Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
Brasília - A indefinição jurídica quanto à posse das terras reivindicadas como territórios tradicionais indígenas não pode servir como desculpa para que o Poder Público, especialmente governos locais, deixe de garantir aos índios brasileiros outros direitos básicos como educação e saúde. O alerta é da ministra da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, ao participar hoje (22) do 1º Fórum Direitos e Cidadania na Visão de Crianças e Adolescentes Guarani-Kaiowá.
"Temos tido dificuldades para que as autoridades locais garantam outros direitos [além do usufruto da terra indígena]. Muitas vezes, o argumento é que, como a área não está demarcada, determinados benefícios não devem ser entregues para que os índios não permaneçam no local [em disputa]. Só que esses índios são cidadãos brasileiros, detentores de direitos básicos que têm de ser assegurados", declarou a ministra.
"Ainda que um povo indígena não tenha sua área demarcada, ele não deixa de ter direito ao alimento, à saúde, ao acompanhamento [social]. Suas crianças têm direito à escola, por exemplo", acrescentou a ministra. Ela qualifica de “ilegítimo” o argumento de que seria uma irresponsabilidade com os recursos públicos construir uma escola ou posto de saúde em uma área reivindicada como território tradicional indígena que a Justiça, ao fim de um longo processo judicial, pode julgar que não pertence à comunidade indígena.
"Essa disputa judicial leva muito tempo e não pode gerar efeitos definitivamente danosos a essas crianças, condenando-as a uma infância sem escolas. Essas pessoas, essas crianças têm outros direitos [além do usufruto da terra] e, embora o governo federal repasse recursos e possa apoiar, garantir esses direitos é uma responsabilidade dos governos locais", concluiu a ministra.
Diante das queixas dos adolescentes de cinco aldeias guaranis-kaiowás de Mato Grosso do Sul levados a participar do evento, em Brasília, a representante do Ministério da Educação no fórum, Suzana Grillo, garantiu que os impedimentos legais que impossibilitavam que escolas indígenas fossem construídas em áreas em disputa judicial já foram eliminados, pois violavam a Constituição Federal, que determina que a educação é um direito fundamental que deve ser garantido a todos.
"Não há mais a exigência de que a terra tenha que ter sido regularizada para que uma escola seja construída. Isso foi mudado", disse a representante do MEC, para a surpresa do membro da Aty Guasu (espécie de colegiado que reúne as lideranças guaranis-kaiowás), Valdomiro Osvaldo Aquino, e da própria ministra Maria do Rosário.
"A gente ouve do governo estadual [de Mato Grosso do Sul] que a terra não está demarcada e que, por isso, ele não dá comida, não dá escola para as crianças, que têm que estudar fora da aldeia", disse Aquino.
"Eu mesma já ouvi esse argumento. Parece que até o alimento que enviamos, muitas vezes, não chega [às ocupações e acampamentos]. E ouvi que não chega porque a terra não pertence aos índios", acrescentou a ministra, antes de o assessor do Ministério do Esporte, Rivelino Pereira de Souza, confirmar que muitos prefeitos e governadores usam tais argumentos para "travar a chegada de políticas públicas" a comunidades indígenas, principalmente para as que estão disputando a posse de terras.
"Por isso é importante uma escola nas aldeias. Uma escola cujo currículo contemple, além de informações sobre os direitos garantidos a todos os cidadãos brasileiros, também sobre os direitos específicos dos povos indígenas", comentou Suzana. "O território é a base para que os índios mantenham seu modo de vida, suas tradições, mas a regularização e a efetivação do direito à terra não impede o acesso a direitos fundamentais como a educação e a saúde".
Edição: Davi Oliveira
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