Anistia Internacional lança guia de boas práticas para a polícia nas grandes manifestações

19/06/2013 - 17h34

Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro - A organização não governamental (ONG) Anistia Internacional divulgou hoje (19) um guia de boas práticas para policiais que participam de mobilizações em espaços públicos, baseado em dois documentos da Organização das Nações Unidas (ONU), que são o Código de Conduta para Policiais e os Princípios Básicos para o Uso de Força e de Armas de Fogo pela Polícia.

O objetivo é assegurar que o direito da população à manifestação pacífica ocorra sem violência por parte das polícias e dos manifestantes, disse à Agência Brasil a assessora de direitos humanos da ONG no Brasil, Renata Neder. O guia foi criado no ano passado, como recomendação às autoridades da Europa para lidarem com os protestos que ocorreram em várias países do Hemisfério Norte, devido à crise econômica.

O documento será encaminhado às autoridades de segurança pública do Brasil, para que o adotem como referência. Renata Neder destacou que o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República divulgou ontem (18) a Resolução 6, que trata também da aplicação do princípio da não violência no contexto dessas manifestações e eventos públicos.

Segundo a assessora, a polícia precisa ser preparada para lidar com esse tipo de manifestação. “Porque é um tipo de policiamento, de conduta, muito específico. Por isso, é importante que as autoridades se encarreguem de dar o devido treinamento e a orientação para a polícia estar bem preparada para lidar com esse tipo de situação”.

Cabe às polícias garantir e facilitar as manifestações públicas e não restringir os protestos, diz o guia, indicando que “reuniões públicas não podem ser consideradas como um inimigo”. Renata observou, nesse sentido, a importância de se discutir o papel que a polícia tem na manifestação. “A polícia não tem o papel de reprimir a manifestação. Na verdade, tem o papel de facilitar as manifestações públicas que são pacíficas, porque é um direito de todas as pessoas se manifestarem publicamente”. A polícia deve procurar facilitar o bom andamento da manifestação, inclusive protegendo os participantes de eventuais grupos menores que adotem um comportamento violento.

A dispersão de uma manifestação só deve ser adotada quando não houver outra maneira de se proteger a ordem e o patrimônio públicos de uma violência iminente. A assessora enfatizou que a polícia não deve tentar dispersar uma multidão porque isso pode gerar outro tipo de problemas, como correrias e violência. “A polícia deve acompanhar e deixar que a manifestação ocorra pacificamente. A decisão de dispersar deve ser tomada em último caso, com base em princípios de necessidade e proporcionalidade”. Isso significa que a atitude só pode ser tomada se houver um risco real de violência maior.

Ela considerou que, às vezes, pequenas infrações cometidas por uma minoria, como algum “dano menor” à propriedade pública ou privada, não justificam a tentativa de tentar dispersar a multidão como um todo. Sugeriu que, nesses casos, a polícia deve tentar conter essa minoria, de modo que o resto da manifestação siga de maneira pacífica. Os atos ilícitos e depredações do patrimônio devem ser investigados posteriormente e responsabilizados individualmente. “Não deve ser imputado ao coletivo da manifestação a responsabilidade pelo ato individual de algumas pessoas”.

Um dos componentes do guia está relacionado ao uso da força. Esse é um elemento que preocupa a Anistia Internacional, especialmente após os incidentes registrados nos últimos dias em São Paulo e no Rio de Janeiro, evidenciando, inclusive, a utilização de armas de fogo pela polícia. “O uso de armas de fogo durante o policiamento de uma manifestação é algo absolutamente irregular e condenável”, disse Renata Neder. A ONG pede que as autoridades investiguem imediatamente porque essas armas de fogo foram usadas, quem usou e sob que ordens, para que os culpados sejam responsabilizados. “Isso não pode voltar a acontecer de maneira nenhuma”.

De acordo com o guia, mesmo o uso de armas consideradas menos letais, como balas de borracha e bomba de gás, deve ser evitado, porque elas podem causar danos permanentes. A assistência aos feridos deve ser prestada de forma imediata.

Em relação aos policiais feridos por manifestantes violentos, a assessora da ONG argumentou que qualquer ato ilícito, seja um dano físico a outra pessoa ou ao patrimônio, deve ser investigado e os responsáveis responsabilizados. Para isso, lembrou, existe o devido procedimento legal que deve ser seguido. Renata reiterou a necessidade de treinamento dos policiais para lidar com esse tipo de situação, a fim de que não se encontrem sujeitos também à violência, como ocorreu esta semana no Rio de Janeiro, onde uma minoria de policiais acabou cercada em uma agência bancária, no centro da cidade. “É preciso avaliar por que a ação não deu certo e resultou em policiais vulneráveis e expostos a uma multidão”.

O guia recomenda que o diálogo com os organizadores dos diversos grupos, antes e durante a manifestação, deve ser priorizado pelas polícias, na busca de um entendimento mútuo que possa contribuir para reduzir as tensões e evitar confrontos. Conter a violência antes que ela surja é tarefa que deve ser exercida conjuntamente pelas polícias e pelos manifestantes pacíficos, aponta o guia.

“É importante que as autoridades sinalizem para os diferentes grupos que estão se manifestando que estão abertas a recebê-los e a dialogar, para que todos encontrem uma solução pacífica. Mas também que as autoridades se engajem no treinamento e na preparação das polícias para lidar com esse tipo de manifestação no futuro”, declarou.

 

Edição: Aécio Amado

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