Carandiru: policial diz que tropa revidou a “estampido de arma de fogo”

19/04/2013 - 20h20

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – Depois de intervalo para o almoço, o julgamento do Massacre do Carandiru foi retomado por volta das 16h20 com o interrogatório de mais um dos réus, o major da reserva Aércio Dornelas Santos, que era tenente em 1992, quando o massacre ocorreu. Dornelas Santos é um dos 26 policiais que são réus no julgamento, todos acusados pela morte de 15 detentos que ocupavam o segundo pavimento (ou primeiro andar) do Pavilhão 9 do Carandiru.

Todos os policiais alegam inocência. Dornelas Santos, que participou da invasão policial ao Carandiru, insistiu na tese adotada pela defesa: a de que houve confronto entre policiais e presos e que os policiais reagiram atirando. Ele disse ter visto detentos armados e policiais feridos. O Ministério Público contesta e alega que os presos estavam desarmados e rendidos quando os policiais invadiram o local, atirando.

Em seu depoimento, que durou pouco mais de duas horas, Dornelas Santos contou que, na tarde do dia 2 de outubro de 1992, recebeu uma ordem para ir ao Carandiru, onde estava ocorrendo uma rebelião de presos. “A Rota [tropa de elite da Polícia Militar] entra em todas as operações de choque. Mas é a última a ser empregada. A Rota só é usada em caso extremo e esse foi o caso”, disse. Chegando lá, no entanto, a ordem de entrada no Carandiru foi invertida. Por decisão do coronel Ubiratan Guimarães, então Comandante da Polícia Militar, sua tropa, formada por policiais da Rota e que seria normalmente a última a ser empregada, foi a primeira a entrar no local.

Logo que entraram no térreo, contou, os policiais não encontraram resistência dos presos que ali se encontravam - e nem houve agressões dos policiais aos detentos. Mas o cenário dentro do pavilhão foi diferente. “Já na entrada da escada, vi um corpo”, descreveu Dornelas. “No final da escada, mais dois corpos”, acrescentou, mencionando confronto anterior entre os próprios presos.

Quando os policiais terminaram de subir as escadas e chegaram ao segundo pavimento, o cenário que encontraram foi de “penumbra e baixa luminosidade, com a luminosidade artificial prejudicada”, relatou. “Lá, nos deparamos com muitos presos. Houve o estampido de arma de fogo e o revide imediato, até a tomada da área”, disse.

O policial disse que portava um revólver na ocasião e que chegou a efetuar “três ou quatro disparos”, mas sem conseguir determinar se os tiros atingiram alguém. Ele também contou não saber quantos detentos foram atingidos e nem precisar quantos policiais ficaram feridos durante a operação inicial no presídio, feita por sua tropa, que não demorou mais do que 25 minutos (desde a entrada no Carandiru até a saída do local, segundo relato). “Na minha tropa, deviam ter uns quatro policiais feridos”, disse, ressaltando que entre eles, alguns foram feridos com armas de fogo.

Durante o depoimento, Dornelas Santos disse que não foram feitos disparos em direção ao interior das celas. “Os embates foram no corredor”, relatou. Segundo ele, naquela ocasião, os policiais não tinham outra alternativa além do uso de armas de fogo. "Não havia outra alternativa senão o uso de armas de fogo pelos policiais. Era um ambiente extremamente hostil", disse.

"Nossa missão era entrar e tornar aquele ambiente seguro. Cumprimos nosso dever, saímos e não entramos mais depois disso”, contou, lembrando que após a ação da Rota, outras tropas entraram no local. Ao final do depoimento, o policial se emocionou.

Dornelas Santos é o segundo policial a ser ouvido hoje (19). Antes, foi ouvido o tenente-coronel na reserva, Ronaldo Ribeiro dos Santos, que era capitão quando o massacre ocorreu. Em seu depoimento, Ronaldo Santos também disse que a ordem para invadir o Carandiru foi dada pelo então comandante da Polícia Militar à época, coronel Ubiratan Guimarães. Segundo ele, quando os policiais chegaram ao Carandiru, ouviram “muito barulho e estampidos, que pareciam ser disparos de armas de fogo", indicando que os detentos estavam armados na ocasião. Santos também disse que o uso de armas de fogo pela polícia "era a única alternativa" na ocasião. "Dentro daquelas condições, a operação foi organizada e necessária", disse, que informou portar um revólver e uma metralhadora no episódio, esta última só utilizada em caso de necessidade, o que não ocorreu no Carandiru.

Mais dois policiais ainda devem ser ouvidos hoje (19). A previsão é que o julgamento continue amanhã (20) com a fase de debates entre promotores e advogados de defesa e a decisão dos jurados.

Edição: Carolina Pimentel

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