente distinto, a partir daí", especula.

Apesar de ter descrito três novas espécies de titanossauros, Santucci acredita que pode haver semelhança com outros já conhecidos e que não haveria bem um endemismo, ou seja, ocorrência única em determinado lugar. "Não há como comparar classificação de ovo com classificação de osso", argumenta. Na sua opinião, talvez até haja endemismo, tanto que ele mesmo encontrou espécies novas. O fato é que existem outras ocorrências na mesma região que são muito parecidas com titanossauros argentinos.

É justamente a relação entre a ocorrência de titanossauros, grupo no qual se especializou, e sua distribuição com a separação dos continentes que Santucci escolheu como tema de sua tese de doutorado. Nos estudos anteriores, ele mapeou a ocorrência do grupo em terras brasileiras. Agora ele busca respostas para uma série de indagações já traçadas, tais como: Por que eles ocorrem em determinadas áreas mais abundantemente? Houve contato com as espécies cujos fósseis foram encontrados na Argentina, no Uruguai e até no Chile? De onde vieram os titanossauros encontrados no Brasil, passaram pelo Maranhão quando a África ainda estava unida, nesse ponto, ao Brasil? Os dinossauros encontrados na Argentina se deslocaram do Norte do Brasil?

Mas o principal mistério para ele é em que continente, afinal, surgiram os titanossauros e qual deles está na base da árvore evolutiva. No final do Jurássico, por exemplo, conforme relata Santucci, viveram os titanossauriformes, grupo de grande porte que ocorreu na América do Norte e na Tanzânia, no qual estão incluídos os titanossauros. Os titanossauriformes mais antigos, até o momento, relata, são os Braquiossauros. "Talvez seja o grupo mais próximo", observa. O estudo requer muitas investigações e Santucci está ciente de que terá que lançar mão da geologia para chegar a essas respostas. "Os fósseis de titanossauros geralmente não são bons indicadores de idade geológica, por isso é preciso usar outros recursos como microfósseis. Usarei também as rochas para verificar a evidência da separação continental, ou seja, para dar uma estimativa de quando isso realmente ocorreu", explica. (Lana Cristina)

Estudo de ovos fósseis é feito pela primeira vez no país

- Esse ramo da paleontologia tem apenas uma pesquisadora no Brasil.

Brasília, 10 (Agência Brasil - ABr) - Entre os méritos do estudo de Claudia Maria Magalhães Ribeiro destacam-se a especialização, o ineditismo e a exclusividade de seu trabalho. Ela é a primeira e única pesquisadora, da área da paleontologia, que se dedica ao estudo de ovos fósseis, especificamente de dinossauros e crocodilomorfos. Esses últimos, eram animais com forma semelhante a de crocodilos atuais. O orientador de sua tese de doutorado, defendida no mês passado, o paleontólogo Ismar de Souza Carvalho, classifica o trabalho como a primeira metodologia clara e aplicada para descrição de ovos fósseis.

"O trabalho em si é uma contribuição, porque antes só existiam relatos da ocorrência desse tipo de material. Agora, com o estudo da Claudia, tem-se um resultado científico", avaliou. Numa análise mais ampla, Carvalho considera também importante o fato do ovo descrito ser do final do Cretáceo, período geológico ao final do qual desapareceram os dinossaruos, porque é o registro de vida e não só de morte, como é feito normalmente na paleontologia. "Embora não houvesse restos embrionários, o estudo dela é um documento de vida, e isso prova uma dinâmica relacionada ao comportamento dos animais, porque afinal Claudia provou que os ovos eclodiram. Responde muito também sobre os aspectos da ecologia da época", analisou.

O geólogo Luiz Carlos Borges Ribeiro também comemora o trabalho realizado por Claudia, que é bióloga por formação, mas que desde o mestrado encaminhou sua especialização para o campo da paleontologia. Ele é diretor do Centro de Pesquisas Paleontológicas Llewellyn Ivor Price, que fica em Peirópolis, bairro de Uberaba, cidade do Triângulo Mineiro. O material analisado por Claudia pertence ao acervo do centro de pesquisas, que é também um museu paleontológico. "Fortalece o trabalho do museu, afinal o material foi coletado na região de Uberaba", disse. O centro pertence à Fundação Municipal de Ensino Superior (Fumesu), ligada à Faculdade de Educação de Uberaba. "É um centro avançado de pesquisas da faculdade", explica Ribeiro, que é seu diretor.

