Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - Com trajes de festa, flores, atabaques, tambores e agogôs, mães de santo e representantes do candomblé cumpriram hoje (6) o ritual da lavagem simbólica do Cais do Valongo, na zona portuária da capital fluminense, onde desembarcaram mais de meio milhão de africanos escravizados, em meados do século 19.
A primeira lavagem ocorreu no ano passado, durante a inauguração do espaço. Para a presidente do Centro Cultural Pequena África, Mãe Celina de Xangô, que coordenou o ritual, a lavagem do Cais do Valongo deveria entrar para o calendário oficial de festividades da cidade.
“O Cais do Valongo não é apenas municipal, como também estadual, federal, ele é mundial, pois para cá vieram escravos de vários países, várias tribos. Pretendo, enquanto viva for, estar a frente desse ritual”, disse. “Celebramos o passado, mas também a vida, sempre pedindo a eles [ancestrais] que nos deem força, nos deem paz”.
Mãe Celina explicou que as cantigas, os batuques do ritual são os mesmos da época dos escravos que por ali passaram e que a reprodução dessas manifestações é uma forma de celebrar a vida e trazer alegria aos ancestrais.
Construído em 1811, o Cais do Valongo foi redescoberto em 2009 por arqueólogos, durante as obras da Zona Portuária. É considerado o maior porto de escravos das Américas. Em 1843, o local foi soterrado para se tornar o Cais da Imperatriz e assim receber dona Teresa Cristina, para se tornar a esposa de dom Pedro II.
O diretor-presidente da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio (Cdurp), Alberto Gomes Silva, explicou que parte dos centenas de milhares de artefatos encontrados na área do Cais do Valongo farão parte do acervo permanente do Centro Cultural José Bonifácio, na região portuária, que está sendo restaurado. A inauguração do centro e da exposição dos objetos está prevista para 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. Dentre os objetos arqueológicos encontrados, que estão em fase final de catalogação, há búzios, cachimbos, louças, ornamentos e objetos de uso religioso.
A presidenta do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro (Comdedine), Dulce Mendes de Vasconcellos, expressou o desejo de que os próximos rituais sejam apenas para homenagear os antepassados, sem a necessidade de atos para combater o racismo e a intolerância contra as religiões de matriz africana. “Outro desejo do Comdedine é que ele não precise mais existir, pois não terá mais este objetivo de combate, ou que mude completamente seus objetivos”, disse.
Edição: Fábio Massalli
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