Armazenar sangue de cordão umbilical é prática cada vez mais comum no país

09/03/2013 - 17h55

Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – Apesar do nome longo e complicado, o armazenamento de sangue de cordão umbilical para uso autólogo é prática cada vez mais popular no país. O preço alto, que pode variar de R$ 2 mil a R$ 7 mil, além da manutenção anual que é, em média, R$ 500, não desestimula pais preocupados com o futuro bem-estar dos filhos.

Embora o número de bancos privados, atualmente 17, tenha se mantido o mesmo desde 2010, dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que a quantidade de cordões armazenados vem crescendo substancialmente desde 2003. Entre 2009 e 2010, o número de cordões passou de 8.866 para 11.456.

Embora dados mais recentes ainda não tenham sido divulgados, o gerente de Tecidos, Células e Órgãos da Anvisa, Daniel Roberto Coradi de Freitas, informou que a procura pelo serviço continua aquecida. “O número de bolsas [bolsas] cresce todo o ano, embora o número de bancos não tenha crescido, a atividade comercial está se expandindo, o que pode significar que esses bancos estão aumentando seu lastro de captação”, explicou Coradi. 

A diretora de Produção do banco privado Cryopraxis, Janaína Machado, disse que a empresa, a maior do país, está próxima da meta de coleta de cerca de 400 amostras por mês. “Nossa média de coleta é atualmente 300 a 350 amostras por mês”, explicou. Criada em 2001, a Cryopraxis, que é o maior banco privado de sangue de medula óssea do país, tem armazenadas 30 mil unidades desse tipo de sangue. Janaína explicou que do total armazenado, quatro unidades foram utilizadas para tratamento de clientes. “Três foram para leucemia e um para pesquisa clínica de hipóxia neonatal (sofrimento do feto por baixa concentração de oxigênio)”.

Para o presidente da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH), Carmino Antônio Souza, a desinformação sobre o serviço faz com que a maioria das famílias pague um preço alto na esperança de uma promessa sem fundamento. “As pessoas precisam saber que terão um gasto grande para manter uma célula sem nenhuma função. Elas acreditam que o que foi coletado é um seguro de vida para o filho. A coleta em si não é garantia de qualidade. É um negócio que tem favorecido vários empresários, mas o favorecimento das famílias é remoto”, comentou. “É como comprar um terreno na lua. Pode até ser legal, mas você vai fazer o que com a escritura de um terreno na lua?”.

O médico ressaltou que no caso da leucemia, principal causa de câncer em crianças e a mais citada pelos bancos privados como forma de prevenção à saúde, a utilização do próprio sangue de cordão para o transplante não deve ser realizado.

“Existem estudos que demonstram que o genoma da pessoa já traz essa predisposição à leucemia”, contou, ao explicar que uma célula-tronco de outra pessoa seria mais eficaz.  “E pode ser adquirida gratuitamente nos bancos públicos”, completou.
 
A funcionária do banco privado rebateu o argumento de Carmino ao defender que pacientes que precisam de transplantes de medula óssea podem utilizar o sangue do próprio cordão como forma de sobrevida, enquanto não encontra um doador compatível nos bancos públicos. “Além disso, existem outras doenças que podem ser tratadas com a célula do próprio doador, como retinoblastoma, neuroblastoma, doenças comuns na infância, além de haver uma série de pesquisas no mundo todo para diversos tratamentos”.

Já o presidente da ABHH lembrou que a terapia celular ainda está fase experimental e não há previsão de quando o tratamento com células-tronco poderá ser utilizado de forma sistemática e segura. Outro ponto levantado por ele é que mesmo que no futuro haja descobertas, passados cerca de 20 anos da coleta, a qualidade do sangue é reduzida.

A representante da Cryproxis argumentou que os bancos privados são complementares aos bancos públicos e não concorrentes. “Nós apoiamos os bancos públicos, mas há uma miscigenação enorme no Brasil, então as chances de você encontrar um doador compatível em um banco público é pequena. Então, somos uma espécie de plano de saúde. É uma decisão do cliente se quer ter o serviço público ou o privado”, ponderou.

A opinião do técnico da Anvisa Daniel Coradi é contrária à da representante da Cryopraxis. Ele considera que os bancos privados não contribuem para a saúde pública. “Eles [os bancos] armazenam para uso próprio, reduzem a doação desses cordões para os bancos públicos e prejudicam a política nacional para transplante baseada no altruísmo”.

Os dados mais recentes encontrados na página da Anvisa são de 2010 e mostram que havia no Brasil 17 bancos de armazenamento privado nessa época. Das mais de 45 mil bolsas de sangue armazenadas, apenas oito foram utilizadas para tratamento desde 2003, sendo três para uso autólogo.

Edição: Graça Adjuto

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