Dos seis ovos de dinossauros achados no Brasil, apenas os dois que foram objeto da tese de Claudia têm agora uma descrição. Os outros quatro estão no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a quem coube historicamente a responsabilidade pela catalogação de materiais fósseis no país. "Um material desse sem descrição é perda de informação científica para o Brasil e para o mundo", lamentou Luiz Carlo Ribeiro. Um dos ovos que está no DNPM foi o primeiro coletado no Brasil, pelo paleontólogo que dá o nome ao centro de pesquisa de Peirópolis. A despeito do nome estrangeiro, Price era brasileiro e coletou diversos fósseis no país, principalmente nas décadas de 40, 50 e 60.

Ele encontrou o ovo em 1946, época em que eram raros os achados do material pelo mundo todo. Esse, aliás, foi o primeiro ovo encontrado na América do Sul, fato estabelecido de maniera formal por Claudia Ribeiro em sua tese. Em 1951, Price publicou sua descoberta e relacionou o ovo aos dinossauros saurópodes. Uma de suas principais fontes de consulta foi o trabalho de 1947, do Abade Lapparent, que descrevia ovos achados próximos a fósseis de Hypselosaurus. "A descrição não continha o refinamento das feitas hoje em dia, mas deu uma pista ao Price", conta o geólogo Francisco José Corrêa Martins, da UFRJ e também professor de história da Escola de Cadetes do Exército, em Campinas (SP). Price tinha a informação de que o material relatado por Lapparent era de um saurópode herbívoro, da família titanossauridae. Os ovos estudado pelo francês, encontrados na região Sul da França, tinham até 30 centímetros.

A conclusão de Price, que tinha em suas mãos um ovo de 15 a 18 centímetros, foi a de que o material lembrava muito aqueles relacionados ao Hypselosaurus, mas que, pelo tamanho de fato não o era. Além disso, não havia material fóssil dessa espécie no Brasil. E, como na região de Peirópolis ele próprio havia encontrado fósseis de titanossauros, estabeleceu então a real ligação entre os dados. "Mais de duas mil peças foram coletadas na época em que as escavações eram chefiadas por ele", relata Martins. "Price foi um pesquisador extraordinário, um paleontólogo de "mão cheia", que teve a perspicácia de dizer que o ovo parecia com o daquela espécie francesa já descrita, mas que não iria classificá-lo como, relacionando-o ao grupo dos saurópodes e, possivelmente, da família dos titanossauros. Ele fez isso imaginando que futuras descobertas ou descrições apoiariam suas assertivas. Passado mais de meio século, comprovou-se que ele estava certo", completa.

Price é mestre para a maioria dos paleontólogos brasileiros, tanto que Claudia dedicou sua tese de doutorado à sua memória. Ela ainda está com o material analisado, mas, em breve, deve devolvê-lo ao museu de Peirópolis. O bairro vive da cultura dos dinossauros. Diversos moradores trabalham na coleta de material fóssil. O próprio Centro de Pesquisas nasceu de uma espécie de levante popular contra pedreiras existentes no local e que incomodavam a vizinhança. Não bastasse isso, destruíam o sítio fossilífero. A prefeitura embargou a atividade extrativa e, hoje, os ex-empregados vivem da coleta de ossadas e ovos fósseis.

O ovo descrito por Claudia foi encontrado em 99 e está quase inteiro, medindo entre 15 a 18 centímetros. O ovo não tinha restos embrionários, mas ela sabe que eclodiu, em razão das estruturas internas da casca, detalhe que representa informação preciosa para outros estudos paleontológicos. Os grandes herbívoros que eram os saurópodes titanossauros mediam até 15 metros da cabeça à cauda, tinham 5 metros de altura e pesavam cerca de 15 toneladas. Eles viveram entre 160 milhões e 65 milhões de anos atrás, tendo sido encontrados fósseis desses animais na Europa, na Ásia, na América do Norte, na África (especificamente em Madagascar) e na América do Sul.

A família a qual pertence o ovo descrito pela bióloga, por exemplo, a Megaloolithidae, foi estabelecida a partir de ovos do final do Cretáceo Superior (entre 70 e 65 milhões de anos), encontrados em camadas sedimentares da Bacia de Aix-en-Provence, na França. Depois de determinar a família, baseada na descrição científica de outros trabalhos, Claúdia buscou o relato dos gêneros pertencentes a ele. "São três gêneros descritos para a Megaloolithidae, dentre o material do mundo todo, mas o ovo que eu estudei não se encaixa na descrição de nenhum deles", afirma.

