Jorge Wamburg
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A distribuição de água sem tratamento por carros-pipa no interior de Alagoas pode ser a causa de doenças diarreicas agudas que causaram a morte de 37 pessoas no período entre 19 de maio e 30 de junho último, de acordo com informação do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, vinculado à Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.
O fato foi revelado hoje (4) em audiência pública na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados que discutiu a operação, a cargo do Exército, de distribuição de água a 810 municípios nordestinos em estado de calamidade pública devido à seca, por meio de caminhões-pipa.
Segundo nota técnica do departamento do Ministério da Saúde apresentada durante a audiência pública, informações da Secretaria de Saúde de Alagoas dão conta de que “os carros-pipa estão captando água bruta e não estão realizando nenhum tipo de tratamento, antes de disponibilizá-la para a população, o que causa alto risco à saúde”.
De acordo com o documento, análises da água para consumo humano distribuída em Alagoas evidenciaram a presença de diversos tipos de micro-organismos causadores de doença, como Escherichia coli, Shiguella, Salmonella, Salmonella typhi, Vibrio cholerae, rotavírus, protozoários e cianobactérias.
Informações fornecidas pelo Comitê de Combate à Seca de Alagoas – acrescenta a nota técnica – revelam que os carros-pipa estão abastecendo 2.234 localidades afastadas e 77 municípios, o que representa 75% do total dos municípios de Alagoas. Na Secretaria de Saúde do estado, há uma relação de cidades com epidemia de diarreia.
Os técnicos informam que foram pesquisados os 39 óbitos registrados nesses locais, no período, confirmando que, “tendo em vista o cenário relatado”, 37 foram motivados por diarreia. Entre os mortos, 52% estavam acima de 60 anos e 38% tinham menos de 1 ano de idade.
Do total de 50 municípios alagoanos reconhecidos pelo governo federal em situação de emergência ou calamidade pública, 13 apresentaram pelo menos um óbito por diarreia. A pior situação é no município de Palmeira dos Índios, com 7.280 atendimentos de diarreia e dez óbitos.
A situação foi classificada como “alarmante” pela representante do Ministério da Saúde, Mariely Daniela, porque o problema vem ocorrendo não apenas em Alagoas, mas em outros estados nordestinos que enfrentam a seca com o uso de carros-pipa. Ela ressaltou que é preciso clorar a água para ser consumida pela população, pois as análises de laboratório demonstram até mesmo a contaminação por fezes.
Para tentar impedir que a situação se agrave, a Secretaria de Saúde de Alagoas – diz a nota técnica – tem articulado com o Exército e a Defesa Civil estadual a desinfecção da água dos carros-pipa, em colaboração com a Funasa, “que disponibilizou a unidade móvel de laboratório e técnicos para a realização das análises de água”, e com a Secretaria de Recursos Hídricos do estado. Uma equipe do Ministério da Saúde também está realizando investigação em Palmeira dos Índios.
O representante do Exército na audiência, coronel Neuzivaldo dos Anjos Ferreira, responsável pela operação dos carros-pipa no Semiárido nordestino, disse que é impossível para o Exército e os donos dos caminhões-pipa se responsabilizarem pelo tratamento da água distribuída à população, mas ressaltou que a finalidade da operação é abastecer de água potável toda a região onde a seca ocorre desde 2012.
Na operação, o Exército utiliza 5.267 carros-pipa para abastecer mais de 76 mil pontos de captação. O objetivo, segundo ele, é fornecer água suficiente para mais de 3,6 milhões de pessoas, com 20 litros para cada uma por dia e um total de 20 bilhões de litros por ano.
De acordo com o deputado federal Raimundo Gomes de Matos (PSDB-CE), autor do requerimento de convocação da audiência pública, um relatório será elaborado e encaminhado ao governo com pedido de providências para que a água distribuída pelos carros-pipa a serviço do Exército seja submetida a tratamento com cloro antes de ser entregue à população. Caso isso não ocorra, ele disse que poderá recorrer ao Ministério Público para determinar a adoção da medida na operação.
Edição: Davi Oliveira // Matéria alterada às 18h11 do dia 08/07/2013 para acréscimo de informação no quinto parágrafo.
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