Paulo Victor Chagas
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A presidenta Dilma Rousseff assinou na tarde de hoje (5) uma série de decretos para a desapropriação de territórios quilombolas e entregou documentos para a imissão de posse da terra. Na cerimônia, a presidenta avaliou que a regularização fundiária, além de ser uma questão de sobrevivência para as comunidades, é importante para a sua identidade.
Vinte e quatro comunidades quilombolas foram beneficiadas com a imissão de posse. De acordo com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), 3.071 famílias serão contempladas com o benefício em 15 estados, totalizando 55,5 mil hectares.
Francisco Cordeiro Barbosa mora em Brejo dos Crioulos, Minas Gerais, comunidade quilombola que representou as demais na entrega do documento. De acordo com ele, são 17 mil hectares, dos quais mais de 14 mil estavam em mãos de fazendeiros. “É um povo que vive da terra, que sabe plantar, criar. É uma família agrícola, cultural e extrativista, que depende muito do território para sobreviver. A maior parte dos quilombolas vive encurralada dentro do próprio território. Tem um território que é da comunidade, mas está cheio de fazendeiro lá dentro”, conta.
Segundo Francisco Barbosa, a documentação recebida do governo hoje se refere apenas a uma das dez fazendas que aguardam a imissão de posse na Justiça.
A presidenta assinou também decretos de declaração de interesse social e os entregou a representantes de dez comunidades quilombolas. Segundo a ministra da Seppir, Luiza Bairros, as declarações são emitidas depois que uma área é delimitada e nela são identificados povos não quilombolas ocupando o local. “Esse é o primeiro passo para desapropriação dos territórios ocupados por não quilombolas”, explicou.
Com os documentos, será possível desapropriar cerca de 14 mil hectares em comunidades do Ceará, Rio Grande do Norte, Pará, Maranhão, Tocantins, de Minas Gerais e da Paraíba. Segundo a Seppir, a medida vai beneficiar 749 famílias.
Sandra Andrade, que pertence à Comunidade dos Marques, no município de Carlos Chagas (MG), conta que houve conflito na região devido à instalação de uma hidrelétrica que causou impacto à população quilombola. A interferência também ocorria por parte de fazendeiros próximos ao local. “A gente plantava de dia e eles derrubavam à noite, era conflito constante”.
Segundo Sandra, a medida vai beneficiar a agricultura das famílias. “Com esse decreto, a gente vai ter um espaço maior para desenvolver a cultura da comunidade e gerar renda, sem precisarmos ir para a cidade procurar emprego igual estava acontecendo antes”, explica.
Apesar de reconhecer os avanços anunciados, o representante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Johnny Martins, disse que a situação ainda não é satisfatória. Segundo ele, das mais de 5 mil comunidades quilombolas existentes no país, onde moram 16 milhões de brasileiros, apenas 207 são tituladas.
“As demais comunidades enfrentam problema de regularização fundiária, que ameaça a perda de territórios, mas também a perda de vidas no grande conflito agrário que enfrentamos neste país. Isso tem que mudar”, cobrou.
As outras comunidades quilombolas beneficiadas pelos decretos são Matões dos Moreira (Maranhão), Grilo, Matão e Pedra D'Água (Paraíba), Lagoa das Pedras Encantadas do Bonfim e Sítio Arruda (Ceará), Bom Jardim (Pará), Grotão (Tocantins) e Capoeiras (Rio Grande do Norte). Durante a solenidade, três quilombos de Sergipe receberam títulos parciais de propriedade.
Em seu discurso, a presidenta também defendeu a implementação de ações afirmativas acompanhadas de políticas de inclusão racial e de regularização fundiária. “Um país verdadeiramente democrático tem de construir uma política, pelo governo e pelos movimentos sociais, em que a cor da pele não é razão para exclusão e discriminação, onde as pessoas sejam diferentes e as oportunidades iguais”, defendeu.
Edição: Davi Oliveira
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