O segundo ovo que estudou em sua tese também ganhou descrição, mas não é possível dizer se é do mesmo gênero. O material encontrado em Ponte Alta, a leste de Uberaba (MG), em 1993, tem menos da metade das cascas preservadas, o que dificultou o estudo. "Ele tem características morfológicas semelhantes ao de 99, mas ainda não sei dizer se se trata de uma nova espécie", comenta. Após estudar a formação da casca de todo material e os aspectos relacionados à preservação (estudos tafonômicos), Claudia os relacionou aos dinossauros saurópodes e, provavelmente, de titanossauros já que esses animais ocorreram em abundância na região de Uberaba, fato comprovado pela existência de grande quantidade de fósseis relacionados a esse grupo, ali. (Lana Cristina)

Patagônia argentina foi área de postura de dinossauros no período Cretáceo

- Descoberta por acaso a região trouxe muitas informações sobre a formação dos continentes.

Brasília, 10 (Agência Brasil - ABr) - Os achados de ovos na América do Sul estavam restritos a ocorrências pontuais, quando em 1998, um grupo de geólogos argentinos, em trabalho de campo, na província de Neuquén, encontrou uma extensa área com ninhos de dinossauros. Segundo a bióloga Claudia Ribeiro, até 1980, as ocorrências de ovos com restos embrionários eram praticamente inexistentes. Há referências de material desse tipo nos Estados Unidos, na Índia e na Mongólia.

Tudo muda com o achado dos pesquisadores argentinos. Depois que uma roda de um dos veículos utilizados no trabalho de pesquisa geológica afundou, em uma planície árida e seca, eles se depararam com algo realmente inesperado. O local, uma área de 3 Km², estava cheio de ovos e cascas de ovos, que depois se verificou serem de dinossauros e que representaria uma área de postura. Os ovos estavam próximos a um vulcão extinto em Auca Mahuida, na parte leste da pré-cordilheira andina, no noroeste da Patagônia argentina.

"A quantidade de ovos, cascas e embriões encontrados mostra que houve a ocorrência de um fenômeno natural repentino", conta o geólogo Francisco José Corrêa Martins. "Podem ter acontecido as duas coisas: a área de nidificação foi recoberta pela inundação causada por antigos rios que por ali passavam ou talvez aquele vulcão estivesse ativo na época e, ao entrar em erupção, poderia ter derretido a neve perto de seu cume que, as descer as encostas, transformou-se em lama, sepultando a planície", adiciona.

Como os ritos de acasalamento, postura e eclosão são influenciados pelo clima, ou seja, pelas estações, o achado argentino pode trazer muitas respostas sobre a ecologia do período Cretáceo e também sobre o comportamento desses animais. Martins vislumbra mais que isso. Para ele, junto com achados paleontológicos da América do Sul, como os do Uruguai, Chile e Brasil, entre outros, o material encontrado em Auca Mahuida pode ajudar na compreensão de como os dinossauros evoluíram após a separação dos continentes e, mais amplamente, sobre como ocorreu a própria separação dos continentes.

Há 207 milhões de anos atrás, a Terra era uma gigantesca massa uniforme, que agregava todos os continentes conhecidos hoje, chamada Pangéia. Nessa época, a Pangéia começou a se fragmentar, dando origem a duas superfícies terrestres, a Laurásia, situada mais ao hemisfério Norte e o Gondwana, localizada mais ao hemisfério Sul. A primeira era formada pelo que hoje é a Europa, a América do Norte e a Ásia e a segunda era formada pela Índia, Austrália, África, América do Sul e Antártica. Entre 150 milhões e 144 milhões de anos atrás, Laurásia e Gondwana não eram mais ligadas.

A separação continental continuou ocorrendo. A Índia, por exemplo, conforme relato de Martins, era então um sub-continente a deriva, migrando na altura da ilha de Madagascar, por volta de 65 milhões de anos atrás. "Era como se fosse uma grande jangada de pedra, como se fosse um continente isolado no qual, certamente, os animais se reproduziam", compara. Essa relação entre separação continental e reprodução de espécies, feita por ele, serve para uma reflexão pessoal e pertinente. No momento da primeira divisão da Pangéia, não havia os dinossauros e sim répteis primitivos que deram origem a esses gigantescos animais. "Embora eles possam ter tido uma origem comum, eles foram evoluindo, assim, distintamente, pelos continentes", especula.

