Pressa do dia a dia faz paulistano esquecer nos vagões do metrô objetos inusitados

13/07/2013 - 12h49

Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - Uma carta de amor escrita em 1920, perdida há anos, precisou ser esquecida no metrô da capital paulista para que retornasse às mãos de sua destinatária. O bilhete foi encontrado dentro de um livro deixado na estação pelo filho de uma viúva, que há muito tempo procurava a recordação escrita pelo marido quando eles ainda iniciavam a vida a dois.

Em meio aos mais de 70 mil objetos esquecidos por ano nas estações de metrô de São Paulo, encontram-se documentos de identidade, guarda-chuva, itens curiosos, como micro-ondas, cadeiras de rodas, LPs e dentaduras, mas também histórias de vida.

"Esses locais [Achados e Perdidos] ficam muito associados a um lugar de guarda material, que somente objetos de maior valor seriam procurados, mas a gente faz também uma guarda afetiva, de significado. Por exemplo, uma criança que chegou a ficar doente, porque perdeu a boneca", relatou Cecília Guedes, chefe do Departamento de Relacionamento com Cliente da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô). Ela, que trabalha há sete anos no setor, lembra ainda de casos em que um senhor perdeu uma pasta com todos os documentos para dar entrada na aposentadoria e de uma senhora que perdeu a escritura da casa. "Eles ficam surpresos ao encontrar", disse.

Diariamente, 4 milhões de pessoas circulam pelas cinco estações do Metrô paulistano, um número que é superior, por exemplo, à população do Uruguai. A maior parte dessas pessoas anda apressada, mas, quando acha um objeto perdido, elas exercem a cidadania. "Encontrei a carteira de uma senhora. Tinha documentos, cartão de crédito, dinheiro. Outra pessoa até se ofereceu para entregar a um fiscal, mas fiz questão, porque não sabia se ela entregaria", relatou a atendente de telemarketing Cleonice Souza, de 41 anos de idade.

Até maio deste ano, 34 mil itens chegaram ao Achados e Perdidos do Metrô, localizado na Estação Sé, no centro da cidade, dos quais 10 mil foram recuperados. "O percentual de devolução chega a 30%, mas alguns itens, como celular, alcançam 70%", destacou a chefe do setor. Tudo o que é encontrado é cadastrado em um sistema de computador e o que tem identificação é disponibilizado na internet. "As pessoas podem acompanhar o trânsito do objeto: em qual estação está, se chegou aqui [Estação Sé]. Os que não têm identificação podem ser pesquisados diretamente aqui, porque fazemos o cadastro com toda a descrição do item", explicou Cecília.

O comerciante Pedro Fernandes, de 46 anos, aproveitou a passagem pela Estação Sé para conferir se o documento de identidade, perdido há 20 dias, foi deixado no setor, mas não teve sorte. "Foi descuido. Estava no meu bolso, fui tirar o bilhete e devo ter deixado cair. Vou ter que tirar outro", lamentou. O consultor jurídico Laércio Oliveira, de 59 anos, também recorreu ao Metrô para procurar os documentos da esposa, que foram furtados. "Isso aconteceu em um shopping, mas muita gente, quando encontra alguma coisa, costuma deixar aqui, porque é mais fácil e porque as pessoas confiam. Virou uma referência", disse.

Os usuários têm até 60 dias para recuperar o item perdido. Na terceira estante do lado esquerdo, na segunda prateleira do guarda-volumes, um micro-ondas aguarda pelo seu dono. Ele foi deixado no dia 31 de maio no mezanino da Estação Luz. Não importa o tamanho ou o quão inusitado pode ser, se esquece de tudo nas estações de metrô: muletas, bicicleta, crânio de animal, esculturas, pia, pasta com coleção de cédulas. Enquanto a maior parte dos objetos é doada para o Fundo Social de Solidariedade do Estado, os mais curiosos viram itens de exposição, como a que esteve na Estação Trianon-Masp até junho deste ano.

Os documentos pessoais lideram o ranking de objetos mais perdidos. Foram 4.748 até maio neste. Em seguida, estão as carteiras (4.069), as bolsas e mochilas (304) e as peças de vestuários e acessórios (753). No verão, no entanto, os guarda-chuvas ganham destaque, sendo que a maioria não é recuperada. "Eu já perdi vários, mas nunca fui atrás. A gente compra logo outro na porta da estação", apontou Cleonice. Outro fato curioso é que os livros esquecidos seguem a lógica de venda do mercado. "Os best-seller repercutem aqui. Vários [livros], A Cabana, chegaram aqui no ano passado", relatou Cecília.

O setor de Achados e Perdidos do Metrô paulistano funciona de segunda a sexta-feira das 7h às 20h, exceto nos feriados. Os objetos podem ser procurados também pela internet, no endereço eletrônico www.metro.sp.gov.br, e pelo telefone 0800-770-7722.

 

Edição: Aécio Amado

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