O grande carnívoro Tiranossauros Rex, por exemplo, que é encontrado só na América do Norte, não está mais sozinho na escala evolutiva. Há outros terópodes carnívoros, que também são encontrados inclusive no Brasil, como os carnossauros. Para explicar a tese de que bichos semelhantes encontrados em continentes, unidos em outra era geológica, podem ter o mesmo ancestral, Martins enumera outros exemplos. Não há registro, por exemplo, do Iguanodon, um ornitópode herbívoro, na Índia ou no Brasil, que antes da separação total pertenciam ao Gondwana. O Iguanodon só foi encontrado até hoje na América do Norte e na Europa, continentes que pertenciam à Laurásia.

O mesossauro, um espécime réptil primitivo de hábitos terrestre, mas que vivia sempre próximo a corpos d'água porque se alimentava de peixes no final da era Paleozóica (que durou até 289 milhões de anos), por exemplo, é encontrado no Brasil, especialmente em áreas dos estados de São Paulo e Paraná. Fósseis do bicho também foram achados na África. "Era um animal que tinha pouca amplitude de deslocamento, como os teiús dos dias de hoje e, no entanto, foi encontrado em regiões do Brasil e África, o que me leva a crer que essas partes da América do Sul e da África, onde se encontram os fósseis de mesossauros, já estiveram unidas um dia", observa. Até no reino vegetal, há exemplo enumerado pelo geólogo. Uma planta da era Paleozóica, do período Carbonífero, a glossopteris, só existe em trechos de continentes que pertenceram à Gondwana.

Na lista de semelhanças, há ainda dois dinossauros descritos e achados no Brasil. O Aeolosaurus (pronuncia-se elossauros) e o Antarctosauros brasiliensis, por exemplo, foram identificados com base em material encontrado na Argentina. Para Martins, o Gondwanatitan faustoi, identificado em São Paulo, é uma sinonímia (mesma espécie com nome diferente) do Aeolosaurus, identificado por pesquisadores da Unesp, em Peirópolis (Uberaba, MG). "Em se tratando de áreas intracontinentais, é possível ter ocorrido um intercâmbio de fauna entre o que hoje são os dois países. Talvez as regiões que constituem as atuais províncias de Neuquén e Rio Negro, do lado argentino, e as cercanias de Uberaba, pelo lado brasileiro, por exemplo, tivessem na época desses animais paleobiotas independentes, com barreiras entre elas, como um grande rio ou lago que, podendo ser sazonais, poderiam permitir assim a troca", explica.

Todas essas análises levam a uma conclusão anteriormente citada. São muitas perguntas sem respostas. Mas o fato é que, concordando com outros tantos especialistas da área, Martins também pensa que há muito estudo geológico por fazer, como o estabelecimento das colunas estratigráficas, datação de rochas, identificação das biotas que existiam na época etc. Além disso, há muito material fóssil para estudo paleontológico, sem descrição, no Mato Grosso, onde as coletas são incipientes, e mesmo em São Paulo e Minas Gerais, locais onde há mais estudos científicos.

O estudo, concordam geólogos e paleontólogos, é fundamental não só para registrar o passado, mas porque traz a reboque informações úteis não só no presente, mas sobretudo no futuro, inclusive de cunho econômico. Ao estudar as rochas, ainda que em função dos fósseis ali existentes, os especialistas podem, por exemplo, determinar a ocorrência de minerais energéticos, de jazidas de materiais para construção, ou se a região é adequada do ponto de vista geológico para uso habitacional ou agrícola. Enfim, abastecendo a sociedade de informações que podem ajudá-la nas decisões que precisa tomar. (Lana Cristina)

Leia também:

http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_1.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_2.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_3.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_4.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_5.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_190101_6.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_160201_1.htm
http://www.radiobras.gov.br/abrn/c&t/2001/materia_230201_1.htm

Detritos espaciais não representam perigo eminente à humanidade

- São mais de 100 mil objetos de tamanhos diversos que nagevam à deriva no espaço e que entram na atmosfera terrestre quase diariamente.

Brasília, 10 (Agência Brasil - ABr) - Cacula-se que gravitam hoje em torno da Terra cerca de 100 mil objetos considerados detritos espaciais. São parafusos, antenas, panéis e satélites desativados, estágios de foguetes, restos de combustíveis sólidos e até ferramentas perdidas por astronautas durante operações de reparos. A possibilidade de qualquer um desses objetos entrar na atmosfera terrestre e causar um acidente é remota diz o cientista Marcelo Lopes de Oliveira Souza, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de São José dos Campos (SP).

Mesmo sendo pequena essa possibilidade, como a de que esses objetos venham a colidir com naves tripuladas ou mesmo outros satélites em atividade causando sérios prejuízos, a maioria desses detritos são mapeados e monitorados por meios de radares. De qualquer forma, uma das explicações dadas por Souza, PhD em Astronaútica pelo Massachussetts Institute os Tecnology (MIT), dos Estados Unidos, para que não se faça uma "limpeza" no espaço é o fato de que muitos dos satélites em órbita são militares "e não existe interesse em se revelar sua verdadeira posição e muito menos sua finalidade"

Além do monitoramento eletrônico a Terra tem na sua atmosfera um escudo natural. Os objetos de pequena dimensão são destruídos pelo atrito quando entram na atmosfera e os de grandes proporções, como estágios de foguetes ou laboratórios espaciais como a nave russa Mir, desativada este ano, tem sua reentrada na atmosfera de certa forma controlada e direcionada para regiões desabitadas e preferencialmente sobre os oceanos. Portanto, Souza garante que as previsões feitas por alguns cientistas no início dos anos 90 de que por volta do ano 2010 serão muito grande os riscos de acidentes provocados por detritos espacais "são calculos mais especulativos do que concretos".

A região onde se concentra a maior quantidade de detritos é a de até 1500 Km de altura, também chamada de faixa de interesse comercial, isso porque um satélite orbitando a uma altura menor que essa sofre maior atrito e exige correções de curso constantes para que não caiam e para que um satélite seja colocado numa órbita superior os gastos são bem maiores.

No mês passado a França propôs ao Subcomitê Jurídico da ONU para Questões Espaciais, reunido na Rússia, a obrigatoriedade de que os países lançadores de satélite estabeleçam medidas preventivas à produção de detritos espacais. Alguns países, entre eles os Estados Unidos, se posicionaram contra a propostas alegando que tal medida oneraria muito o caixa das empresas envolvidas nas atividades espacais e também teria reflexo nos programas espaciais dos países em desenvolvimento, como o Brasil por exemplo. Para Souza, além dessas questões existem outros fatores e interesses que os países não revelam e que impedem o estabelecimento dessas medidas "profiláticas".

Mesmo assim, o cientista que esteve ontem em Brasília para abrir o Ciclo de Palestras Quintas Especiais, promovido pela Agência Espacial Brasileira (AEB) acredita que os países quem têm maior atividade espacial encontrarão meios de reduzir a produção de detritos espaciais pois uma parte da tecnologia em desenvolvimento por eles se movimenta também nessa direção. (Ubirajara Jr)

Unifesp detecta "superbactéria" com defesas inéditas contra antibióticos

- Mecanismo de proteção foi desenvolvido por bactérias apontadas como a segunda causa mais freqüente de infecção hospitalar.

Brasília, 10 (Agência Brasil – ABr) - Algumas das bactérias que causam infecção hospitalar, como a Enterococcus bacterium, a Staphylococcus aureus, Staphylococcus saprophyticus, Streptococcus pyogenes, entre outras, dão sinais de resistência até mesmo aos mais novos antibióticos. É o caso da Pseudomonas aeruginosa, responsável principalmente pela pneumonia hospitalar. De acordo com o Laboratório Especial de Microbiologia Clínica (LEMC) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o uso excessivo de antimicrobianos por causa de mutações e de uma seleção natural fazem com que essas bactérias se tornem capazes de produzir potentes betalactamases, enzimas que destroem os efeitos dos antibióticos, sobretudo os mais fortes.

Visando a detectar mecanismos de proteção contra antibióticos, a Unifesp tem um programa de vigilância onde são coletadas continuamente bactérias causadoras de várias infecções, seguindo um critério que pode variar de ano para ano. Esse projeto foi iniciado em 1997 por meio de um convênio com os Estados Unidos e a Inglaterra, que financiam os trabalhos juntamente com a indústria farmacêutica americana Bristol Myers Squibb; ficando a Unifesp responsável pelas pesquisas. Também são feito acordos de intercâmbios para pesquisadores e estudantes brasileiros monitorarem os estudos nesses países. Segundo o diretor do LEMC Hélio Sader, esse acordo serve também para implementar no Brasil a metodologia vinda da Inglaterra.

Atualmente, o laboratório prioriza as Pseudomonas, que são pesquisadas desde o final do ano passado. Os esperimentos que buscam as causas desse mecanismo de resistência englobam estudos moleculares e caracterização genética. "A princípio identificamos o gene, seqüenciamos, e conferimos se ele havia sido descrito. Hoje ele está em fase de publicação em revista científica e agora o nosso trabalho é avaliar o grau de disseminação dessas bactérias para procurar outros mecanismos", explica Sader.

O maior problema com relação a esse micróbio é o fato de a sua seqüência genética ser especialmente complicada. "A seqüência leva à produção de uma enzima que destrói o antibiótico. O que é inédito para nós não é o sistema, mas sim a enzima, que é muito potente e destrói remédios cada vez mais fortes", conta Sader. O grande receio dos especialistas é a possibilidade de que outras espécies já estejam desenvolvendo o mesmo mecanismo de proteção. A fração de DNA observada pode ser passada para outras variantes tornando-as quase invencíveis também.

Segundo Sader, "antibióticos cada vez mais potentes precisam ser empregados e isso confere maior resistência. Aquelas bactérias que, aleatoriamente, aparecem com um gene que as protege dos antibióticos mais utilizados conseguem proliferar". Isso ocorre porque as bactérias incorporam ao código genético informações que as protegem contra o ataca de determinadas drogas, repassando geneticamente esse aprendizado aos seus descendentes. Esse é um problema que já atinge todo o Brasil. Pesquisas da Agência Nacional de Vigilância Sanitárias (Anvisa) informa que em 1994 o grau de infecção hospitalar de toda a rede pública e privada do país chegava ao índice de 13,08%. A agência informa que a taxa mais recentes está em levantamento.

Diante de lastimável situação, o controle de infecções e a prevenção são fundamentais na mente dos pacientes e dos profissionais de saúde. "Ao contrário do que as pessoas pensam, a porta de entrada desses micróbios nos hospitais são os próprios doentes. As bactérias colonizam as pessoas e vão se tornando mais resistente à medida que se utiliza antibióticos", afirma Sader. Para evitar incidentes, os hospitais têm por norma estabelecer barreiras sanitárias como o uso de luvas, aventais, higienização, e principalmente o controle do uso daquelas drogas.

O que realmente ocorre, é que os estudos e os medicamentos mais usados no país foram desenvolvidos para um grupo de micróbios comuns nos Estados Unidos e na Europa, não tanto na América Latina. "O desenvolvimento de antibióticos é muito complexo e o Brasil não conseguiria executá-los. Cada projeto leva cerca de sete a dez anos e consome de 250 a 500 milhões de dólares", completa Sader. O que se pode fazer, destaca o diretor, é difundir mais as pesquisas, criando em diversas regiões do país, laboratórios para avaliar o problema, divulgando mais informações.

Sequenciamento

A Pseudomonas aeruginosa é um microrganismo que tem a capacidade marcante de se adaptar a diferentes ambientes e sobreviver mesmo quando seus nutrientes estão presentes em quantidades limitadas no ambiente. Segundo o Programa de Vigilância de Resistência a Antimicrobianos na América Latina (Sentry), no Brasil a bactéria é o terceiro microrganismo mais isolado de infecções hospitalares, sendo responsável por 20% das bactérias isoladas. Está associada com infecções de alta morbidade e mortalidade, incluindo infecções pulmonares crônicas e fatais entre aqueles com fibrose cística ou com o sistema imune comprometido.

Também é perigosa aos pacientes com queimaduras, câncer e com pulmões artificiais ou que necessitem de catéteres. Em pulmões de pacientes com fibrose cística, a bactéria desenvolve uma camada externa protetora que funciona como um escudo contra os antibióticos e contra as defesas naturais do corpo.

Como fatores de virulência, a Pseudomonas aeruginosa produz toxinas e enzimas, que contribuem para a invasão bacteriana e envolvem três estágios: fixação e colonização, invasão local, e doença sistêmica disseminada. Duas proteases tem sido associadas com virulência no estágio invasivo: elastase e protease alcalina. Produz ainda duas proteínas que são enzimas extracelulares, a exotoxina S, que atua enfraquecendo a função das células fagocíticas na corrente sanguínea, e a exotoxina A, produto mais tóxico produzido por essa bactéria. (Cecília Resende)